Público - 11.09.2019

(Jacob Rumans) #1
Público • Quarta-feira, 11 de Setembro de 2019 • 21

SOCIEDADE


Justiça
Sónia Trigueirão

Acusado de ter desviado 63
milhões de várias farmácias
não prestou declarações.
Empreiteiro acusado já não
é arguido no processo

[email protected]

O processo que resultou da Opera-
ção SOS Farmácias, cuja investiga-
ção teve início em Outubro de 2011,
há quase oito anos, começou a ser
julgado ontem no Campus da Justi-
ça, em Lisboa.
Nuno Alcântara Guerreiro, farma-
cêutico de proÆssão, que se sentou
em tribunal sete anos depois de ter
sido constituído arguido e três anos
depois de ter sido formalmente acu-
sado pelo Ministério Públic de abuso
de conÆança, insolvência dolosa,
branqueamento de capitais e fraude
Æscal, não quis prestar declarações.
A primeira sessão do julgamento
foi dedicada à correcção de lapsos de
escrita na acusação e à apresentação
dos factos constantes da mesma.
Na próxima sessão, marcada para
24 de Setembro, começam a ser
ouvidas testemunhas.
Em Junho de 2016, além do far-
macêutico, o Ministério Público
deduziu acusação contra a empresa
Nova Atitude, gerida por este, e con-
tra Luís Nascimento, empreiteiro.
Este último, na fase de instrução,
deixou de ser arguido. Luís Nasci-
mento estava acusado de um crime

Operação SOS Farmácias


em julgamento quase


oito anos depois de


iniciada a investigação


de branqueamento de capitais em
co-autoria com Nuno Alcântara
Guerreiro, por ter recebido na sua
conta duas transferências que tota-
lizaram mais de 100 mil euros de
duas farmácias.
Segundo o Ministério Público, o
empreiteiro saberia que esse dinheiro
teria origem ilícita. Durante a fase de
instrução, foi provado que nada sabia.
De acordo com a acusação do Minis-
tério Público, entre 2000 e 2010,
Nuno Alcântara Guerreiro terá
adquirido 30 farmácias, através de
outras pessoas.
Estas pessoas Æguravam nas escri-
turas, mas depois não eram os seus
verdadeiros gestores.

Farmácias faliram
Ao longo desse período, terá usado
o dinheiro das farmácias em bene-
fício próprio. De acordo com
o Ministério Público, terá tido
acesso a cerca de 63 milhões de
euros, com prejuízo para as socie-
dades das farmácias, muitas das
quais foram à falência.
Segundo o que refere a acusação
do Ministério Público, Nuno Alcân-
tara Guerreiro terá, com essas ver-
bas de que alegadamente se apro-
priou, comprado carros de topo de
gama, vários imóveis, jóias, relógios
e obras de arte.
No que diz respeito ao crime de
fraude Æscal, estão em causa mais
de 600 mil euros, valores devidos
em sede de IRC.

“Parece não estar segura do


que diz”. Contradições marcam


julgamento de Rosa Grilo


Arguida teve dificuldades


em explicar desconfiança


face a encomendas de


diamantes e por que é que


pegou na pistola de amante


Homicídio


Jorge Talixa


Primeira audiência de Julgamento decorreu ontem em Loures

Caso judicial envolve várias farmácias, muitas das quais faliram

O julgamento do caso do homicídio
do triatleta Luís Grilo começou
ontem no Tribunal de Loures, sob
apertadas medidas de segurança. A
sessão Æcou marcada pelo depoi-
mento da viúva Rosa Grilo e pela
intervenção inicial do Ministério
Público e dos dois advogados de
defesa. Rosa Grilo manteve as decla-
rações do primeiro interrogatório
feito, há um ano, perante a juíza de
Instrução de Vila Franca de Xira,
aÆrmando que foram três angolanos
a matar o marido por causa de negó-
cios de diamantes.
A inquirição da juíza Ana Clara Bap-
tista suscitou, todavia, mais algumas
contradições no relato de Rosa Grilo,
ao ponto de a presidente do colectivo
de juízes do Tribunal de Loures ter
chegado a observar que só queria
perceber o que a arguida dizia “com
alguma sequência lógica”. “Pela for-
ma como a senhora está a responder,
parece que não está segura do que
diz”, disse a magistrada judicial.
Rosa Grilo, de 44 anos, começou
por aÆrmar que pretendia manter
tudo o que disse no primeiro interro-
gatório. Ana Clara Baptista referiu
que, nesse sentido, iria tentar sobre-
tudo clariÆcar algumas situações que
no seu entender não terão Æcado bem
esclarecidas no depoimento prestado
pelos dois arguidos após a sua deten-
ção, em Setembro de 2018.
Questionada pela juíza, Rosa Grilo
teve diÆculdades em explicar por
que é que dias antes da morte do
marido comprou bilhetes para o Fes-
tival de Vilar de Mouros, confessan-
do depois que pretendia assistir aos
concertos na companhia do também
arguido António Joaquim, amante
confesso da viúva. Rosa ainda obser-
vou que iria tentar arranjar uma des-
culpa para justiÆcar a saída perante
o marido e referiu que, se não con-
seguisse, ofereceria simplesmente os
bilhetes a António Joaquim.
Depois, a arguida teve também
diÆculdades em explicar como é que
“desconÆou” de alegadas encomen-


das que o marido receberia com dia-
mantes e por que é que decidiu levar
para casa a pistola de António Joa-
quim, sem conhecimento deste,
admitindo ao mesmo tempo que não
sabe manejar armas.
A forma como terá deixado o Ælho
sozinho em casa com um estranho
(um dos alegados angolanos) duran-
te quatro horas e as viagens que fez
a Alverca e ao concelho de Avis no
dia em que os suspeitos lhe “invadi-
ram” a casa das Cachoeiras, freguesia
rural do concelho de Vila Franca de
Xira, também geraram algumas hesi-
tações no depoimento da arguida.
Na abertura da sessão, o procura-
dor explicou que, tendo também em
conta que o caso é julgado com tri-
bunal de júri (quatro cidadãos esco-
lhidos para apoiar o colectivo de

MÁRIO CRUZ/LUSA

SARA MATOS

juízes na sua decisão), iria usar a
prerrogativa prevista no Código de
Processo Penal de se pronunciar
sobre o caso na abertura do julga-
mento. “Ao Ministério Público
incumbe sustentar a acusação, mas
também é verdade que, segundo a
Constituição, o objectivo principal
do Ministério Público é descobrir a
verdade.” O magistrado reconheceu
que neste caso em concreto “nin-
guém sabe e ninguém viu e, por isso,
não existe uma prova factual concre-
ta”. No entanto, vincou, que existem
“93 testemunhas para ouvir neste
processo”. O Ministério Público
admitiu algumas “imprecisões” na
acusação, mas assegurou que vai
apresentar provas dos factos impu-
tados aos arguidos.
Já Tânia Reis, advogada de Rosa
Grilo, observou que este caso “gerou
muitas notícias que não correspon-
dem à verdade” e que alguns dos
actos da sua cliente foram provoca-
dos pelas circunstâncias (alegadas
ameaças dos angolanos). “A acusa-
ção não bate certo e tem uma versão
dos factos completamente deturpa-
da”, referiu a causídica, prometendo
apresentar testemunhas que provem
outro relato dos factos.
Ricardo Serrano Vieira, advogado
de António Joaquim, funcionário
judicial de 43 anos, considerou que
alguns dos métodos de recolha de
provas adoptados pela Polícia Judi-
ciária não foram regulares. “A missão
da Polícia Judiciária é descobrir a
verdade e não foi isso que aconte-
ceu”, aÆançou. O julgamento pros-
segue no dia 17, ainda com o depoi-
mento de Rosa Grilo.

Forma como terá


deixado o Älho
sozinho em casa

quatro horas com


um estranho e as


viagens a Alverca
no dia em que os

suspeitos


“invadiram” a casa


geraram hesitações
no depoimento
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