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BRASIL | ARTIGO
Celso Toledo é doutor em economia e
diretor da LCA Consultores
grande ciclo de retomada da confiança
iniciado em 2016 não foi acompanhado
de redução proporcional da incerteza.
Esta se encontra em patamar relativa-
mente elevado desde 2015 e, atualmente,
tem girado um pouco acima de 110. Os
detalhes de algumas medidas de con-
fiança revelam agentes otimistas com o
futuro e relativamente cautelosos com o
presente — na verdade, alguns registros
mostram que a distância entre essas per-
cepções nunca esteve tão elevada. Ou
seja, transformamo-nos em torcedores
confiantes que vivem uma realidade
pouco animadora e que enxergam um
leque de possibilidades para o futuro
que vai do Tártaro ao Elísio.
É simples verificar que as medidas de
confiança e de incerteza se complemen-
tam para explicar estatisticamente o ta-
manho da última recessão — medindo-a
Há times de futebol ganhadores e per-
dedores. A torcida de todos costuma can-
tar e vibrar, mas os surtos de confiança
do primeiro grupo refletem mais a reali-
dade do que os do segundo. A irraciona-
lidade de um torcedor que aposta no Ibis
Sport Club em um eventual confronto
com o Real Madrid não pode ir além de
uma caixa de cerveja. É possível que es-
teja ocorrendo algo parecido com a eco-
nomia: há o desejo de acreditar, mas não
dá para sentir firmeza, e quem não sente
firmeza não se aventura. Infelizmente,
sem gente querendo correr riscos não há
crescimento econômico.
Explicar o comportamento dissonante
da confiança e da incerteza é a parte me-
nos difícil. A confiança está em alta porque
o time que comanda a economia é compe-
tente e trabalha com os diagnósticos cor-
retos. A proposta de reforma da Previdên-
cia apresentada é um passo importante
para reduzir desigualdades e colocar o
Brasil novamente nos trilhos. Mas, eviden-
temente, ela tem de ser aprovada, e aí é
que mora o perigo. Não dá por enquanto
para ter segurança sobre o empenho do
governo em emplacar as mudanças e, ain-
da, da convicção de membros importantes
da ala política em relação à própria neces-
sidade das reformas. Além disso, ninguém
é capaz de responder como será possível
encaminhar temas tão polêmicos com tan-
to amadorismo, improvisos e descoorde-
nação. Tudo pode acontecer e, quando é
assim, a economia patina. Q
pela distância entre o que o país está pro-
duzindo e uma estimativa de quanto po-
deria produzir em condições normais de
temperatura e pressão. A evidência suge-
re que, de fato, a manutenção da incerte-
za econômica em patamar relativamente
elevado diminui o brilho dos indicadores
de confiança como balizadores da ativi-
dade econômica contemporânea.
Ressalvando que cálculos desse tipo
envolvem hipóteses contestáveis, os da-
dos indicam que as normalizações esti-
madas da confiança e da incerteza pro-
duziriam efeito sobre o crescimento
econômico significativamente maior do
que no caso de retomada apenas da con-
fiança com manutenção da incerteza em
patamar elevado (como está acontecen-
do). A diferença acumulada em um ano
entre os dois cenários pode ser de algo
entre 1,5 e 2 pontos percentuais do PIB.
Bloqueio em rodovia do Rio Grande do Sul: a greve dos caminhoneiros
causou prejuízos bilionários no segundo trimestre do ano passado
FLAVIO NEVES/FUTURA PRESS
A CONFIANÇA
ESTÁ EM ALTA
PORQUE O TIME
QUE COMANDA
A ECONOMIA
É COMPETENTE