Psique - Edição 156 (2019-02)

(Antfer) #1
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O consciente positivo


IMAGENS: SHUTTERSTOCK

Fisgamo-nos, tal


como o peixe no


anzol, ele se pega,


opescador apenas


completa e oferta


meios, mas é o peixe


que se pega. A busca


cega pela felicidade


encontra muitas


coisas, mas encontra


a felicidade?


A AUTOMUTILAÇÃO DOS VÍNCULOS


PARA SABER MAIS


H


oje, uma pessoa me solicitou textos acerca da automutilação. Nesse
tema, apenas nesse tema, o texto que tenho é esse que aqui escrevo e
você lê. A automutilação dos vínculos, continue lendo, não automutile esse
laço. Hoje, acontece muito disso, as pessoas se desinteressam pelo que é
do outro e rompem, crendo estar mutilando o outro, automutilam a relação.
Eu não tinha o texto, poderia acabar ali. Mas não, quero usar detalhes do co-
tidiano para trabalhar o tema. Quantas vezes não paramos para escutar o que
ooutro está nos dizendo? Até de modo sutil, pois enquanto o outro nos fala,
inúmeros de nós já estamos pensando no que falaremos, pensando em nos-
so tema a dizer sem dialogar com o que o outro está dizendo. Não estamos
ouvindo, e sim preparando uma fala. Quantas vezes irrompem numa mesa
de bar disputas pelo mais, pelo que tem mais, pelo que viaja mais, pelo que
ganha mais, pelo que pega mais ou pelo que tem mais
sofrimento, mais dificuldades, mas raramente dialogam?
Quantas vezes o outro, ao dizer de sua dor, inúmeros de
nós tomamos as palavras ditas como armas do falante
e lhe atiramos críticas, julgamentos, e sequer paramos
para escutar mais? Quantas vezes o assunto do outro
nos faz bocejar, nos apressa a querer sair? Quantas ve-
zes hein! Diálogo, trem de dois, trem que transpira novi-
dades, é joia rara nos dias atuais. Quantas vezes o outro
dizendo de seus problemas não estamos pensando em
“que chato, só reclama”, “quer aparecer”, “que conta te-
nho com isso?”, e quando termina de falar, ao inverso
de tecermos conversa, lacramos o assunto no caixão
dizendo, pregando palavras, “vai ficar bom”, “não pense
assim”, “que chato, viu aquela abelha voando ali?”, “que
calorão...”. Quantas vezes deixamos de render diálogos
e acolhidas? Temos medos de acolher? Ou na carên-
cia de ser acolhido não suportamos acolher? Independe,
estamos automutilando os vínculos. O desamparo é a
navalha da relação. Adolescentes cortam o corpo, pois
não lhes resta mais nada para cortar, tudo já se cortou.
Jovens abrem sua pele para evaporar linguagem, pois
não têm onde falar sem serem julgados, moralizados e
penalizados. Preferem cortar o corpo para a dor psíqui-
ca ser menor que a dor no corpo. Apaziguar, pois quan-
do falam, o outro o corta na alma e esta dói mais que no
corpo. Não raro estes, ao serem mais e mais pressiona-
dos, na ausência do simbólico, atuam na carne. Carnifici-
na do próprio ser. Deve ter leitor dizendo a si mesmo: “E
daí? Ele que tem que simbolizar!” Sim, ele, mas não só! O
mundo nunca é só. Precisamos e carecemos de parar de
automutilar nossas relações. Será assim que poderemos
trabalhar o tema, aproximando, acolhendo, escutando.
Cortando e costurando o desamparo, a solidão.

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