FOTO: RENATO PIZZUTTO VOCÊ S/A | AGOSTO DE 2016 | 35
O que é economia criativa?
O conceito está mudando. Começa-
mos a abordar esse assunto há 15
anos identificando setores mais ób-
vios, como música, arquitetura e
moda. Mas, desenvolvendo políticas
nessas áreas, percebemos que não
se pode defini-la facilmente. Há tra-
balhos na indústria criativa que não
são criativos e trabalhos criativos no
resto da economia.
Por exemplo?
O varejo não costuma ser apontado
como um setor de economia criativa,
mas pode empregar designers e mar-
queteiros. O governo da Indonésia
acredita que a gastronomia deveria
ser incluída como parte da economia
criativa. É óbvio que deveria, não?
Um dos argumentos para
as empresas e pessoas não
colaborarem é a questão
da propriedade intelectual.
Como lidar com isso?
As pessoas pensam que propriedade
intelectual é algo a que se agarra e
não se compartilha jamais. Mas,
quanto mais generoso você é para
dividir o conhecimento, mais resul-
tados você tem. Eu estive em um
centro de pesquisa de alta tecnologia
no norte da Inglaterra e encontrei
grandes empresas de aviação como
Boeing, Airbus e British Aerospace
trabalhando juntas em projetos. Ain-
da são competidores fervorosos, mas
ainda assim colaboram. Eles dizem
que a tecnologia está tão sofisticada
hoje em dia que precisam comparti-
duzir as melhores soluções. Por isso,
muita gente nos Estados Unidos e
na Europa olha com muito interesse
para São Paulo e Rio de Janeiro para
ver o que vocês estão fazendo para
resolver questões complexas de ci-
dades grandes. Sem dinheiro é pre-
ciso ter muita criatividade.
Como será o futuro desse setor?
Uma das grandes mudanças no mer-
cado de trabalho será a substituição
de pessoas por robôs. Em alguns
lugares, já vemos caixas de banco e
de mercados substituídas por má-
quinas. O Google já tem carros sem
motorista. Um estudo americano diz
que, nos próximos 20 anos, 47% dos
profissionais poderão ser substituí-
dos por robôs – que são muito mais
baratos, trabalham noite e dia, não
fazem greve, não pedem aumento,
não cometem muitos erros.
Mas isso é bom ou ruim
para a economia criativa?
As únicas áreas em que não é pos-
sível substituir humanos por robôs
são as que exigem criatividade e
inteligência social. Há muitas mu-
danças radicais por vir, tão grandes
quanto as que surgiram no fim do
século 19, com a construção de fer-
rovias e a invenção de automóveis.
Isso vai atingir nossa sociedade
como um todo – e grandes novos
problemas precisarão ser resolvidos.
As soluções apenas aparecerão por
meio do pensamento criativo. Mas a
indústria criativa não é a resposta
para tudo, é apenas parte da respos-
ta. O principal ponto é que quanto
mais usamos a nossa criatividade,
mais criativos ficamos. Não é como
o petróleo, que quanto mais você
usa, menos tem. Toda a espécie hu-
mana precisa pensar nisso e aceitar
o fracasso como uma forma de
aprendizado, e não como um desas-
tre. Esse é um dos aspectos funda-
mentais da economia criativa.
A definição está mudando e áreas
que tradicionalmente chamamos de
economia criativa agora começam a
colonizar outros setores da econo-
mia. A arte e o videogame estão ofe-
recendo soluções para as pessoas
gerenciarem a saúde e a educação.
De que maneira as áreas mais
tradicionais podem se beneficiar
da economia criativa?
Uma grande lição da economia cria-
tiva é a generosidade e a humildade,
pois a essência desse mercado é par-
tilhar conhecimento e aprender com
os outros. O ensinamento poderia ser:
mantenha a mente aberta para en-
contrar, com a sua rede, uma manei-
ra melhor de fazer o que você faz.
lhar a propriedade intelectual para
conseguir alcançar respostas e solu-
ções efetivas. Mesmo na engenharia
tradicional, as pessoas já estão en-
tendendo que, algumas vezes, a me-
lhor política em relação à proprieda-
de intelectual é ser generoso.
Quais são as suas percepções
em relação à economia criativa
em desenvolvimento no Brasil?
As boas soluções precisam nascer
na cultura e no local em que os pro-
blemas estão inseridos. Não dá para
apenas importar respostas. Uma
vantagem do Brasil é a diversidade,
poucas populações são assim. Outro
ponto importante é saber que os
maiores problemas costumam pro-
“O principal ponto é que quanto
mais usamos a nossa criatividade,
mais criativos ficamos”
VO217_CAR_ENTREVISTA.indd 35 8/2/16 12:25 PM