IDEAIS TRAÍDOS - sylvio frota - 706 Págs

(EROCHA) #1

Batista Pinheiro - não era o escalado pelo boletim regimental. Interroguei-o sobre a irregularidade,
respondendo-me ele, de modo grosseiro, que havia trocado de serviço por conta própria.


Cabe aqui uma explicação aos que não conhecem as normas regulamentares - o subordinado só
poderá fazer qualquer alteração na escala oficial mediante autorização superior.


Como estávamos numa quarta-feira, dia em que o expediente administrativo encerrava-se pela
manhã, disse-lhe que continuasse no posto, mas que o fato seria comunicado ao comando.


Estas trocas de serviço - nos dias de meio expediente, domingos e feriados - eram processadas à
base de boas remunerações. Os soldados de recursos pagavam com prodigalidade aos mais pobres
para substituí-los, quando designados para serviço nas grandes datas. Os dias de Natal, Ano Bom
etc. eram os dias dos soldados pobres, para estes muito rendosos. No carnaval os preços atingiam
níveis altíssimos!


Esta prática, uma venalidade, não podia ser tolerada; conseqüentemente, exercíamos cuidadosa
fiscalização sobre as relações de serviço e os militares que as burlavam eram severamente punidos.


Nós, os tenentes, víamos nesse procedimento embriões da corrupção e combatíamo-lo com todo
os nossos entusiasmo e idealismo de jovens.


O cabo Salvador, portanto, sabia que iria ser punido e, por isso, ou porque fosse homem irritado
e agressivo, relaxou no cumprimento de ordens. Advertido por mim, disse-me em atitude de
indisciplina que iria retirar-se porquanto "já estava ficando nervoso e perdendo a calma". E afastou-
se para o corpo da guarda, sem permissão.


Enfrentava eu uma insubordinação latente e quis, ainda, evitá-la. Determinei ao sargento
comandante da guarda que o recolhesse ao xadrez, colocando no seu lugar um soldado antigo.


Partiu o sargento para voltar, pouco depois, declarando que o cabo recusarase a entrar na prisão.
Perguntou como deveria proceder, já que a guarda estava no rancho e não tinha meios para cumprir a
ordem.


Dirigi-me, então, à prisão, que era ampla, e depois de mandar abri-la determinei ao cabo
Salvador que entrasse.


O graduado aproximou-se do xadrez e, em atitude de completo descontrole, lançou-me a frase:
"Entro como cabo porque o senhor não é homem para mim!"


Atirou-me o equipamento individual às pernas e projetou-se em minha direção para agredir-me.
Senti o insulto, a iminência da agressão física e da desmoralização.


Saquei do revólver e, como não se detivesse, o tiro partiu.
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