A partir deste momento suas decisões foram fundamentalmente políticas; sua figura de soldado
convencional e disciplinado desvaneceu-se. Intrometeu-se na jurisdição do brigadeiro Chefe do
Estado-Maior das Forças Armadas, diretamente vinculado ao Presidente da República, insultando-o
ao perguntar-lhe se pretendia punir seu subordinado coronel Mamede e, em face da resposta
negativa, declarou que iria pedir o regresso do coronel ao Exército - logicamente para prendê-lo.
Nem o brigadeiro nem o deputado Carlos Luz, que ocupava interinamente a Presidência,
poderiam, sem lesões a sua autoridade, entregar à vingança do general Lott um subordinado cuja
conduta somente eles, por lei, poderiam julgar.
Dá-se, então, o absurdo de o ministro julgar-se diminuído na sua autoridade e demitir-se.
O presidente Carlos Luz, após auscultar a opinião do marechal Eurico Gaspar Dutra, chama ao
palácio o general da reserva Alvaro Fiuza de Castro, ex-Chefe do EME - homem que ambos
consideravam capaz de evitar a crise em perspectiva - e convida-o para ocupar o cargo. Faz entrar, a
seguir, no seu gabinete o general Lott, a quem informa da decisão que acabara de tomar e agradece,
abraçando-o cordialmente, os serviços prestados ao Exército e à Nação.
O general Lott rejubilou-se com o fato de ser substituído por um chefe militar da envergadura
moral do general Fiuza, no qual reconhecia equilíbrio e serenida de invulgares. Conversaram algum
tempo e combinaram, por sugestão de Lott, a passagem das funções para o dia seguinte, 11 de
novembro, às três horas da tarde. O general Fiuza, não vendo inconveniente, aquiesceu.
Firmou-se a impressão de que o incidente tinha sido encerrado de modo feliz. Entretanto,
encontrava-se o general Fiuza em sua residência, às dez e meia da noite, quando ali aparece o
general Alcides Etchegoyen, preocupadíssimo com informações sobre movimentação de tropas e
reuniões de generais com o ministro Lott.
Conhecendo o temperamento ardoroso e leal de Etchegoyen, a quem devotava profunda estima,
Fiuza procurou mostrar-lhe a incoerência da notícia, porquanto fora o próprio Lott que fixara a hora
e, até, propusera mandar buscá-lo de automóvel, o que não aceitara.
Todavia, para dissuadi-lo da idéia em que persistia, estabeleceu ligação telefônica com Lott,
narrando-lhe os "boatos" disparatados que lhe chegavam.
O general Henrique Lott responde-lhe que nada se modificara no que fora assentado entre eles. A
situação era normal, afirma. No entanto, a essa hora a tropa do Exército já ocupava, com sua ordem,
pontos e áreas importantes da capital.
E... na madrugada seguinte o mesmo general Lott desencadeia o primeiro golpe de novembro,
depondo Carlos Luz e mandando prender, pelo marechal Mascarenhas de Morais - que infelizmente a
isto se prestou -, num ato de extremas violência e mesquinharia, o general Fiuza de Castro, a quem
horas atrás, numa hipocrisia de envergonhar Tartufo, assegurara ser tranqüila a situação militar.