pertencido ao meu gabinete, nele permaneceram sorridentes e mal-falantes a meu respeito. Entre
todos destacou-se um coronel de Cavalaria, indivíduo pretensioso, verdadeiro bluff profissional,
carreirista inveterado, que logo após o dia 12 de outubro "conquistou" importante comando, de
grande responsabilidade moral, num estabelecimento de ensino. A influência nociva deste comando
sobre os jovens, por evidente, dispensa comentários. Essa nova mensagem, muito simples, constava
de um bilhete de pagamento, dos que são tradicionalmente usados no Exército, com apenas uma
anotação, posta em seguida à gratificação especial a que faziam jus os oficiais do gabinete: "Preço
de uma traição - ou, então - Valor de uma humilhação."
Homens desta espécie já formam, também, uma legião - Legião dos Carreiristas - muito diferente
daquelas legiões romanas que lutavam por uma Nação, pois batem-se estes, na realidade, por seus
intrínsecos interesses. Justificam suas abjetas adesões aos vencedores com uma frase feita para esses
emocionantes momentos - o aforismo "Sou soldado, cumpro ordens!" - cujo puro sentido, como
malabaristas morais, deformam.
O militar não é um robot, não é um irresponsável que tenha perdido a consciência, única mentora
de seus atos. Em 1922, vários capitães de Artilharia recusaram-se a abrir fogo de suas peças sobre
os jovens cadetes revoltados, numa reação inócua. Tiveram o absoluto beneplácito de seus
contemporâneos.
Infelizmente, para os destinos do Exército, muitos desse enxame de adesistas e carreiristas
alcançam o generalato.
Vi e recebi com agrado e, não posso negar, confortaram-me muito as manifestações de
solidariedade direta. Entretanto, não poderia louvar aquelas que, embora indiretamente tivessem o
mesmo sentido, porquanto plenamente justificáveis nos momentos de indignação e nojo, fossem
ruinosas à nossa sublime instituição.
Que os acontecimentos de outubro de 1977, em vista dos tristes exemplos dados pelos generais
traidores - transformados em servos de gleba do presidente Geisel -, afetaram a disciplina no
Exército e o prestígio de seus chefes, não pode haver mais contestações, em face das ocorrências
subseqüentes.
Assim pensando, no dia 13 de outubro de 1977, um brilhante general, hoje na reserva, a quem a
Pátria e Exército devem vigorosas realizações nos setores da engenharia e das informações, disse-
me, olhando o vácuo como se estivesse a perscrutá-lo:
- General! O Exército, ontem, morreu como instituição!
Foi, ainda que emocional, uma observação justa; porém confio que as novas gerações, livres da
mentalidade usufrutuária e das fascinações materialistas que avassalam os altos escalões da
República, possam soerguê-lo e ressuscitá-lo.