Valor - Eu & Fim de Semana (2020-03-13)

(Antfer) #1

22 | Valor| Sexta-feira,13demarçode2020


GALERIA
MARCOSRAMOS/AGÊNCIA O GLOBO

DomenicoDe Masiem 2000, duranteCarnaval no Rio de Janeiro
HUDSONPONTES/AGÊNCIA O GLOBO

ComAndrea GouvêaVieira e Roberto d’Ávilaao recebertítulo
JUNIADE AZEVEDO/DIVULGAÇÃO

De Masiapóspalestra em 2014 comJorge Mautnere Ide Rodrigues
OLGA LYSLOFF/FOLHAPRESS

Masi,especializado na sociologiado traba-
lho,àcondiçãodepensador-celebridadeno
Brasile na Itália.Em seus livros,ele defende
esse argumento comofundamentalparao
futurodo trabalho, especialmenteo de na-
turezaintelectual, fortementeafetadopelo
desenvolvimentotecnológico. Trata-sede
trabalharparagerarriqueza, proporcio-
nando, ao mesmotempo,estudo, aprendi-
zadoe diversão. Para um trabalhador bra-
çal, infelizmente,não existe“ócio criativo”.
Osociólogo diz que há uma certaconfusão
com o conceito, que é diferenteda expres-
sãoemitaliano“dolcefarniente”, quepode-
riasertraduzidacomo“nãofazernada”.
“Pensoem três coisasque são feitas con-
temporaneamente. É o que estamosfazen-
do aqui:estamoscomendo, estamosnos di-
vertindoe estamos inclusivetrabalhando.
Isto é ócio criativo”, afirma. “O trabalhonão
podeser só trabalho, comose fosseuma pe-
na.Éprecisohaverdiversãoeaprendizado.”
Nascidoem 1938na pequena Rotello, ci-
dadeda regiãode Molise,no Sul da Itália,
Domenicode Masifoi criado,após amorte
do pai (quandoele tinhasete anos),nos ar-
redoresde Nápoles,cidadeondedeu seus
primeirospassoscomoprofessore onde
suafamíliafincouraízes.Formadoemdirei-
to esociologia,especializando-seno mun-
do do trabalho, ele viveuem Perugia,Sassa-
ri, MilãoeParisaté se estabelecerdefinitiva-
mentena capitalitaliana,ondepassoua
maiorpartedavidalecionandonaUniversi-
dadeLa Sapienza. Hojeprofessor emérito
da instituição, osociólogo aindamantém
fortesvínculoscomo mundoacadêmico,
realizandopesquisasedandoaulas.
DeMasiacompanhounasruasosoproda
últimanovidadena políticaitaliana,omo-
vimentodas Sardinhas,criadoespontanea-
mentepor jovensem novembropassado e
que rapidamente se espalhoupelo país. Os
atosforamconvocadoscontraodiscursoea
agendado senadorMatteo Salvini, líderdo
partidode extrema-direitaLiga Nortee
atualmenteo políticomaispopular da Itá-
lia, no momentona oposição.As Sardinhas
conseguiramunificaras pessoasque esta-
vamdispersas,afirmaosociólogo.Eleparti-
cipoudo maiorato realizadoaté agorapelo
movimento, que reuniucercade 100 mil
pessoasemRoma,emdezembro.
Comdezenasde títuloslançadosna Itá-
lia, maisde dez delestraduzidosou prepa-
radosparao Brasil,De Masipublicou re-
centementeno seu país um trabalhosobre
a burocracia —uma das chagasnacionais,
na sua visão. Para ele, reinana Itáliauma
confusãodesorganizadano quesitoburo-
cracia,enquantono Brasilela seriaorgani-

zada.Sua explicaçãoao “ma nicômio” ita-
liano:presunção. “Os italianosacreditam
seremgrandesjuristas,há umaprofusão
de leis —mais de 100 mil”, diz. “Somoso
país com o maiornúmerode leis. E muitas
vezesuma vai contraa outra.”
Seu penúltimolivroé dedicado a Roma,
discutindoo futurode uma capitalcaótica,
com inúmeros desafios, mas, como faz
questãode ressaltar,muito particular. Para
De Masi,trata-sede uma“cidadeperfeita”,
apesarde malesrecentes eainda incontor-
náveis comoacrise no recolhimentodo li-
xo, um flagelomunicipal.Ele preferecitar
o clima,os “estrepitosos”monumentosar-
tísticoseuma vida culturalentre220 cine-
mas, maisde 90 teatrose 21 universidades.
“Semfalar que há aindao Vaticano, uma ci-
dadedentroda outra,que também éuma
potência políticae cultural.”
No Luigi,restauranteaberto desdeos
anos 1950 e pontode paradade muitostu-
ristasque transitampela regiãohistóricada
capital,De Masiconheceos garçonseos se-
gredosdo cardápio. Na entrada,pedea ro-
maníssima“fioredi zucca”(flor de abóbora
ouabobrinha)grelhadacom queijo.Depra-
toprincipal,paraenfrentarofrio,pastacom
feijão,outra especialidaderomana,servido
comoumasopa.O professorrecusavinho,
poisaindaprecisatrabalhar,justifica.
Aos 82 anoscompletadosno iníciode fe-
vereiro, dois casamentos,dois filhose qua-
tro netos,DomenicoDe Masidiz ter a mes-
marotinahámuitosanos:passacercadeoi-
to horasdiáriasdedicadoaleituraseestu-
dos. Afirmaque aindase senteaptoa fazer
tudooque faziahá 30 anos,e isso oajuda a
não pensarna finitudeda vida.Entusiasta
dasviagens,dizqueelaslhepermitemculti-
varamizadespordiferentespaíses,algoque
considerafundamentalparase construir
uma “visãomaisfamiliardo mundo”. Neste
mês ele vai a NovaYork, em maioviajaao
Brasilenomêsseguinte,aAbuDhabi.
A tecnologiaé outrapaixãodo sociólogo,
epor isso ele consideraoatual momento o
melhorperíododa históriapara se viver. Há
avançosnamedicina,pontua,massuavisão
incluioutrosaspectos,comoa democrati-
zaçãodacultura.Elepegaocelularemostra
uma lista arquivada no aparelhocom mais
de 5mil sinfonias. “A cultura,por muitos
milênios, foi umacoisafeitapor poucose
destinadapara poucos.Agora,tudochegaa
todos.Todoscriam,colocamnaredeetodos
consomem. É a primeiravez na história da
humanidadequetodoscriamparatodos.”
A relaçãocom oBrasil começoude forma
casual.Foi em meadosda décadade 1990,
após concederuma entrevista em Romapa-

Em 2013 durantevisitaa São Paulo, na sacadada Escolada Cidade
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