FESTIVAL, PARA QUÊ E PORQUÊ?
No rescaldo da realização de um Fes 2 val, apesar deste
tempo longo em que me encontro, não deixo de me
ques 2 onar que papel devo desempenhar, que função é
esta de programar cultura. Confronto-me sempre com
um desafio: a necessidade de contribuir, pela mediação
das artes e do pensamento, no combate à injus 2 ça, à
violência, às discriminações em função do género, da
origem social, étnica, cultural ou religiosa, à exploração
do trabalho.
Estou profundamente convencido que a transformação
de um mundo refém do lucro, num mundo marcado
pelo humanismo, pela inclusão social, pelo respeito
pelos outros e pelo direito á diferença, pelo respeito
pelas culturas dos povos, pela paz, pela justa repar 2 ção
da riqueza e pelo respeito pelo ambiente, decorre da
emancipação intelectual dos indivíduos. E estou
também convencido que isso só é possível pela livre
fruição e criação arLs 2 cas, pela democra 2 zação do
acesso ao saber e à cultura, pela educação como
processo social global e inclusivo, lugar comum e de
comuns, fonte geradora de liberdade e pensamento
crí 2 co. É por isso que tenho passado a minha vida
profissional a tentar contribuir para a democra 2 zação
no acesso às artes entendendo-as como públicas, e,
nessa medida, instrumentais na mediação entre os
indivíduos, os patrimónios, os criadores, os lugares.
Tanto o Viva a Rua, Fes 2 val que decorreu em Évora nos
anos 90, como o Artes à Rua Fes 2 val de Artes Públicas,
como o Fes 2 val Imaterial, Património Pensado e Vivido,
como todas as programações culturais que criei, têm
essas preocupações e são construídos a par 2 r de
relações colabora 2 vas com criadores e agentes culturais
e cria 2 vos.
Entendo o Fes 2 val como um lugar de encontro e diálogo
intercultural através de linguagens arLs 2 cas. É por isso
que em cada edição convido criadores de diferentes
geografias, sensibilidades esté 2 cas e culturais, para
virem trabalhar em residência, criando assim coisas
novas, abrindo novos caminhos, num diálogo que
transcende as línguas e que nos permite entender e
conhecer o outro. Esse diálogo permanente, que
atravessa muitos lugares do Mundo, outros tantos
Fes 2 vais irmãos do Artes à Rua, configura um território
de liberdade, de conhecimento, de alteridade, de PAZ.
Essa, comigo, será sempre a essência do Artes à Rua. É
por isso que não programo em função dos rankings da
moda, do instagram, spo 2 fy ou youtube, não programo
em função do mainstream, nem das pressões dos
grandes agentes. Programo ar 2 stas que vejo em vários
lugares do Mundo.
RESIDÊNCIAS ARTíSTICAS O ADN DO FESTIVAL
O Fes 2 val deve ser também um lugar de desafio ao
conhecimento, ao pensamento e, evidentemente, à
fruição. Como público adoro descobrir coisas novas que
outros programadores revelam. Tento propiciar essa
experiência, fantás 2 ca para mim, às pessoas que vêm
ao Artes à Rua. Este ano convidei para duas residências
ar 2 stas de cá e de África - Moçambique e Marrocos. Da
primeira resultou Revoada, com Lenna Bahule, Tó Zé,
Dercio Gomate e Cris 2 na Viana, da segunda resultou um
espectáculo que juntou os Cantares de Évora com a
Soukaina Fahsi, o Aziz Ozouss, o Mário Lopes, o Rodrigo
Lino, o Vitor Guerreiro e o Carlos Menezes (direcção
musical).
Em cada uma destas residências e em cada um destes
espectáculos criaram-se laços de amizade,
entreteceram-se novos significados para as sonoridades
que cada interveniente aportou. Também entre nós, os
que acompanhámos tudo isto, uma pequena equipa,
que abraço com carinho, foi acontecendo uma espécie
de residência, com muita cria 2 vidade para superar as
necessidades de produção. E também entre nós
entretecemos laços de amizade e de significado,
aprendemos, discu 2 mos, par 2 lhámos pensamento e
emoções e cansámo-nos muito, daquele cansaço bom
que não diminui nada a felicidade do fazer acontecer.