O Estado de São Paulo (2020-03-25)

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A14 QUARTA-FEIRA, 25 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


Esportes


Jogos de Tóquio. Competição acontecerá em 2021, em data a ser definida, e provocará profundas mudanças na estratégia de treinos


Robert Scheidt
Iatista, 5 pódios olímpicos
“A decisão do COI em adiar os
Jogos Olímpicos para 2021 é a
correta. Eu tenho certeza de
que Tóquio vai estar mais moti-
vada do que nunca para entre-
gar grandes Jogos Olímpicos”

Joanna Maranhão
Nadadora
“Finalmente, Jogos Olímpicos
adiados para 2021 e atletas po-
dem permanecer em suas ca-
sas nesse período de pande-
mia. Não faria o menor sentido
manter a data, comprometen-
do ciclo de treinamento, saúde
e qualidade do evento”

Arthur Nory
Ginasta
“O momento não deve ser de
lamentações, e sim de agradeci-
mento. Vamos ficar em casa,
porque a festa no ano que
vem vai ser linda”

Paulo Wanderley
Presidente do COB
“Sempre tivemos confiança
de que o presidente Thomas
Bach seria capaz de liderar
com serenidade e segurança o
Movimento Olímpico nesse
momento histórico”

Daniel Dias
Nadador paralímpico
“Japão, te vejo em 2021! Obri-
gado COI pela sábia e sensata
decisão. Fico mais tranquilo e
motivado para participar des-
tes Jogos em Tóquio!”

Katie Ledecky
Nadadora americana
“No momento em que
estamos juntos para enfrentar
os desafios de hoje, podemos
sonhar com uma linda
Olimpíada em um belo país.”

Gabriel Medina
Surfista
“Acredito que foi uma decisão
correta por parte do COI e os
organizadores dos Jogos
Olímpicos de Tóquio. A saúde
e o bem-estar da população
mundial é a maior prioridade
do momento”

Ciro Campos


O adiamento da Olimpíada e
da Paralimpíada de Tóquio,
anunciado ontem, vai causar
uma radical mudança no ci-
clo de quatro anos de prepara-
ção dos atletas. A competição
foi transferida para 2021, ain-
da em data a ser marcada, por
causa da pandemia do novo
coronavírus, e por isso os es-
portistas terão agora de re-
pensar toda a estratégia de
treinos e competições para es-
tarem no auge da forma física
na época da disputa.

O adiamento já era esperado,
apesar da relutância do Comitê
Olímpico Internacional – na se-
gunda-feira, a entidade havia pe-
dido um mês para tomar a deci-
são – e a ameaça de boicote de
potências como Estados Uni-
dos, Canadá, Grã-Bretanha e
Austrália forçou a definição. On-
tem, após conversar por telefo-
ne com o presidente do COI,
Thomas Bach, o primeiro-mi-
nistro japonês, Shinzo Abe,
anunciou o adiamento, após a
hipótese de cancelar um evento
no qual o Japão investiu R$ 56
bilhões ser descartada.
Originalmente, os Jogos
Olímpicos seriam realizados de
24 de julho a 9 de agosto deste
ano e os Paralímpicos de 25 de
agosto a 6 de setembro.
O COI se manifestou por co-
municado. “Nas atuais circuns-
tâncias, e com base nas informa-
ções fornecidas hoje pela OMS
(Organização Mundial da Saú-
de), o presidente do COI e o pri-
meiro-ministro do Japão con-
cluíram que os Jogos devem ser
remarcados para uma data pos-
terior a 2020, mas o mais tardar
no verão de 2021, para proteger
a saúde dos atletas, todos os en-
volvidos nos Jogos Olímpicos e
na comunidade internacional.”
Para os atletas, o desafio ago-
ra é mudar completamente o fo-
co. Desde o fim dos Jogos do
Rio, em 2016, a preparação teve
como objetivo deixar o atleta
pronto para julho deste ano. A
partir de agora, será preciso re-
construir o trabalho.
“Agora todo mundo tem de
sentar, fazer planilhas e anali-
sar em que ponto o atleta esta-
va, como estava fazendo o cres-
cimento e planejar uma curva
de crescimento, inclusive de


olho nos concorrentes. Será
uma situação muito diferente”,
disse ao Estado o Médico do Es-
porte Páblius Staduto Braga, do
Centro de Medicina Especiali-
zada do Hospital Nove de Ju-
lho. “Será uma ocasião interes-
sante para a própria ciência do
esporte evoluir”, afirmou.
O recomeço do planejamen-
to já fez a Confederação Brasilei-
ra de Tênis de Mesa (CBTM)

prometer mudanças. O consul-
tor técnico da entidade e treina-
dor de Hugo Calderano, o fran-
cês Jean-René Mounié, afirmou
que a nova data vai causar altera-
ções profundas. “Muda bastan-
te. Vamos ter que criar uma no-
va estratégia. O Hugo tem de
treinar sabendo que temos pelo
menos um ano em vez de qua-
tro meses para os Jogos.”
Por isso, boa parte das compe-

tições no fim deste ano e no iní-
cio do próximo vão ganhar im-
portância para os atletas olímpi-
cos. Esses torneios deixaram de
ser do início do ciclo olímpico
para se tornarem a retomada da
preparação, que havia ficado
afetada recentemente pelos
treinos em quarentena.
“Algumas modalidades fica-
ram prejudicadas pela quarente-
na e agora os atletas vão poder

se recuperar. Esportes coleti-
vos e que precisam da atividade
aeróbica, como o vôlei, foram
afetados porque o atleta não
consegue em um treino em casa
reproduzir o movimento do jo-
go”, explicou o médico pesqui-
sador do Grupo de Dor do De-
partamento de Neurologia do
Hospital das Clínicas da USP
Marcus Yu Bin Pai.

Melhor forma. Os próprios es-
portistas garantem que agora
será melhor ter um novo foco.
“Nós estamos sendo prejudica-
dos por ter de ficar em casa e
não conseguir treinar. Em 2021
os atletas vão se preparar me-
lhor para a Olimpíada e conse-
guir dar o seu máximo”, disse a
jogadora de vôlei Camila Brait.
A atleta da ginástica artística
Flávia Saraiva concorda. “Es-
tou há uma semana e meia sem
treinar. Isso é muito ruim para a
gente, porque temos uma roti-
na de oito horas diárias de trei-
nos. A gente respirou aliviado,
porque teremos mais um ano
para poder treinar”, afirmou.

estadao.com.br/e/renegociacao

O presidente do Comitê Olímpi-
co Internacional (COI), Tho-
mas Bach, justificou a decisão
da entidade de adiar os Jogos
Olímpicos de Tóquio, no Japão,
afirmando que a saúde pública
mundial é prioridade na luta
contra o avanço da pandemia
do novo coronavírus. Disse tam-
bém que a doença se apresenta
como um dos maiores desafios
para o esporte olímpico.
“Nunca vimos um vírus que
se espalha tão rapidamente pe-
lo mundo”, disse Bach aos jorna-
listas durante uma teleconfe-
rência. “Estamos diante de um
desafio sem precedentes.”


Esta é a primeira vez em mais
de cem anos de Olimpíada que
uma edição é adiada. Anterior-
mente, o evento havia sido can-
celado em 1916, 1940 e 1944 pela
Primeira e Segunda Guerras
Mundiais.
Porém, Bach disse ser perigo-
so fazer comparações entre a
ocasião atual e os problemas do
passado e reiterou a necessida-

de de o mundo procurar ter tran-
quilidade neste momento.
O dirigente alemão e o primei-
ro-ministro japonês, Shinzo
Abe, conversaram por telefone
antes de tomar a decisão final.
Os dois manifestaram a espe-
rança de que a Olimpíada em
2021 tenha um motivo extra de
comemoração. “Que os Jogos
sirvam para comemorar que a

humanidade tenha superado es-
ta crise jamais vista na histó-
ria”, comentou Bach. Apesar da
disputa estar prevista para
2021, o nome oficial vai perma-
necer: Tóquio 2020.
O presidente do COI afirma
que a entidade ainda vai pensar
em novas datas para realizar o
evento. Por enquanto, a única
certeza é que será no verão de


  1. “Os Jogos Olímpicos são
    um dos eventos mais complica-
    dos para organizar neste plane-
    ta. Para deixar tudo pronto, não
    basta só uma chamada telefôni-
    ca.” Bach disse que o Comitê Or-
    ganizador terá como uma das
    prioridades justamente definir
    quando será a competição.
    O adiamento trará um gran-
    de prejuízo ao COI, como admi-
    tiu Bach. Mas o dirigente garan-
    tiu que prefere não fazer estima-
    tivas. “O importante é salvar vi-
    das, portanto as considerações
    financeiras não são prioritá-
    rias”, disse. Na conferência, ele
    enviou mensagens de apoio aos
    atletas de países mais afetados
    pela pandemia e afirmou que
    torce pela recuperação da saú-
    de mundial.


Jogos tiveram 3


cancelamentos


por guerras


PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


lPaulo Wanderley, presidente
do Comitê Olímpico do Brasil
(COB), afirmou ter ficado “alivia-
do” com o adiamento dos Jogos
Olímpicos. “Tenho certeza de
que este também é o sentimento
de nossos atletas, com quem tí-
nhamos a maior preocupação e
cuidado”, disse o dirigente. “Des-

ta forma, teremos a oportunidade
de oferecer melhor preparação
para os Jogos. A comunidade do
Brasil está bastante satisfeita.”
Segundo Paulo Wanderley, a
concentração de todos os esfor-
ços deve estar com combate à
pandemia do novo coronavírus.
Desde o início da pandemia, o
COB tem priorizado a saúde e o
bem-estar dos atletas brasileiros
e colaboradores. Há duas sema-
nas, a entidade cancelou eventos
públicos e preparatórios para os
Jogos, colocou funcionários em

sistema de home office e determi-
nou na última terça-feira o fecha-
mento total do CT Time Brasil.
“Vamos continuar o trabalho
de preparação da delegação. Te-
remos que replanejar, fazer no-
vos estudos, falar com nossos
patrocinadores e fornecedores,
conversar com as nossas bases
no Japão, entre outros. Seguire-
mos trabalhando para oferecer
uma estrutura de excelência ao
Time Brasil”, disse o diretor-ge-
ral do COB, o ex-judoca campeão
olímpico Rogério Sampaio.

REPERCUSSÃO

Presidente do COI vê na pandemia


um desafio inédito para o esporte


Daniel Batista

O adiamento da Olimpíada é
um fato inédito. No entanto,
em outras três ocasiões os Jo-
gos tiveram de ser cancelados,
todos pelo mesmo motivo: guer-
ras mundiais. Por coincidência,
em uma dessas ocasiões a com-
petição estava marcada para ser
realizada no Japão.
A primeira vez que os Jogos
Olímpicos não puderam ser dis-
putados foi há mais de um sécu-
lo, mais precisamente em 1916.
A competição aconteceria em
Berlim, na Alemanha, mas foi
cancelada em razão da Primeira
Guerra Mundial (1914 a 1918).
Em 1940 também não houve
Olimpíada. Inicialmente, a se-
de da competição seria Tóquio.
A escolha ocorreu em 1936. No
entanto, no ano seguinte o Ja-
pão entrou em guerra a China e
os Jogos, então, foram transferi-

dos para Helsinque, na Finlân-
dia. Mas pouco tempo depois te-
ve de ser cancelado em razão da
Segunda Guerra Mundial.
O conflito, que se estendeu
até 1945, também impediu a rea-
lização da edição de 1944 da
Olimpíada, que iria acontecer
em Londres. A capital inglesa te-
ve de esperar quatro anos para,
em 1948, sediar os Jogos.
Helsinque acabou esperando
ainda mais, pois só foi receber
os Jogos Olímpicos em 1952.
Naquele ano Tóquio, que em
tempos de paz havia se candida-
tado novamente a ser sede olím-
pica (em 1960), acabou perden-
do a disputa para Roma e só foi
conseguir fazer uma Olimpíada
em 1964, ou seja, 24 anos depois
da data em que pretendia reali-
zá-la pela primeira vez.
O adiamento da Olimpíada
para 2021 vai ter uma outra con-
sequência incomum : o interva-
lo para a próxima edição será de
apenas três anos, e não os tradi-
cionais quatro, pois os Jogos se-
guintes, em Paris, na França,
ocorrerão no verão de 2024, pe-
la programação do COI. /
COLABOROU ALMIR LEITE

Aliviado, COB apoia


decisão e começa a


rever planejamento


BEHROUZ MEHRI / AFP

Olimpíada é adiada e atletas terão


de reprogramar toda a preparação


Decisão inevitável. Yoshiro Mori, presidente do Comitê Organizador Tóquio-2020: adiamento foi a melhor solução

NA WEB
Impasse. Clubes
e atletas tentam
acordo salarial

6

AFP

Thomas Bach diz que o


mais importante é salvar


vidas e que calcular o


prejuízo por adiar os


Jogos não é prioridade


Assustado. Avanço rápido do coronavírus impressiona Bach

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