%HermesFileInfo:A-2:20200401:
A2 Espaçoaberto QUARTA-FEIRA, 1 DE ABRIL DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO
Nenhum país europeu está es-
capando das consequências
econômicas do coronavírus,
mas o sofrimento não será di-
vidido por igual. O sul da Euro-
pa, que penou com o impacto
da última grande crise econô-
mica, sofrerá mais. Países co-
mo Grécia e Itália dependem
muito do turismo e ainda li-
dam com os efeitos do colap-
so da dívida da zona do euro
na última década.
As economias com empre-
sas capazes de fornecer servi-
ços digitalmente e onde os fun-
cionários podem trabalhar de
casa devem reagir melhor.
http://www.estadao.com.br/e/europa
É
evidente que o País es-
tá passando por uma
fase gravíssima de sua
História. Não apenas é vítima
de um “tsunami” devido aos
efeitos do espraiamento do
coronavírus, como assiste a
uma perigosa escalada da ten-
são política. Nesse tipo de si-
tuação, os ânimos ficam à
flor da pele e os países às ve-
zes tomam decisões que de-
pois, em momentos de maior
calma, se revelam equivoca-
das. Quero aqui, nesse con-
texto, tratar do tema da regra
do teto do gasto público.
Fui um defensor da medi-
da, quando ela foi adotada,
em 2016. Considero que é pe-
ça essencial do roteiro que le-
vou o País a uma queda das ta-
xas de juros, a partir de 2017,
como nunca tínhamos visto
no Brasil. Por outro lado, es-
crevi um artigo em 2019, com
meu colega Guilherme Tino-
co, publicado como Texto pa-
ra Discussão do BNDES nú-
mero 144, no qual defendi
uma revisão da regra a partir
de 2023. Por razões que não
há espaço aqui para explicar,
o cenário já tinha mudado an-
tes da atual pandemia e, se
em 2016 eu julgava que era
possível conservar o teto in-
tacto até 2026, desde 2018 es-
tou convencido de que isso
será impossível. Dito isto, po-
rém, é essencial separar o
joio do trigo e entender o que
está em jogo, em momentos
em que o País parece estar fi-
cando de cabeça para baixo.
No pandemônio que se se-
guiu, neste ano de 2020, ao
aparecimento do fenômeno
do coronavírus no Brasil, no
debate sobre a política fiscal
necessária para combater os
efeitos econômicos derivados
desse drama apareceram di-
versas interpretações, acerca
das quais é necessário aqui fa-
zer alguns esclarecimentos.
Eles são importantes para
que o debate sobre o tema do
teto não seja distorcido por al-
guns equívocos. Vamos aqui
procurar contra-argumentar
a três afirmações muito cita-
das nas últimas semanas.
- “O teto causou uma redu-
ção dos gastos com saúde.”
Isso foi dito, com insistên-
cia, como forma de criticar a
política econômica imple-
mentada depois de 2016. Até
2019, pelo menos, porém, is-
so não aconteceu. A despesa
com saúde – além do gasto
com os profissionais da área
- se divide no componente
obrigatório e no discricioná-
rio. A preços constantes de
2019 – utilizando o deflator
do produto interno bruto
(PIB) para inflacionar os da-
dos de anos anteriores –, de
fato a despesa obrigatória
com saúde cedeu, de R$ 88,
bilhões para R$ 86,1 bilhões
entre 2016 e 2019. Porém, nes-
ses mesmos três anos, a par-
cela discricionária da despesa
com saúde aumentou de R$
22,3 bilhões para R$ 29,2 bi-
lhões. Isso significa que o to-
tal gasto com saúde se elevou
de R$ 111,1 bilhões para R$
115,3 bilhões, sempre a preços
reais de 2019.
- “A crise requer o uso de
investimento como fator de
políticas anticíclicas.”
Já disse que estou convenci-
do de que o País terá de rever
a regra do teto antes de 2026,
entre outras coisas, pela dete-
rioração que acarreta para o
investimento público. Imagi-
nar, porém, que este poderia
reagir rapidamente em 2020,
diante de uma contração da
demanda como a observada
no momento, é um equívoco.
Entre a decisão, nesse caso,
de gastar e sua implantação,
precisa ser cumprido todo o
ritual de a obra ter projeto,
ser aprovada pelos órgãos
competentes, ter os recursos
empenhados, etc. Isso toma,
na prática, muitos meses, sen-
do, portanto, incompatível
com o tipo de reação imedia-
ta requerida pelas circunstân-
cias atuais.
- “A regra do teto é incom-
patível com o apoio que a eco-
nomia precisa ter numa situa-
ção crítica como a de 2020.”
Isso não é correto. A regra
do teto, inscrita na Constitui-
ção, diz explicitamente que
não se incluem na sua base
de cálculo certas transferên-
cias constitucionais aos en-
tes subnacionais, as despesas
não recorrentes da Justiça
Eleitoral com a realização de
eleições e créditos extraordi-
nários relacionados a despe-
sas imprevisíveis e urgentes,
como as decorrentes de co-
moção interna ou calamida-
de pública. Como sempre há
alguma calamidade aconte-
cendo em algum lugar do
País, na média de 2017-
essas exceções ao teto alcan-
çaram um valor de R$ 3 bi-
lhões/ano. Nada impede que
o mesmo critério seja adota-
do em casos como a necessi-
dade incontestável de am-
pliar excepcionalmente as
despesas com saúde, preser-
vação do emprego e ajuda aos
mais desfavorecidos, num
quadro como o que estamos
vivendo em 2020.
Portanto, é justo reconhe-
cer que a regra do teto, da for-
ma como foi estabelecida na
PEC aprovada em 2016, não
sobreviverá com essa rigidez
até 2026. Porém seria impor-
tante que a ideia central de
contenção do gasto, que é a
essência dessa tentativa de
controle, se mantenha em ca-
so de revisão futura, evitando
“jogar fora o bebê junto com
a água do banho”.
Rediscutir a regra do teto é
válido num contexto em que
a) haja um acordo político
em defesa da redução do défi-
cit público ao longo da déca-
da, para algo em torno de 3%
do PIB, num programa pluria-
nual; e b) se crie espaço para
o investimento, de forma con-
sistente com a preservação
do rigor fiscal. Nada disso
tem que ver com o quadro de
2020, que pode ser enfrenta-
do com gastos “extrateto”,
nos termos já permitidos pe-
la regra aprovada em 2016.
]
ECONOMISTA
Crise causada pela pande-
mia atingiu com força indús-
tria de automóveis.
http://www.estadao.com.br/e/carros
EFEITOS DA PANDEMIA
Economia europeia e o coronavírus
O circuit breaker, usado
muito ultimamente, é um
mecanismo de segurança
acionado em momentos de
estresse no mercado.
http://www.estadao.com.br/e/bolsa
l“Disso temos certeza. O presidente escolheu muito bem o Ministério.
Pena ter gente torcendo para ter atrito entre os dois.”
MARY MÔNICA BRAGA
l“Bolsonaro e Doria estão mais preocupados com 2022 do que com a
pandemia. A única diferença é que o Doria está no palanque certo.”
WILSON KFOURI
l“Doria devia trabalhar mais e parar de criticar o presidente. Não é
hora de fazer campanha. Mesmo porque ele não tem chance.”
THAIS CLARA BORGES
l“Um governador que propõe obediência à OMS baseado em crité-
rios científicos. Criminoso é quem manda as pessoas saírem às ruas.”
SÉRGIO MURILO BENEDICTO
COMENTÁRIOS
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
PRESIDENTE: ROBERTO CRISSIUMA MESQUITA
MEMBROS
FERNANDO C. MESQUITA
FERNÃO LARA MESQUITA
FRANCISCO MESQUITA NETO
GETULIO LUIZ DE ALENCAR
JÚLIO CÉSAR MESQUITA
Trabalhar no isolamento
das casas pode ser solitário,
o que explica a grande popu-
laridade dos espaços com-
partilhados.
http://www.estadao.com.br/e/homeoffice
Espaço Aberto
E
liane Cantanhêde nar-
rou neste jornal que
em reunião com ou-
tros ministros e o chefe, Jair
Bolsonaro, o titular da Saúde,
Luiz Henrique Mandetta, lem-
brou que mil mortos na pan-
demia da covid-19 equivalem
à queda de quatro Boeings.
“Estamos preparados para o
pior cenário, com caminhões
do Exército transportando
corpos pelas ruas com trans-
missão ao vivo pela inter-
net?”, perguntou. Os animais
racionais presentes acharam
que o choque faria o chefão
do “gabinete do ódio” recuar
da decisão de sacrificar vidas
para salvar empregos.
Vã ilusão. Ele está pouco in-
teressado em ter razão e na ra-
zão. No dia seguinte, “em de-
safio a Mandetta” – que, ao
que parece, é indemissível,
mas nem assim tem como re-
duzir efeitos colaterais malig-
nos da atitude do chefe –, pas-
seou nas ruas “para ouvir o po-
vo”, dando uma de Harum Al-
Rashid do cerrado. Fê-lo por-
que se diz um atleta e, como
revelou, “todos morremos
um dia”. Ainda bem que Ale-
xander Fleming, ignorando is-
so, inventou a penicilina para
salvar vidas. Nem o destino
inexorável evitou que Albert
Sabin pesquisasse a vacina
contra a poliomielite, que
abrevia a sentença bolsonaris-
ta de milhões de bebês mun-
do afora e em nosso desafortu-
nado Brasil.
O chefe do Executivo, cujo
herói de guerra não é Wins-
ton Churchill, que deteve o
nazismo, nem Luís Alves de
Lima e Silva, o pacificador,
mas o coronel Brilhante Us-
tra, que torturava patrícios in-
defesos até a morte por desa-
fiarem a ditadura militar, tem
devotos que o seguem cega-
mente. Ele nunca fez profis-
são de fé terraplanista nem re-
jeitou publicamente avanços
da civilização promovidos
por sábios como Galileu Gali-
lei, Nicolau Copérnico, Char-
les Darwin e Isaac Newton,
que revolucionou a física mos-
trando por que tudo o que so-
be cai.
Ninguém deve imaginar
que o faz por ideologia do mo-
to-perpétuo para cima ou pro-
fissão de fé fundamentalista.
Trata-se apenas de um frio e
cruel cálculo eleitoral. Mor-
tos não votam. Talvez não te-
nha ocorrido ao ministro
Mandetta lembrar-lhe que ca-
dáveres não podem ser elei-
tos. O psiquiatra Jorge Alber-
to Costa e Silva, ex-chefe do
setor de epidemias da Organi-
zação Mundial da Saúde, em
entrevista a Felipe Moura Bra-
sil, do site O Antagonista, avi-
sou que os participantes da
impatriótica guerra pelo pó-
dio republicano em 2022, en-
tre os quais ele próprio e o po-
tencial contendor João Doria,
podem não chegar à campa-
nha. Pois, contrariando a higi-
dez aparente, não bastará pa-
ra evitar o contágio, já que, co-
mo ele mesmo disse, nin-
guém é imortal. Aliás, ao desa-
fiar o ministro que nomeou
para combater epidemias, ele
propõe uma astuciosa versão
contemporânea da eugenia,
com que o austríaco Adolf Hi-
tler tentou eliminar idosos e
doentes crônicos para depu-
rar uma invencível raça aria-
na. O pintor de paredes de ofí-
cio não tinha a educação for-
mal de um ex-aluno de Acade-
mia Militar das Agulhas Ne-
gras. O isolamento vertical
deste é a eugenia sofisticada a
ser praticada por mãos lim-
pas, com o uso recomendado
de detergente. O raciocínio é
claro como água: o jovem sa-
dio sairá à rua, contrairá o co-
ronavírus e o transmitirá ao
velho e/ou debilitado domésti-
co. Como costumava dizer o
pistoleiro Luquinha, o Ustra
do sertão da Paraíba: “Nunca
matei ninguém, atirei no infe-
liz. Só quem mata é Deus”. A
vítima morrerá de diabetes,
cardiopatia ou moléstias res-
piratórias. O responsável não
será o nazismo, mas um pa-
rente próximo, que, mesmo
jovem e são, é passível de su-
cumbir à covid-19 propria-
mente dita.
O idealizador da eugenia pe-
lo parente na sala ao lado bate-
rá Hitler, Ustra e Luquinha
em astúcia. Isso, contudo,
não o tornará o herói predesti-
nado de 2022. A opção prefe-
rencial pelo trabalho contagio-
so ceifaria muitas vidas, mas
Bolsonaro já tem a explicação
na ponta dos dedos de todos
os seus seguidores: a Saúde
de Mandetta fracassou, mas a
Economia de Guedes nos sal-
vará. Ele não aprendeu com
Tancredo Neves que “a esper-
teza quando é demais engole
o dono”. O fato é que lorde
Keynes e Franklin Delano
Roosevelt não salvaram a eco-
nomia mundial do colapso da
Bolsa de Nova York em 1929.
Imaginemos que eles ressusci-
tassem e aceitassem partici-
par da equipe de Paulo Gue-
des, que disse: “Eu, como eco-
nomista, gostaria que pudés-
semos retomar a produção.
Eu, como cidadão, ao contrá-
rio, aí já quero ficar em casa”.
Nem o excessivo uso do pro-
nome pessoal na primeira pes-
soa e a experiência do New
Deal evitariam a bancarrota
do país menos preparado do
mundo para sobreviver de-
pois da peste vinda da China.
Esta profecia será facilmente
cumprida: o mundo interliga-
do, que se defende do novo
coronavírus da forma mais efi-
ciente, que é o isolamento so-
cial total, deixaria o Brasil, do
mais alto grupo de risco entre
todos, morrer sem o oxigênio
que outros países guardaram
para usar depois da crise.
O que de fato poderia criar
empregos seria usar o poder
de guerra que o Congresso
lhe dá para eliminar os privilé-
gios absurdos de que a casta
dirigente abusa para se man-
ter no luxo, enquanto os po-
bres morrem à míngua.
Quem tem dicionário sabe
que “mito” significa lenda,
mentira.
]
JORNALISTA, POETA E ESCRITOR
PUBLICADO DESDE 1875
LUIZ CARLOS MESQUITA (1952-1970)
JOSÉ VIEIRA DE CARVALHO MESQUITA (1947-1988)
JULIO DE MESQUITA NETO (1948-1996)
LUIZ VIEIRA DE CARVALHO MESQUITA (1947-1997)
RUY MESQUITA (1947-2013)
FRANCISCO MESQUITA NETO / DIRETOR PRESIDENTE
JOÃO FÁBIO CAMINOTO / DIRETOR DE JORNALISMO
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0800-014-
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E-INVESTIDOR
O que acontece
quando a Bolsa para?
Trabalhar de casa é
ideia superestimada
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RAHEL PATRASSO/REUTERS ERIK S. LESSER/EFE
]
José Nêumanne
Tema do dia
Software processava dados
enquanto os computadores
estavam ociosos.
http://www.estadao.com.br/e/alienigenas
Eugenia de Hitler
na era Bolsonaro
Isolamento vertical
é jovem contagiar-se
na rua e contaminar
velhos em casa
Teto – o joio
e o trigo
É importante que a
ideia central de
contenção do gasto
público se mantenha
AMÉRICO DE CAMPOS (1875-1884)
FRANCISCO RANGEL PESTANA (1875-1890)
JULIO MESQUITA (1885-1927)
JULIO DE MESQUITA FILHO (1915-1969)
FRANCISCO MESQUITA (1915-1969)
AV. ENGENHEIRO CAETANO ÁLVARES, 55
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SÁBADO) E R$ 7,00 (DOMINGO). RJ, MG, PR, SC E DF:
R$ 5,50 (SEGUNDA A SÁBADO) E R$ 8,00 (DOMINGO).
ES, RS, GO, MT E MS: R$ 7,50 (SEGUNDA A SÁBADO)
E R$ 9,50 (DOMINGO). BA, SE, PE, TO E AL: R$ 8,
(SEGUNDA A SÁBADO) E R$ 10,50 (DOMINGO). AM, RR,
CE, MA, PI, RN, PA, PB, AC E RO: R$ 9,00 (SEGUN-
DA A SÁBADO) E R$ 11,00 (DOMINGO)
PREÇOS ASSINATURAS: DE SEGUNDA A DOMINGO
- SP E GRANDE SÃO PAULO – R$ 134,90/MÊS. DEMAIS
LOCALIDADES E CONDIÇÕES SOB CONSULTA.
CARGA TRIBUTÁRIA FEDERAL: 3,65%.
Doria: ‘Perder o
Mandetta seria um
desastre para o Brasil’
Ao ‘Estado’, governador de São Paulo
defende ministro da Saúde e diz que
crise uniu centro e centro-esquerda
]
Fabio Giambiagi
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VINCENZO PINTO/AFP
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QUARENTENA
Vendas de carros
despenca mais de 90%
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Terra dará uma pausa