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O ESTADO DE S. PAULO QUARTA-FEIRA, 1 DE ABRIL DE 2020 A
Internacional
Temendo uma nova onda de covid-19,
países da Ásia retomam restrições
ADAM DEAN/THE NEW YORK TIMES
Sem saída. Autoridades de imigração de Phuket, na Tailândia, monitoram a temperatura de turistas que estão retidos no país e precisam estender seus vistos
PEQUIM
Em toda a Ásia, países que pa-
reciam ter controlado a pande-
mia de coronavírus estão fe-
chando fronteiras e impondo
medidas mais rígidas de con-
tenção, com medo de uma no-
va onda de infecções importa-
das. As restrições são um sinal
preocupante para EUA, Euro-
pa e o restante do mundo que
ainda enfrentam o surto: o su-
cesso no controle do vírus po-
de ser tênue e o planeta corre
risco de permanecer com al-
gum tipo de bloqueio por tem-
po indefinido.
Na China, a nova restrição
aos voos internacionais é tão se-
vera que os estudantes chine-
ses no exterior se perguntam
quando poderão voltar para ca-
sa. Em Cingapura, os cidadãos
que retornaram recentemente
têm de compartilhar os dados
de localização de seus telefo-
nes com as autoridades todos
os dias para provar que estão
aderindo à quarentena ordena-
da pelo governo.
Em Taiwan, um homem que
viajou para o Sudeste Asiático
foi multado em US$ 33 mil (R$
171 mil) por frequentar um bar
quando deveria estar trancado
em sua casa. Em Hong Kong,
uma menina de 13 anos, que foi
vista em um restaurante usan-
do uma pulseira de rastreamen-
to para monitorar as pessoas
em quarentena, foi seguida, fil-
mada e posteriormente expos-
ta na internet.
Mesmo quando o número de
novos casos começa a dimi-
nuir, as barreiras e proibições
de viagens em muitos lugares
podem persistir até que uma
vacina ou um tratamento efi-
ciente seja encontrado. Após
um aumento recente em casos
vinculados a viajantes interna-
cionais, China, Hong Kong,
Cingapura e Taiwan proibiram
a entrada de estrangeiros nos
últimos dias.
O Japão vetou visitantes da
maior parte da Europa e está
considerando negar a entrada
de americanos. A Coreia do Sul
impôs controles mais rígidos,
exigindo que estrangeiros ficas-
sem em quarentena nas instala-
ções do governo por 14 dias
após a chegada. “Os países es-
tão lutando para implementar
as próprias soluções domésti-
cas, mas soluções domésticas
são insuficientes para um pro-
blema transnacional”, disse
Kristi Govella, professora de es-
tudos asiáticos na Universida-
de do Havaí. “O fechamento de
fronteiras é uma das maneiras
pelas quais governos podem
controlar a situação.”
Vaivém. O vírus, que surgiu na
Ásia e se espalhou para o Oci-
dente, corre o risco de ricoche-
tear. Os cidadãos preocupados
com surtos na Europa e nos
EUA correram de volta para ca-
sa, mas acabaram no meio de
novos epicentros da pandemia.
Quase imediatamente, paí-
ses e cidades da Ásia começa-
ram a ver um aumento de no-
vos casos, muitas vezes detec-
tando passageiros infectados
nos aeroportos, enquanto pas-
savam por exames de saúde.
Hong Kong, que vinha relatan-
do novos casos diários em um
dígito, subitamente viu as noti-
ficações atingirem 65 em um
dia. No Japão, onde as infec-
ções permanecem relativa-
mente controladas, os casos
começaram a aumentar no
mês passado em Tóquio, quan-
do alguns viajantes voltaram
do exterior.
Para tentar conter um novo
fluxo de infecções, os governos
encontraram um resposta co-
mum: fechamento de frontei-
ras. A Coreia do Sul, que tem
sido elogiada globalmente por
achatar a curva rapidamente
após um pico explosivo preco-
ce de infecções, inicialmente
exigiu que os viajantes de al-
guns países ficassem em qua-
rentena. Nesta semana, am-
pliou a lista para cobrir o mun-
do inteiro.
Restrições. O Japão começou
colocando os viajantes em qua-
rentena, mas agora barrou pas-
sageiros que chegam da maior
parte da Europa. O país está dis-
cutindo mais proibições, até
mesmo para incluir viajantes
dos EUA.
China, Hong Kong, Cingapu-
ra e Taiwan simplesmente fe-
charam suas fronteiras para
praticamente todos os estran-
geiros. “Acreditamos que, na si-
tuação atual da pandemia, mini-
mizar as atividades desnecessá-
rias de entrada e saída é uma
medida responsável e necessá-
ria para proteger efetivamente
a vida, a segurança e a saúde físi-
ca de todo o povo chinês”, afir-
mou Liu Haitao, diretor de con-
trole e gestão da Administra-
ção Nacional de Imigração da
China.
A governadora de Hong
Kong, Carrie Lam, barrou to-
dos os não residentes em 19 de
março e os moradores que re-
tornam ao território passaram
a ser testados na chegada.
Durante uma quarentena de
14 dias em casa, eles usam pul-
seiras de rastreamento e seus
movimentos são monitorados
por um aplicativo em smartp-
hones. Lam disse que atualmen-
te mais de 200 mil pessoas
usam essas pulseiras em Hong
Kong. / NYT
CHINA REABRE,
MAS AINDA EM
MARCHA LENTA
Pequim avalia que novas contaminações podem
prejudicar retomada da economia no longo prazo
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS
l Isolamento sem fim
PEQUIM
A
pós dez semanas con-
finados em casa, os
moradores de Wu-
han já conseguem sair para
ver a luz do dia. O aeroporto
deve reabrir na próxima se-
mana e todos terão permis-
são para deixar a cidade de 11
milhões de habitantes pela
primeira vez desde que ela
foi fechada, em 23 de janei-
ro, em uma tentativa de con-
trolar o coronavírus.
Pequim diz que o país ven-
ceu a batalha contra o surto,
relatando todos os dias que as
transmissões domésticas são in-
significantes ou inexistentes. A
reabertura gradual de partes da
Província de Hubei – e agora de
Wuhan, sua capital – é prova dis-
so. Mas vencer essa guerra está
provando ser algo mais difícil,
pois envolve não apenas preve-
nir uma segunda onda de infec-
ções, mas também retomar a
economia. A cada dia fica mais
claro que as autoridades não po-
dem realizar as duas tarefas ao
mesmo tempo.
“Para impedir a propagação
do vírus, a China precisa man-
ter algum tipo de medida de dis-
tanciamento social”, disse Neil
Thomas, pesquisador do cen-
tro de estudos Marco Polo, enti-
dade com sede em Chicago es-
pecializada em temas chineses.
O governo chinês está desco-
brindo que permitir que as pes-
soas se aproximem demais ele-
va o risco de um novo aumento
de infecções. Relatórios de saú-
de recentes falam em “portado-
res silenciosos” e estudos apon-
tam que até um terço das pes-
soas infectadas com o coronaví-
rus apresentam sintomas tar-
diamente.
“A possibilidade de uma nova
onda de infecções permanece
relativamente alta”, disse o por-
ta-voz da Comissão Nacional
de Saúde do país, Mi Feng.
Em comunicado na TV, o Par-
tido Comunista da China pro-
meteu “fazer a prevenção e o
controle da situação”, por um
lado, “e lidar com a retomada
da produção”, por outro. As-
sim como Donald Trump, nos
EUA, que queria a abertura do
comércio na Páscoa – ele re-
cuou, após a explosão de casos
–, o líder chinês, Xi Jinping,
também está preocupado com
o impacto econômico da parali-
sação nacional.
A maioria dos economistas
prevê uma queda acentuada na
taxa de crescimento da China
no primeiro trimestre, com al-
guns prevendo a primeira con-
tração desde 1976. É certo que,
apesar da reabertura gradual de
Wuhan, as coisas ainda estão
longe do normal. A tentativa de
retomada é feita com avanços e
recuos. Pequenas empresas –
de bares de karaokê a cibercafés
- que tentaram reabrir, no iní-
cio de março, foram intima-
das a fechar novamente. As
autoridades chinesas não ex-
plicam as razões, mas analis-
tas apontam que Pequim te-
me que novas infecções cau-
sem impacto ainda pior na
economia no longo prazo.
Em Wuhan, a covid-19 ma-
tou oficialmente 2,5 mil pes-
soas e outras 2,5 mil conti-
nuam internadas.
“É um cálculo difícil, pois
envolve o risco à saúde públi-
ca versus o risco econômi-
co”, disse Ryan Manuel, dire-
tor da Official China, consul-
toria especializada em políti-
ca chinesa. Mas é uma conta
que outros países, incluindo
Itália, Espanha e EUA, terão
de fazer. “Todos precisarão
ter uma estratégia”, disse Ali-
cia Garcia Herrero, econo-
mista do Banco Natixis. “Ho-
je, os líderes chineses podem
dizer que estão indo devagar
por razões sanitárias. Mas,
na verdade, é porque eles não
podem vender seus produ-
tos para ninguém.” / W. POST
Japão, China, Hong Kong, Cingapura, Taiwan e Coreia do Sul fecham fronteiras e colocam de quarentena residentes que retornaram
do exterior; vários governos que vinham registrando uma queda no número de infectados tentam agora frear aumento recente de casos
14 dias
de quarentena foi o tempo fixado
para residentes de vários países
asiáticos que voltam do exterior
200 mil
pessoas em Hong Kong
estão usando pulseiras de
monitoramento por aplicativo
para verificar se estão
cumprindo quarentena em casa
ROMAN PILIPEY/EFE
Aglomeração. Fila para comprar máscaras em Wuhan
Rescaldo da pandemia