JornalValor--- Página 12 da edição"01/04/2020 1a CAD A" ---- Impressapor rcalheiros às 31/03/2020@18:43:
A12|Valor| Quarta-feira, 1 de abrilde 2020
Opinião
Àsvezesnãoéinsensatotransgredirleisdomercado,masé
precisofazê-lodemodointeligente.PorViniciusCarvalho
Coronavírus e a ‘irrevogável’
lei da oferta e da procura
Excesso de mercadotem
efeitos severos sobre o
tecidosocial.Nessahora,
Estadotemde ser melhor,
e não pior,que o mercado
R
ecentemente, o“The
New York Times”divul-
goumatéria tratando
de temaque vem rece-
bendoatençãotambémno Bra-
sil: a vendade produtosde hi-
gieneem temposde coronaví-
rus. Algunspaíses,comoos Esta-
dos Unidos,divulgarammedi-
das de acompanhamentoe pu-
niçãopor aumentode preçosde
materiais comoálcool-gel, luvas
emáscaras. Comreceiode san-
ções,plataformascomoAmazon
e Bay passaram a desativar con-
tas de ofertantesque estavam
praticandopreçosmaioresque
em períodos anteriores.O pri-
meiromovimento do tipofoi
vistono Brasilquandoa OAB/CE
solicitouque o governofederal
congeleos preçosde produtos.
Medidas assimparecem uma
soluçãofácil,masnaverdadenão
mitigame muitasvezesaté agra-
vam o problema. Em uma econo-
mia de mercado, opadrãoutili-
zadoparalidarcoma alocação
de um bemescasso é opreço. O
critério é simples: adquireo bem
quemestiverdisposto apagar
mais.Evidentemente, em uma
crisede saúdede tamanhas pro-
porções, esse critérioparece—e
muitas vezesé —perverso. Mas
simplesmente congelar os pre-
çosou impedirvendasnãoelimi-
na o problemaoriginal: há mais
demandadoqueoferta.
Há sériasdúvidas, portanto, se
cortarfornecedores e congelar
preçoséocaminho.Omesmova-
le para o confisco de produtos, já
observadoem algunsEstados.
Tais medidaspodem inclusive
piorara crise. Nos casosde inter-
rupção de fornecedores econfis-
co,oproblemaéóbvio:aoferta
do produtodiminuiaindamais.
Eliminar completamenteome-
canismode oferta edemanda
nãotemsemostradoeficiente.
Oresultadodas medidasado-
tadasnocasoAmazonfoiindese-
jado:o vendedortem umade-
manda reprimida e grande
quantidadede produtodisponí-
vel, mas é impedidode vendero
material.Já ocongelamento,pa-
ra alémde não endereçaro pro-
blemada ofertaescassa,pode
tambémpiorá-lo.
Éque o mecanismode ofertae
demandaoperade formaque, se
a procurapor um determinado
produtoaumenta,aumentatam-
bém oincentivopara que ele seja
fabricado. Boa partedesse incen-
tivo paraaumentode produção
passapor umafase inicialde es-
cassez,em que ovalor do produ-
tonaprateleirasobe.Seospreços
são congelados,o mecanismo
podefalhar, afinalo produtor
não verifica o benefício em au-
mentaraofertaaomercado.
Umasériede iniciativas por
partede entesvariados do gover-
no tem sidonoticiada,iniciativas
essasque fogem—eexpressa-
menteafastam—asoluçãode
congelamento. ASecretaria Na-
cionaldoConsumidor(Senacon)
emitiunotatécnicasobreotema,
como objetivo de “disseminar
um guiainterpretativode atua-
ção de eventualabusividadedos
aumentosde preçosde determi-
nados produtos e serviços”. O
ConselhoAdministrativo de De-
fesa Econômica(Cade)noticiou
aaberturadeprocedimentopara
averiguarse empresas estão“au-
mentandoos preçoselucrosde
formaarbitráriaeabusiva”.
Evidenteque asinalização para
o setor privadode que o poder pú-
blicoestá atento apossíveis movi-
mentos abusivos enão será tole-
rante comilicitudes é meritória.
Porém é provável que investiga-
ções comoessas,pela sua própria
natureza,levemalgumtempoase-
rem concluídas. Não é simples
apurar em concretoaabusividade
de condutas, exatamente porque
essaanálise,paraserbemfeita,exi-
ge muitos cuidadosdas autorida-
des. ComoaprópriaSenacon ex-
põe, é precisoidentificar o produ-
to, delinearomercado e aconcor-
rência, entendera cadeia produti-
va, e só entãoavaliar a racionalida-
deeconômicadaprática.
Tempoé um recursoescasso
no contextode pandemia.Agir
com rapidezé essencial.Por isso,
por meritóriasque sejam as
açõese por mais que possamim-
pactarde maneiradeterminante
o setorprivado, elas não resolve-
rão por completooproblema
central:afalta de produtoses-
senciais paraacorretaproteção
dos profissionais de saúdelidan-
docomocoronavírus.
Se é verdadeque congelamen-
to etabelamento apresentam
problemasde efetividade,étam-
bém verdadeque alei de ofertae
demandanãoéumaleidafísicae
muitomenosestá escritaem pe-
dra. Em situações de crise huma-
nitária,em que o ajusteentre
ofertae demandapode demorar
—ou sequeracontecer—não é
insensatoexplorar medidasque
transgridamas leis do mercado,
ainda que temporariamente.
Maséprecisofazê-lodemodoin-
teligente:privilegiardesviosde
ofertapara hospitais,permitirao
Estadoexercerseupoderdecom-
pra por meiode licitaçõesmais
abrangentes,estimularouso de
substitutospróximosaoproduto
com a demandainflada,ou esti-
mularque plantasoriginalmen-
te destinadasafabricarum dado
produtopassema fabricarou-
trossãoalgunsexemplos.
Na França,essa últimasolução
não dependeudo incentivoesta-
tal: aLouis Vuittondeterminou
que todasas suas plantasde per-
fumariapassemaproduzirálco-
ol gel. Em 72 horasa empresa
conseguiuarticularo desviode
produção, aprovaroprodutofi-
nal juntoaos órgãossanitáriose
colocá-loàdisposiçãodosistema
públicode saúde.A produçãose-
rá por tempoindeterminado. No
Brasil,algosemelhanteocorreu
com aAmbev, que se comprome-
teu a produzir500 mil unidades
de álcoolgel em plantasno esta-
do do Rio de Janeiro. No Reino
Unido, por sua vez, o governoso-
licitouaempresasdeautomóveis
que passemafabricarrespirado-
res, pedidoque foi prontamente
atendido por gruposcomoLand
Rover, RollsRoycee4.
Qualquerque seja asolução
adotada,primeiroéprecisocom-
preenderse há escasseze, princi-
palmente, o porquê.Precisamos
evitaro cicloviciosoda escassez,
que podecomeçarpor umaes-
tratégia de congelamento de
preços, acirrando o problema.
Em seguida, pensar soluções
criativasque, comodito, prova-
velmente se afastamda defesa
dogmáticada “lei natural”dos
mercados.
Não é só quandoos mercados
falhamqueintervençõesdoEsta-
do se justificam. Às vezesoexces-
so de mercadopodegerarefeitos
severossobreotecidosocial.Essa
constataçãonão é nova,nemna
teoria,nem na prática,mas res-
surgesempreque algo comuma
todahumanidade vemàtona,
nessecaso,onossoinstintode
autopreservação. Mas nessahora
o Estadoprecisa ser melhor, e
nãopiorqueomercado.
ViniciusMarquesde Carvalhoé sócio
da VMCA, professorde Direito Comercial
da USPe ex-presidente do Cade.
STEFANWERMUTH/BLOOMBERGLuta contra covid-19 segue,
sem e apesar de Bolsonaro
O
presidenteJairBolsonaronãofoi
infectadopelocoronavírus,mas
ocomportamentode
parlamentares,governadorese
ministroséodecomoseele
tivessesido—umprudenteafastamento.O
presidenteestásendoisoladoeembreve
estaráfalandosozinhonoscorredoresdo
poder,àesperadequesuaturmanasredes
sociaisaindaoescutecomatenção.
Oafastamento,comonocasodocoronavírus,
éumaestratégiadedefesa.Oministroda
Saúde,LuizMandetta,segueemfrentecoma
únicaestratégiasensataecientíficadisponível
paraopaís—quenãopossuiinsumos
suficientesparatestesemmassa.Oministro
PauloGuedesacordouparaanecessidadede
criarumarededeproteçãosocialàalturada
devastaçãoeconômicaqueacovid-
provocaráeoCongressoaceleroueaperfeiçoou
asmedidasqueestãoprestesaserexecutadas.
Diquesdedefesanasaúdeenaeconomiaestão
sendolevantadosemumauniãodeesforços.Só
opresidentedaRepúblicaagecomosetudo
issofossebobagem.
Bolsonaroseelegeuporumpartido
inexistente,quesetornouosegundomaior
daCâmara,masbrigoucomele.Sóentrouna
discussãodareformadaPrevidênciapara
aprovarbenefíciosamilitaresepoliciais.
SentouemcimadaimportantePEC
emergencial,que,comoonomediz,era
urgenteeprioritária.Brigoucomos
presidentesdaCâmaraedoSenado,e
participoudemanifestaçãocontrao
LegislativoeoSupremoTribunalFederaljá
comoBrasilhospedandoocoronavíruse
contrarecomendaçãodoministrodaSaúde.
OpresidentereuniuministrosnoPlanalto,
nosábado,paraunificarodiscursode
enfrentamentodapandemia.Nodia
seguinte,foipassearpelocomérciodas
cidadessatélitesdeBrasíliaeusarsua
ignorânciacomoarmadepropaganda.A
todomomento,Bolsonaroameaçaassinar
umdecretoparaacabarcomoconfinamento
ecolocartodosdevoltaaotrabalho,em
plenacurvaascendentedacovid-19nopaís.
Anteontem,enquadrouasentrevistas
conduzidasporMandettaeseustécnicossobre
oandamentodasaçõescontraovírus.Cercouo
ministrodaSaúdecommilitaresdeseu
ministério(comexceçãodeÔnyxLorenzoni)e
pôsMandettaparafalarporúltimo.Oministro
BragaNetto(CasaCivil)apropriou-seda
respostaaumaperguntasobreademissãode
Mandettaedissequeogovernonãocogitava
dela“nomomento”.Daentrevista,soube-se
menossobrealutacontraocoronavírusemais
sobreaguerraintestinanogovernopromovida
pelopresidente.
Comisso,maisgentesaidepertode
Bolsonaro.OministroSergioMoro,naponta
dospés,começouadistanciar-sedeBolsonaroe
Bolsonaroareclamardelepornãodefendê-lo.
PauloGuedesdisseque,“comopessoa”preferia
ficaremcasa—presume-sequeapessoado
ministrotambém.Oslíderesdogovernona
Câmara,EduardoGomes(MDB-TO)eno
Senado,FernandoBezerra(MDB-PE),seuniram
paradefenderemnotaodistanciamentosocial
nocombateàpandemia.OpresidentedoSTF,
DiasToffoli,fezomesmo.
Diantedeumadevastadoracrise,o
presidenteresolveudesacreditaroqueseu
própriogovernofaz,assediaroministroda
Saúdeeentraremguerracomquemnão
compartilhasuavisãotacanhadomundoeda
política.Paradeterocontrolequelheescapa,
Bolsonaro,viaCasaCivil,ordenouquetodasas
notassobreapandemiasaídasdosministérios
terãodeobteravaldoPlanalto.Asentrevistas
deministrossobreoassuntoterãodeserfeitas
noPlanalto,emcoordenaçãocomaSecom,
dirigidapeloinfectadopelocoronavírusFábio
Wajngarten.Teme-seagorapelaqualidadedas
informaçõespúblicas.
Emnenhummomentoatéagorao
presidentedaRepúblicademonstroua
menorpreocupaçãocomasaúdealheia,
porqueeleachaquenãoexisteameaça.
Mandatáriosdeoutrospaísesestão
ganhandopopularidadepeladeterminação
decombaterapandemiaediminuiroquanto
forpossívelonúmerodemortes.Bolsonaro
projetou-se,emummundoquetinhaaté
ontemmaisde41milmortos,comoumdos
líderesmaisirresponsáveisdoplaneta.
Bolsonaroachaquecomatitudes
deploráveiscomoasquetomasesairábemde
umjeitooudeoutro.Seapandemiafor
domada,ecompoucosmortos,seugoverno
levariaafama.Seocaosseinstalarapósou
duranteaquarentena,aparecerácomoo
únicoisentoderesponsabilidadeporterse
insurgidoantes.Correoriscodeterimpedido
osalvamentodemilharesdevidaseser
culpadopelodesastrequepodeseseguir.
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