Minha primeira montagem, intitulada “Histórias das Ideias do Zé” trazia,
além do conto a que o título faz referência e que serviu como narrativa guia e geral,
mais cinco histórias de autores brasileiros, além de um poema de encerramento. Em
comum, personagens à margem, diferentes ou esquisitos, o momento de
rompimento com a opinião ou julgamento alheios, e a decisão de se aceitar. Somada
a isso, uma afeição pessoal pela palavra poética, que permeava todos os contos e
revelava a beleza admirável da língua materna.
A poesia sempre está presente nas minhas escolhas e creio que é por causa
dela que decidi trabalhar com a palavra. Ela também é minha ótica, referenda minha
intuição.
O contato com a poesia desde muito cedo me possibilita aguçar a percepção
para elementos banais e contemplá-los de forma artística. É algo que
verdadeiramente transforma o modo de ver o mundo. Sob a perspectiva da poesia,
o ordinário vira extraordinário, o vulgar ganha brilhos. E é preciso conviver com a
poesia, ler ou ouvir cotidianamente para que ela esteja incorporada ao ser. Acredito
que o olhar poético, que distende o real, que subverte as coisas do mundo, seja
facilmente estimulado e praticado pelas crianças. Por isso minha admiração eterna
por adultos que perpetuam em sua existência a investigação poética sobre os seres
e as coisas.
Misturados à poética da vida, estão os sonhos, as memórias, o que nos
contaram e nos mostraram. Tudo o que é significativo e no que acreditamos como
valor e afeto são fundamentos para se contar uma história. O que constitui o humano
do ser contador deve estar nos relatos.
A narração não conta apenas a sequência de episódios que configuram o
texto, mas revolve e faz emergir a vida do narrador, conferindo para si
singularidade.
No caso da montagem do espetáculo “Linhas e Tramas”, em 2016, o que me
moveu foi uma vivência pessoal, que me levou ao tema. Minha mãe havia partido
há três meses, estávamos processando a saudade, o entendimento da doença, o
susto, o cansaço. Estávamos mexendo nas coisas dela, destinando roupas e sapatos,
guardando alguns objetos de estima, os óculos, o leque, um pingente. E foi aí que
me deparei com uma herança: um armário cheio de tecidos, caixas com novelos de
lã, linhas de todas as cores, a máquina de costura, pedaços de renda, de fitas, botões,
agulhas de crochê, tricô.
casulo21 produções
(Casulo21 Produções)
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