MAT1AS AIRES RAMOS DA SILVA DE EÇA
guém lhes examina se os passos com que sobem são
justos ou injustos; as asas da vaidade também se
derretem. Quem não tem vaidade não desperta a dos
outros contra si.
(125) Os que crêem que sabem mais que os outros,
ou se enganam, ou se persuadem bem: se se enganam,
o mesmo engano lhes serve de ludíbrio; se se
persuadem bem, a vaidade da ciência os faz tão ferozes
e severos, que ficam sendo insuportáveis. A ciência
humana comumente se reveste de um ar intratável;
imagem tôsca, desagradável, e impolida. A
especulação traz consigo um semblante distraído, e
desprezador; quanto melhor é uma ignorância civil.
Tôda a ciência se corrompe no homem; porque êste é
como um vaso de iniquidade, que tudo o que passa por
êle, fica inficionado: as coisas trabalham por se
acomodarem ao lugar donde estão, e por tomarem dêle
as propriedades, só com a diferença, de que as coisas
boas fazem-se más, porém estas não se fazem boas.
Nas sociedades, o mal é mais comunicável; a perdição
é mais natural; o que é bom, mais depressa tende a
perder-se, que a me-lhorar-se; os frutos da terra quando
chegam ao estado de madureza, nem persistem nêle,
nem retrocedem para o estado de verdura; antes
caminham até que totalmente se arruinem; por isso o
último grau de perfeição, costuma ser o primeiro na
ordem da corrupção. Naquilo em que a Providência
não predefiniu um ser permanente, e inalterável, a na-
tureza não cessa de mover-se enquanto não desfaz,
enquanto não corrompe, e enquanto não acaba. A
ciência acha no homem propensão para a vingança,
para a ira, para a ambição, e para a vaidade; ne-