matias

(Zelinux#) #1
REFLEXÕES SÔBRE A VAIDADE DOS HOMENS

São raros os que nas letras buscam a ciência; (128) o que
buscam, é utilidade e aplauso; êste é objeto da vaidade, aquêle
da ambição; outros há, que quando buscam as ciências, nelas
buscam tudo, não só interêsse, louvor, e aprovação dos
homens, mas também um quase domínio dêles; as letras são
armas com que querem adquirir sôbre os mais homens um
direito de conquista: esta idéia ou esperança, parece que nasce
com êles, e com êles cresce; ainda estão nos primeiros
elementos das primeiras artes, quando logo se propõe aquêle
intento, para êste se encaminham todos os seus passos; das
virtudes e dos vícios seguem aquêles, que conduzem para
aquêle fim; e assim não são virtuosos, nem viciosos por
natureza, mas por ocasião: a natureza não os fêz maus nem
bons; êles é que se fazem a si, por seguirem o que a ocasião
pede. Sempre estão prontos para deixarem a virtude e
abraçarem o vício, e também para deixarem êste, e abraçarem
a virtude, contanto que disso dependa a sua elevação. Desleal-
dade, fé, religião, hipocrisia, tudo para êles vale o mesmo;
olham para os vícios e virtudes, como por vários instrumentos
de que um artífice perito se sabe servir a tempo, não segundo
o que a razão pede, mas segundo o que pede a obra: para que
ninguém os siga, nem conheça, vão desfazendo ou escondendo
os degraus por onde sobem, e só no último se mostram, mas
então já têm na mão o raio, já não são imagens de pequena
consequência; são constelações formidáveis e funestas; àquela
altura nenhum incenso chega; o respeito mais profundo é
vulgar; o que exigem, é silêncio e adoração; e ainda esta há de
ser de longe, porque o chegar a êles de algum modo é
sacrilégio. Os sábios venturosos, de tudo fazem asas, até das
coisas mais impróprias para voar; por isso qualquer crime
nêles fica sendo uma

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