ânimo de render, mas de render-se; fatal combate, em
que a maior fôrça consiste na falta de fortaleza, e em
que o ficar vencido, é o meio por onde a vitória se
segura; mas se nem o amor, nem a ambição, nem a
grandeza puderam conquistar um peito heróico, lá vem
finalmente a vaidade e esta sempre vem feita invisível,
e acompanhada de todas as paixões, mas disfarçada; o
desejo, a dissimulação, a preguiça, e a inveja, vêm
cobertos de um faial modesto, e trazem no semblante
um ar composto, e humilde; a vingança, a soberba, a
rapina, e a altivez, vêm cobertas de fumos de várias
côres, e de diferentes formas. Assim se introduz
enganosamente a vaidade, e assim vive em nós sempre
escondida, como inimigo oculto, e traidor; ela
transfigura os vícios para os fazer apetecíveis, e
quando os deixa ver, e por algum interposto meio, por
onde êles mostrem o contrário do que são. Havendo
tantas ciências, apenas há alguma que faça, que nos
conheçamos a nós, nem aos nossos vícios, nem a nossa
vaidade. As ciências humanas, que aprendemos,
comumente são aquelas, que importava pouco que
soubéssemos; devíamos aprender-nos a nós, isto é, a
conhecer-nos; de que serve o saber, ou pretender saber,
como o mundo se governa, ao mesmo tempo que
ignoramos, o como nos devemos governar? Para tudo
fomos sábios só para nós somos ignorantes. Falta-nos
o conhecimento próprio; não porque nos faltem regras,
e preceitos para que possamos conhecer-nos, mas
porque a vaidade se opõe a uma ciência, que faz
humilde a quem a sabe: é arte mui dificultosa de
aprender aquela que nos tira a presunção. Que inútil
coisa é um espelho para quem sabe que se há de ver
nele horrendo, disforme, e macilento! Por isso fica
sendo como
zelinux#
(Zelinux#)
#1