DOSSIÊ SUPER 57
Um superego dominante
gera um indivíduo moralis-
ta. Um perfil que se encaixa
em fanáticos religiosos, que
vivem à base de proibições.
Saco de pancadas
Sim, o conflito entre essas três ins-
tâncias é um verdadeiro MMA no
nosso ringue psíquico. E quem toma
porrada é sempre o ego. De um lado,
precisa dar uma chave de braço no id
para conter seus impulsos agressivos
e sexuais –, mas não com tanta força
que o impeça de aliviar a tensão que
um desejo impõe. De outro, precisa
suportar os cruzados do superego,
que quer construir o indivíduo mais
certinho da humanidade, criado à base
de leite com pera. “Vemos esse ego
como uma pobre criatura submetida
a uma tripla servidão”, diz Freud, “que
sofre com as ameaças de três perigos:
do mundo exterior, da libido do id e
do rigor do superego”.
Com golpe vindo de todo lado, não é
de se estranhar que haja tanto remédio
para ansiedade. Nossos sentimentos de
culpa, que geram uma baita tensão,
nascem desse conflito entre o ego e o
superego, entre aquilo que somos e o
que a parte mais moralista da nossa
personalidade gostaria que fôssemos
- na nossa mente, o nosso eu está sem-
pre sendo julgado.
Transferindo para um exemplo do
cotidiano, essa tensão se manifesta
sempre que você termina de raspar uma
lata de leite condensado. Muita gente
com problema de peso tem de encarar
essa briga de foice entre um id devo-
rador e um superego fazendo cara de
“que absurdo” diante da balança.
Como, então, sair inteiro desse ringue
psíquico? Freud usou a expressão for-
ça do ego para se referir à capacidade
de a mente lidar com instâncias em
conflito. Um ego forte permite admi-
nistrar bem essas pressões, impedindo
que uma das instâncias seja tão domi-
nante que resulte em uma personali-
dade desequilibrada.
Alguém que tenha o id hiperativo
tende a ser excessivamente impulsivo
e incontrolável na busca por satisfazer
seus desejos. É o perfil clássico do
psicopata, a pessoa que não pensa du-
as vezes em pisar nos outros para
atingir o que quer. O traficante co-
lombiano Pablo Escobar, responsável
por cerca de 4 mil assassinatos, é um
bom exemplo. Quando soube que um
garçom havia roubado prataria da sua
casa, Pablo ordenou que seus jagunços
amarrassem os pés e as mãos do rapaz
e o jogassem na piscina – onde, claro,
o garçom morreu afogado. Além da
desproporção do corretivo – “você
rouba uns garfos meus, eu te mato” –,
não havia, na mente de Pablo, força
do ego suficiente para deixar a ação
para outra hora, até o momento em
que a raiva passasse. Com o id a toda,
Escobar assassinou o garçom bem no
meio de uma festa, na frente dos seus
próprios convidados.
Já um superego dominante gera um
indivíduo moralista, paralisado pelos
impedimentos que sua mente impõe a
vida toda. É um perfil que se encaixa bem
nos fanáticos religiosos, que guiam suas
condutas tendo como ponto de partida
sempre um conjunto de proibições.
A boa notícia é que esse conflito é pro-
dutivo também. As três instâncias tra-
balham juntas na formação do seu com-
portamento. O id cria as demandas, o ego
acrescenta as necessidades da realidade,
e o superego incorpora a moral à ação.
Segurando a onda dos elementos mais
radicais dessas influências, o resultado
pode ser um indivíduo em paz consigo
mesmo – ainda que, às vezes, sua men-
te tenha de recorrer a escudos e disfar-
ces para chegar lá.
“Vemos o ego como
uma pobre criatura
submetida a uma
tripla servidão:
do mundo exterior,
da libido do
id e do rigor
do superego.”
imagem: Getty Images
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