DOSSIÊ SUPER 61
Para Freud, estamos condenados
à infelicidade por viver numa
cultura que reprime nossos impulsos
primitivos, capazes do suicídio ou
de explodir o planeta. É o que ele
chamou de “mal-estar na civilização”.
O anO era 1932. Albert Einstein (1879-1955)
foi convidado pela recém-criada Comissão Per-
manente de Letras e Artes da Liga das Nações
para debater com um interlocutor escolhido
por ele sobre algum tema de interesse geral
do planeta. O físico quis tratar das razões que
levam os países a conflitos armados e esco-
lheu Sigmund Freud para trocar cartas sobre
o assunto. Falar a respeito da paz mundial,
aliás, fazia todo o sentido na época – não era
só papo-furado de Miss Universo. A Primeira
Guerra, aquela que os mais otimistas achavam
que seria “a guerra para acabar com todas as
guerras” havia terminado só 14 anos antes,
deixando cerca de 18 milhões de mortos. Na-
quele mesmo 1932, o Partido Nazista elegeria
230 deputados e se tornaria o segundo com
maior representação no Parlamento alemão.
No começo do ano seguinte, Hitler se tornaria
chanceler da Alemanha.
Foi nesse cenário de ódio e instabilidade
internacional que Einstein – pacifista decla-
rado – tomou a iniciativa de escrever para
Freud. O teor da mensagem era justamente
um pedido de “esclarecimento psicológico”
sobre o que seria possível fazer a favor da
paz. Mas a resposta não foi bem o que o fí-
sico esperava. “Vigora no homem uma ne-
cessidade de odiar e aniquilar”, escreveu
Freud. “Tal predisposição, em tempos nor-
mais, apresenta-se em estado latente e só vem
à tona no anormal. Mas ela pode ser desper-
tada com uma relativa facilidade e se inten-
sificar em psicose de massa.”
Diante de uma declaração que mais parecia
argumentar a favor da guerra – como uma
extensão inevitável da natureza humana –, o
pai da relatividade pediu mais explicações ao
pai da psicanálise. A nova resposta veio, então,
em forma de um manifesto político, intitula-
do Warum Krieg? (“Por que a guerra?”).
Nesse texto, bem mais extenso do que a car-
ta de três páginas com que Einstein tinha
começado o debate, Freud não chegou a negar
o que já havia dito, pelo contrário: “Não há
perspectiva de abolir as tendências agressivas
do ser humano”. O que passa perto de ser
otimista na carta de Sigmund Freud a Albert
Einstein é justamente a ideia que, se temos
uma energia mental voltada à destruição, ela
tem uma contrapartida que busca a autocon-
servação e a união dos povos. Para Freud,
um caminho possível para se evitar a guerra,
então, passaria por manter internalizada es-
sa energia destrutiva e dar espaço para que
as pessoas externem um impulso que ele
associou a Eros, o deus do amor. Quando
estamos na base do All You Need is Love,
formamos laços emocionais com as pessoas
e desenvolvemos a empatia, dois importan-
tes antídotos contra a guerra.
Freud diz ainda que o desenvolvimento
da cultura ou da civilização, ao colocar obs-
táculos aos nossos impulsos destrutivos
- afinal, não dá para viver em sociedade
sendo um cão raivoso o tempo todo –, é o
que dá melhor resultado na prevenção de
grandes conflitos. Até que conclui a carta
torcendo para que, num futuro indetermi-
nado, diversas circunstâncias contribuam
O
imagem: Getty Images
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