O Estado de São Paulo (2020-06-02)

(Antfer) #1

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H2 Especial TERÇA-FEIRA, 2 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


SONIA RACY


DIRETO DA FONTE


‘AQUI, NEGRO MORTO


É SÓ ESTATÍSTICA’


MÚSICA

O nome do primeiro DVD
de Rennan da Penha não
poderia ser mais sugestivo
para o momento do DJ. Se-
gue o Baile sai no dia 12 –
com eventos como shows e
bailes funks parados pela
pandemia. Também remete
à boa fase de Rennan que,
desde que saiu da prisão no
fim do novembro do ano
passado, emplaca clipes
com milhões de visualiza-
ções nas redes.
Nome conhecido do funk
carioca, Rennan recebeu
apoio de diversos artistas
que consideravam injusta
sua segunda prisão pelas
acusações de “associação ao
tráfico de drogas e de produ-
ção de músicas com apolo-
gia ao uso” – pelas quais ain-
da responde processo.
Criado no Complexo da Pe-
nha, no Rio, o DJ falou à co-
luna sobre a pandemia nas
comunidades, o futuro dos
bailes, sua prisão e sobre as
mortes do garoto João Pe-
dro, em São Gonçalo, e do
americano George Floyd,
nos Estados Unidos.

lVocê organiza bailes funk
há bastante tempo. Co-
mo imagina que será a
volta depois da pan-
demia?
Acho que os bai-
les fora das co-
munidades,
em lugares
mais centraliza-
dos, voltam an-
tes. No Baile da
Gaiola iam de 7
a dez mil pes-
soas. Com um
artista mais co-
nhecido, chega-

va até a 20 mil pessoas. Nin-
guém vai ter coragem, vai ser
realmente bastante difícil.

lVocê acha possível fazer um
baile com isolamento social?
Acho que é impossível por-
que, cara, é baile, é funk...É
um ritmo sensual, é um rit-
mo que todo mundo quer
dançar perto, entendeu?

lMuitos artistas estão fazen-
do lives. Você acha que a pan-
demia vai mudar alguma coisa
na indústria da música perma-
nentemente?
As lives são boas por um
lado e ruins pelo outro.
Tem muita gente envolvida
na indústria da música que
não está ganhando nada
com isso, como donos de
casas de shows, pessoas
que trabalham nos bares,
técnicos. Também para os
artistas não é a mesma coi-
sa. Não tem calor humano,
Live é uma parada que não
é normal pro artista.

lComo avalia a situação da
pandemia nas comunidades?
Eu ainda tenho família lá.
Está diferente, não tem
mais o fluxo que costumava
ter, está todo mundo de
máscara, mas muita gente
ainda tem que continuar
saindo pra trabalhar, fazer
suas coisas. Pô, eu acho que
esse isolamento social não
é pra todo mundo, enten-
deu? Não tem como as pes-
soas deixarem de ter conta-
to com outras porque às
vezes elas não têm opção,
realmente precisam.

lPode dizer que tirou algo
positivo de suas passagens

pela prisão?
Fiquei feliz pelas pessoas
que me apoiaram e eu nem
sabia que me conheciam.
Até queria aproveitar e agra-
decer a Leandra Leal, a Pau-
la Lavigne, o Emicida. O po-
sicionamento desses artistas
me ajudou muito. Nos sete
meses que eu fiquei lá tam-
bém soube dar valor ao meu
trabalho, minha família.

lComo foi ver o reconheci-
mento do seu trabalho?
Eu vivi na favela, eu não es-
perava que o meu trabalho
pudesse se expandir tanto,
porque até um tempo o DJ
não era tão valorizado co-
mo é hoje. Pô, eu fiquei sa-
bendo que eu ganhei um
prêmio no Multishow den-
tro da cadeia.

lO assassinato de uma ho-
mem negro pela polícia gerou
uma onda de protestos. Por
que não há o mesmo tipo de
reação no Brasil?
É triste porque eu cresci
vendo isso. Assistindo a tiro-
teios... Já vi bala acertar mi-
nha escola. Acontecia o tiro-
teio e eu achava normal. O
nosso País não muda. Várias
pessoas sofrem com isso
diariamente e não acontece
nada? Aqui, um negro mor-
to pela polícia é só estatísti-
ca. Aconteceu com o João
Pedro, aconteceu com a me-
nina Agatha. Uma criança
não substitui a outra, enten-
deu? As pessoas estão dei-
xando de lado o que real-
mente tá acontecendo nas
comunidades. No caso dos
Estados Unidos, eu prefiro
nem ficar vendo porque me
faz muito mal. A vida de um
negro é tão insignificante a
ponto do cara dizer que não
estava respirando e o poli-
cial continuar colocando
todo peso no pescoço de-
le?/MARCELA PAES

Colaboração
Cecília Ramos [email protected]
Marcela Paes [email protected]

O artista plástico Christo, famo-
so por suas colossais criações
baseadas em monumentos co-
mo o Pont Neuf em Paris ou o
Reichstag em Berlim, morreu
no domingo, aos 84 anos, anun-
ciaram seus colaboradores em
sua conta oficial do Facebook.
O artista, Christo Vladimirov
Javacheff, “morreu de causas
naturais, em 31 de maio de
2020, em sua casa em Nova
York”, de acordo com uma men-
sagem divulgada por seu escri-
tório na rede social.
Christo formou com sua mu-
lher, a criadora Jeanne-Claude,
um dos casais mais midiáticos
da arte contemporânea. Suas
obras criadas in loco precisa-
vam de anos de concepção e mi-
lhões de dólares para serem rea-
lizadas, embora durassem ape-
nas alguns dias.
Inventor de um novo gênero
artístico, “o tecido do espaço”,
Christo havia envolvido a famo-
sa ponte Pont Neuf, em Paris
(1985), e o Reichstag, em Berlim
(1995), entre outras criações.
De aparência nerd e de ócu-
los, Christo realizou feitos apa-
rentemente impossíveis, como
montar milhares de guarda-chu-
vas gigantes simultaneamente
nos EUA e no Japão e convencer
centenas de parlamentares ale-
mães a deixá-lo envolver o Reich-
stag. Medido pelo número de
pessoas que viram seu trabalho,
ele foi provavelmente o artista
de maior sucesso do final do sé-
culo 20 e início do 21.
O crítico de arte nova-iorquino
Calvin Tomkins maravilhou-se
com os “espetáculos grandiosos,
efêmeros e absurdamente boni-
tos” de Christo, ao notar que sua
própria acessibilidade evocava
“desdém e hostilidade... em cer-
tos setores”. Entre os especialis-
tas do mundo da arte, as instala-


ções de Christo, que exigiam
exércitos de trabalhadores e mi-
lhões de dólares eram, algumas
vezes, vistas como um triunfo do
espetáculo sobre a arte. Mas seus
milhares de desenhos e modelos


  • que ele vendeu para financiar
    seus projetos – eram arte por defi-


nição de qualquer pessoa. De
1987 a 2003, segundo Tomkins,
Christo havia vendido mais de
US$ 66 milhões em seu trabalho.
“Christo viveu sua vida plena-
mente, não apenas imaginando o
que parecia impossível, mas per-
cebendo. O trabalho de Christo e

Jeanne-Claude reuniu pessoas
com experiências compartilha-
das de todo o mundo, e seu traba-
lho é perpetuado em nossos cora-
ções e nossas memórias”, escre-
veram seus colaboradores, na
mensagem.
Nascido em 13 de junho de

1935, em Gabrovo, na Bulgária,
Christo fugiu em 1956 em um
trem de mercadorias do regime
comunista e do realismo soviéti-
co ensinado na Faculdade de Be-
las Artes de Sofia. Em 1958, ele
conheceu aquela que se tornaria
sua mulher, a francesa, Jeanne-
Claude Denat de Guillebon, que
morreu em 2009, em Paris. De-
pois disso, Christo decidiu se es-
tabelecer em Nova York e obteve
a cidadania americana.
Seu último projeto em prepara-
ção, o envoltório do Arco do
Triunfo na capital francesa, anun-
ciado como um dos eventos mais
espetaculares do outono, teve
que ser adiado por um ano devido
à epidemia do novo coronavírus.
“Christo era um grande artista,
capaz de dar uma nova profundi-
dade ao nosso dia a dia. Um encan-
tador. Ele era uma pessoa magnífi-
ca que combinava ousadia, deter-

minação e humanidade profun-
da”, escreveu Serge Lasvignes,
presidente do Centro de Arte Mo-
derna e Contemporânea Pompi-
dou, em comunicado.
“Com Christo, o mundo está se
despedindo de um artista excep-
cional. Sua arte aguçou nossos
sentidos. Com seus envelopes,
frequentemente ocultava o habi-
tual e, assim, tornava o extraordi-
nário visível”, escreveu o presi-
dente do parlamento alemão,
Wolfgang Schäuble, em comuni-
cado. Ao envolver o prédio do Ber-
lin Reichstag em 1995, Christo e
Jeanne-Claude “faziam parte da
história conturbada” do Parla-
mento alemão, diz ele. “Pessoal-
mente, penso no meu ceticismo
inicial em transformar este lugar
repleto de história em uma obra
de arte, e no prazer inesquecível
que trouxe a milhões de pessoas.”
/ COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

A pandemia fez com que Ricardo Almeida tivesse mais
tempo para olhar a sua produção. Com 22 lojas fechadas,
e-commerce funcionando desde abril, o estilista está indo
à fábrica para se reunir com um pequeno grupo de
funcionários e pensar o futuro pós-covid 19. “Vamos
investir com mais força na nossa linha feminina”, revelou
à coluna. E para este Dia dos Namorados, Almeida
montou a campanha “Criando Memórias”. “Mais que um
presente físico, o objetivo, segundo ele, é reviver
memórias afetivas de um relacionamento,
construídas a partir de uma música especial,
resgatando aquela sensação de estar em sintonia
com quem se ama. Uma parceria com o Spotify
para possibilitar a entrega de um presente
acompanhado da música preferida do casal.

lO Green Nation – movimen-
to de cultura, educação e sus-
tentabilidade – realiza live de
seis horas em homenagem ao
Dia Mundial do Meio Ambiente,
em 5 de junho.

lO chef Viko Tangoda já dis-
tribuiu 50 mil marmitas desde o
início da pandemia pelo Projeto
Mesa Solidária, no Largo São
Francisco e outras regiões.
Além de atender médicos que
atuam no combate à covid-19.

lO Suplicy Cafés doou mais
de 220 kg de café especial para o
Hospital das Clínicas, além de
outras instituições, totalizan-
do mais de 61 mil xícaras.

RESPONSABILIDADE
SOCIAL

CHRISTO H 1935 = 2020


POLAROID


Blog: estadão.com.br/diretodafonte Facebook: facebook.com/SoniaRacyEstadao Instagram: @colunadiretodafonte

E agora...


Foi uma surpresa para envol-
vidos com o Movimento Esta-
mos Juntos a dimensão que a
iniciativa suprapartidária to-
mou. Ao que apurou a colu-
na, políticos, jornalistas, ar-
tistas, intelectuais tenta-
vam, ontem, se organizar.

O manifesto, que ainda não
tem porta-voz, busca alguns
nomes e deverá ter outras ini-
ciativas em breve.

Teve gente que disse à coluna
que assinaria “tudo contra Bol-
sonaro”, “contra a escalada au-
toritária”. Teve quem assinou
alegando ser uma forma de
pressionar os brasileiros nos
moldes das Diretas Já – citada,
inclusive, no manifesto.

...vai?


Em tempo: o site do movimen-
to tinha, até ontem, 8 milhões
de acessos. E já sofreu ataques
para sair do ar – ao que teve que
reforçar sua segurança. Mani-
festo já conta com 215 mil assi-
naturas e 100 grupos de What-
sApp criados nos 27 estados.

No front


A Cruz Vermelha tem suas
ambulâncias abastecidas pe-
la BR Distribuidora, que
doou o combustível para 100
veículos da instituição, no
combate à covid-19.

Em família


Foi Andrucha Waddington,
que passa a quarenta com a so-
gra, Fernanda Montenegro,
quem gravou a primeira entre-
vista dela na pandemia. A atriz,
que está em Petrópolis, fala da
sua rotina atípica e sobre o fu-
turo dos artistas. “Não sei, só
sei que não vou me acalmar. Se
eu ainda tiver raciocínio e for-
ça, estarei em ação. É uma am-
bição minha”. Vai ao ar no Cine-
jornal, do Canal Brasil, dia 2.

O ARTISTA DE CRIAÇÕES


Morre, aos 84 anos, o autor de obras que ficaram famosas pelas


grandes proporções; ele “embrulhou” a Pont Neuf, em Paris


SIMON DAWSON/REUTERS - 18/6/2018

Reichstag. Prédio histórico alemão: envolvido por tecido

Caderno 2


COLOSSAIS


Christo. Em frente a seu trabalho, ‘The London Mastaba’, no Hyde Park, em Londres

WASHINGTON POSSATO

REINHARD KRAUSE/REUTERS - 28/6/1995

PAULO GIANDALIA
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