Foram quatro sessões de
videoconferência nas quais alguns
dos julgadores deixaram escapar um
certo tom de passionalidade em seus
votos, a maioria invocando o direito
à “legítima defesa” e o risco de
“erosão da democracia”. Gilmar
Mendes, por exemplo, disparou
contra a Lava Jato, dizendo que os
próprios procuradores da força-
tarefa de Curitiba fomentaram os
“ataques odiosos” à corte. Já o
decano Celso de Mello, dedicou
parte do seu voto para criticar a
“insubordinação” do presidente da
República às decisões judiciais, em
referência à recusa de Bolsonaro em
entregar seu celular à Justiça caso o
ministro decidisse apreender o
aparelho, o que acabou não
ocorrendo. O próprio ministro Luiz
Fux, que cobrava em 2019 que a
investigação fosse remetida à
Procuradoria-Geral da República,
defendeu a manutenção do inquérito
sob a tutela de Alexandre. “É preciso
matar no nascedouro esses atos
abomináveis que veem sendo
praticados contra o Supremo
Tribunal Federal”, disse.
Falando como se fosse um
promotor de Justiça, cargo que
ocupou até o início dos anos 2000,
Alexandre soube usar bem as armas
que tinha para comover os demais
ministros na defesa de seu incomum
inquérito. Escolheu as ameaças mais
duras feitas à corte para ler aos
pares, como a de uma advogada do
Rio Grande do Sul. “Que estuprem
e matem as filhas dos ordinários
ministros do Supremo Tribunal
Federal”, escreveu a mulher em seu
perfil no Facebook, em novembro
do ano passado. “Em nenhum lugar
do mundo isso é liberdade de
expressão. Isso é bandidagem, isso
é criminalidade”, bradou. Segundo a
PGR, a advogada já foi denunciada
pelo Ministério Público na primeira
instância da Justiça local.
Todos os ministros destacaram a
importância de combater a punir os
ataques orquestrados e financiados
contra o Supremo e seus membros,
preservando o direito à liberdade de
expressão assegurado pela
Constituição. Mas coube ao relator
Edson Fachin, com apoio do ministro
Luís Roberto Barroso, tentar
delimitar o objeto do inquérito em
que tudo cabe – coube até a injusta
censura a Crusoé e ao Antagonista,
em abril do ano passado. Agora, a
investigação deve se limitar a
ameaças que coloquem em risco a
independência do Judiciário, e deve
ser acompanhada pelo Ministério
Público, a quem cabe oferecer
denúncia ou arquivar o caso. Nas
palavras de Barroso, o objetivo é
“afastar qualquer interpretação
equivocada de que haja arbítrio
cometido no seio do Supremo
Tribunal Federal”.
A modulação, contudo, não
reduziu os poderes de Alexandre na
condução do inquérito, que já soma
74 procedimentos distintos.
Conforme Crusoé revelou na edição
passada, o ministro montou um
aparato de inteligência e investigação
em seu próprio gabinete e requisitou
peritos criminais de São Paulo para
manter a investigação sob seu total
controle, afastando a participação da
Polícia Federal. Em seu voto, o
ministro afirmou que a PF “não tem
o monopólio da investigação”,
citando como exemplo as CPIs
instaladas no Congresso.
Alexandre concordou com os
limites propostos pelos colegas ao
inquérito, mas continuará sob o seu
crivo a decisão sobre o que
realmente deve ser investigado. Até
agora, segundo ele, 70 dos 74
apensos da investigação já foram
remetidos para investigação ou
julgamento em outras instâncias. Dois
permanecem sob sua batuta e em
segredo, sem o conhecimento