OSADULTOSCOMAUTISMO 57
O CAMPO DO NAMORO É A OBRA-PRIMA de Eli-
zabeth Laugeson, professora do Instituto Semel
para as Neurociências e o Comportamento
Humano da UCLA. Muitos programas de capacita-
ção social perdem eficácia após uma certa idade.
“A maioria dos programas centra-se em miúdos
mais novos”, diz. “Mas será que as capacidades
sociais de que uma pessoa precisa na escola pri-
mária são diferentes das que precisa na fase ini-
cial, intermédia e final do ensino secundário e na
idade adulta? São totalmente diferentes.”
Elizabeth chefia o campo durante todo o fim-
-de-semana e é bondosa, directa e imperturbá-
vel. A sua missão é descodificar o mundo social-
-romântico-sexual. “Não conseguimos namorar
com toda a gente e nem toda a gente consegue
namorar connosco”, diz, repetindo a frase como
se fosse um mantra.
Todas as possíveis facetas da aproximação a ou-
tra pessoa são examinadas a fundo e interpreta-
das ao vivo: namoriscar com os olhos (saber como
olhar de relance e afastar o olhar, em comparação
com nunca olhar ninguém nos olhos ou olhar
fixamente como um zombie); entrar e sair suave-
mente de conversas (“tenho de ir à casa de banho”
foi considerada uma estratégia de saída indese-
jável); a distância adequada a manter durante a
conversa (foi dito a uma mulher que estava dema-
siado longe e ela mudou de sítio, posicionando-se
a apenas 15 centímetros da cara do treinador).
O desleixo foi enfaticamente desencorajado: “É
desrespeitoso para a pessoa com quem nos en-
contramos”, explica Elizabeth. Numa frase que
considero um eufemismo cómico, ela refere-se
assim às pessoas que não cuidam bem da sua hi-
giene: “Raramente conseguem um encontro.”
As perguntas saíam velozmente. Os participan-
tes querem respostas concretas neste domínio,
o mais fluido dos palcos. Elizabeth tenta dá-las.
Uma regra importante: se convidarmos alguém
para sair connosco e essa pessoa não nos der uma
resposta, podemos tentar mais uma vez, mas não
mais do que uma. Uma mulher de pequena esta-
tura levanta a mão. “Isso quer dizer... Duas men-
sagens por dia?” “Não. Duas mensagens”, diz Eli-
zabeth. “Ou por semana?” “Não.” Tentando outra
vez, a mulher pergunta, com voz melancólica: “Só
duas mensagens por hora?” “Desculpa, mas não”,
responde Elizabeth Laugeson.
Há regras que nem esta psicóloga é capaz de
indicar, como a probabilidade de se obter um bei-
jo de boa-noite num primeiro encontro. “Qual a
percentagem de vezes que conseguimos o beijo?”
pergunta um homem, fã da matemática.
Várias pessoas querem saber se devem, ou não,
revelar o seu diagnóstico de autismo. Para esta si-
tuação, diz Elizabeth, não há regra. Para alguns,
é sim: já se assumiram publicamente e sentem-se
orgulhosos. Para outros, é não. Mas se decidirem
revelá-lo, diz, “não apresentem a situação como
uma desvantagem. Digam o que significa para
vocês.” Recomenda-lhes que contem todas as fa-
cetas positivas, como o facto de as pessoas com
autismo tenderem a cumprir regras, a serem fiéis
ou a dizerem tudo aquilo em que pensam.
Estes namoradeiros-em-formação estão espe-
rançosos. Eu também. Por todos eles, pela nossa
sociedade, pelo meu filho e, em particular, pelo
jovem a meu lado, que acena com a cabeça e mur-
mura em voz quase inaudível: “Eu consigo fazer
isto. Posso ser um bom namorado.” j