Banco Central do Brasil
Revista Carta Capital/Nacional - Colunistas
sexta-feira, 31 de julho de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas
da crise anterior e do desastre que a chamada
“política de austeridade” trouxe à Europa.
Talvez essa história interesse aos brasileiros.
A austeridade seguida na Europa como
resposta à crise financeira foi um gravíssimo
erro político e a história econômica torna hoje
tudo mais claro. Se compararmos a política
econômica dos EUA com a europeia, o erro
destaca-se facilmente: a política monetária
expansionista norte-americana recuperou o
emprego e o crescimento muito rapidamente,
enquanto a austeridade europeia prolongou a
crise, agravou a situação social e gerou sérios
problemas para o projeto europeu ao promover
a desconfiança entre os países do Norte e do
Sul, entre o centro e a periferia. O quantitative
easing, instrumento-base da opção monetária
expansionista, foi adotado pelos Estados
Unidos em 2008. Na Europa, só foi adotado em
2015, e sempre com o voto contra da
Alemanha. Eis, portanto, a dimensão do erro –
sete anos de atraso, de equívoco, de
austeridade. Os resultados dessas duas
políticas – a expansionista, nos Estados
Unidos, e a austeritária, na Europa – estão à
vista de todos os que querem aprender com os
fatos. O primeiro teve sucesso. O segundo foi
um fracasso.
Na verdade, bem-vistas as coisas, a política de
austeridade nunca teve fundamento
econômico, mas ideológico. A crise financeira
que começou nos mercados financeiros e nos
títulos financeiros subprime foi rapidamente
transformada pela direita política europeia
numa crise dos Estados “gastadores”. Depois
veio o discurso das chamadas “reformas
estruturais”, as quais, na verdade, nunca
significaram outra coisa que não retirar
proteção legal aos trabalhadores e reduzir os
programas de proteção social. Vista no seu
conjunto, a operação política não foi outra coisa
senão um ajuste de contas histórico com os
avanços sociais europeus. Para a direita, a
crise foi a oportunidade de acabar de vez com
a conversa do modelo social europeu. O alvo
sempre foram as políticas estatais de
redistribuição ou de promoção de igualdade de
oportunidades. Dez anos depois, o discurso
chegaria ao Brasil – as mesmas reformas
trabalhistas e as mesmas reformas
previdenciárias. Tudo igual, tudo
insuportavelmente igual. O mesmo ódio ao
Estado de Bem-Estar Social.
Para a Europa, a grande diferença entre as
duas crises é que aprendemos com a primeira.
Agora sabemos o que significa a austeridade
orçamentária no momento em que as
empresas e as famílias mais precisam do
Estado. Dez anos depois, a Europa descobre-
se enfraquecida com a saída do Reino Unido.
Dez anos depois, a Europa descobre-se
minada pela desconfiança interna. Dez anos
depois, a Europa dá-se conta de que o seu
papel no mundo está comprometido pelo
descrédito da liderança global dos EUA. Dez
anos depois, o mundo está mais desigual e os
Estados nacionais mais fracos, agora que os
povos mais precisam deles. Neste quadro, o
que aconteceu na Europa – retirando as
burlescas encenações de suspense político
com cimeiras inacabáveis – foi uma decisão da
maior importância histórica. Na verdade, tudo
poderia ter sido bem pior. O medo não levou ao
egoísmo e à violência, mas à unidade.
Aprendemos. Aprendeu a Europa, aprendeu a
Alemanha, aprendeu a direita europeia e
aprendeu a esquerda europeia. Talvez o Brasil
possa aprender também com essa história.
Assuntos e Palavras-Chave: Cenário Político-
Econômico - Colunistas