National Geographic - Portugal - Edição 233 (2020-08)

(Antfer) #1

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O

S CHIMPANZÉS não são os únicos primatas
sujeitos a pressões. Apesar da lei e dos cos-
tumes, membros furiosos e impotentes de
comunidades da região ocidental do
Uganda, temendo pelos seus filhos, tam-
bém têm abatido chimpanzés de forma
retaliatória. No fim de 2018, um macho
adulto foi mortalmente ferido com uma lança e
uma jovem fêmea foi espancada até à morte com
paus e pedras. Todas estas ambiguidades materia-
lizam-se com especial gravidade num lugar deno-
minado Bulindi, onde um grupo de chimpanzés e
as suas tensas interacções com as pessoas são estu-
dadas pelo biólogo britânico Matt McLennan.
Matt veio para o Uganda em 2006 como dou-
torando da Universidade Oxford Brookes, para
estudar o modo como os chimpanzés adaptam
o comportamento para viverem numa paisagem
modificada por seres humanos. Ele sabia que a
Reserva Florestal de Budongo era um bom ha-
bitat. Concentravam-se aqui cerca de seiscentos
chimpanzés. Noutra reserva florestal chamada
Bugoma, a cerca de 80 quilómetros para sudoes-
te, vivia um número semelhante destes primatas.
Entre estes dois refúgios existia uma paisa-
gem mista de pequenas explorações agrícolas e
grandes plantações de cana-de-açúcar, com uma
crescente população humana e manchas de flo-
resta cada vez mais pequenas. Cerca de trezentos
chimpanzés habitavam essa zona intermédia,
encontrando refúgio nas pequenas manchas de
floresta, aventurando-se para o exterior em bus-
ca de alimento nas terras cultivadas. Grande par-
te dos terrenos eram privados e, depois da apro-
vação da Lei da Terra, de 1998, que formalizou a
propriedade privada, as pessoas sentiram-se no
direito de abater as florestas e de plantar culturas
no seu lugar. A sobrevivência dos chimpanzés
em tal paisagem tornou-se problemática.
Estas circunstâncias complexas atraíram Matt
McLennan a Bulindi, aproximadamente a meio
caminho entre Budongo e Bugoma, onde encon-
trou um grupo de pelo menos 25 chimpanzés.
Com a colaboração de Tom Sabiiti, um investiga-
dor local, começou a recolher dados ecológicos
fornecidos por provas indirectas, como amostras
fecais e levantamentos de ninhos.
“Descobrimos rapidamente que eles não gos-
tavam de ver pessoas na floresta”, disse Matt. “A
sua estratégia era a intimidação, algo que faziam
com grande eficácia.” Eram sobretudo os grandes
machos que gritavam e batiam no solo, estragan-
do a vegetação. Por fim, os chimpanzés acabaram


por tolerar os investigadores e eles conseguiram
recolher dados durante dois anos. No entanto, o
abate da floresta progredia e os chimpanzés mos-
travam-se mais ousados. O primeiro ataque con-
tra uma criança ocorreu em 2007. No ano seguin-
te, Matt McLennan voltou a Inglaterra e escreveu
a sua dissertação. Quando regressou ao Uganda,
em 2012, para avançar com a investigação de
campo, a situação já mudara.
A maior parte da floresta desaparecera. Cam-
pos de milho, mandioca e batata-doce espalha-
vam-se agora pelas encostas. Havia menos chim-
panzés no grupo local e menos machos adultos.
Os restantes chimpanzés pareciam mais ousados,
sobretudo perto de mulheres e crianças. A sua
dieta incluía mais produtos das culturas huma-
nas, como jacas, causando ressentimento entre
os residentes locais. Matt descobriu que os chim-
panzés de Bulindi lidavam bem com a situação,
pelo menos por enquanto. O seu número aumen-
tou ligeiramente e, para sua surpresa, apareceu
uma jovem fêmea em finais de Dezembro de 2019.
É a primeira vez que uma fêmea migrante apare-
ce em Bulindi desde, pelo menos, 2012.
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