relação com a economia real – comércio e investimentos de longo prazo – e 10 por cento eram
especulativas. Em 1990, essa proporção se inverteu e, por volta de 1995, cerca de 95 por cento de
um valor total imensamente maior era de natureza especulativa, com fluxos diários que geralmente
excediam as reservas em moeda estrangeira das sete maiores potências industriais somadas, ou
seja, mais de um trilhão de dólares, por dia, a curtíssimo prazo: cerca de 80 por cento com prazo de
resgate de uma semana ou menos.
Economistas eminentes alertaram, há mais de vinte anos, que esse processo conduziria a
uma economia de baixo crescimento e baixos salários, sugerindo medidas bastante simples para
evitá-lo. Mas os grandes arquitetos do Consenso de Washington optaram pelos efeitos previsíveis,
que incluem lucros elevadíssimos. Esses efeitos foram ampliados pela alta violenta (de curto prazo)
do preço do petróleo e pela revolução das telecomunicações, ambos relacionados a um gigantesco
setor estatal da economia americana do qual falarei mais adiante.
Os Estados ditos “comunistas” estavam fora desse sistema global. Na década de 1970, a
China estava sendo reintegrada. A economia soviética começou a estagnar na década de 1960; vinte
anos depois, a totalidade do edifício apodrecido veio abaixo. A região está retomando à sua situação
anterior. Setores que faziam parte do mundo ocidental estão retomando a ele, mas a maior parte da
região está voltando à sua função de serviço tradicional, quase sempre sob a égide de ex-burocratas
comunistas e sócios locais de empresas estrangeiras, para não falar do crime organizado. Trata-se
de um modelo conhecido no Terceiro Mundo, assim como os seus resultados. Uma pesquisa da
UNICEF realizada em 1993 estimou um incremento, somente na Rússia, de meio milhão de mortes
anuais como conseqüência das “reformas” neoliberais, que tinham o apoio geral. O ministério russo
da ação social estimou recentemente que 25 por cento da população caiu abaixo dos níveis mínimos
de subsistência, ao passo que os novos dirigentes adquiriram enormes fortunas, outra vez o velho
padrão das semicolônias ocidentais.
São também conhecidos os efeitos da violência em larga escala utilizada para assegurar a
“prosperidade do sistema capitalista mundial”. Uma recente conferência jesuítica em San Salvador
assinalou que, com o decorrer do tempo, a “cultura do terror acabou por domesticar as expectativas
da maioria”. As pessoas talvez nem pensem mais em “alternativas diferentes das apresentadas pelos
poderosos”, para os quais isto é uma grande vitória da liberdade e da democracia.
Esses são alguns contornos da ordem global na qual foi forjado o Consenso de Washington.
A NOVIDADE DO NEOLIBERALISMO
Vejamos mais de perto a novidade do neoliberalismo. Um bom lugar para começar é uma
recente publicação do Royal Institute of International Affairs, de Londres, que traz importantes
artigos sobre problemas políticos e estratégicos. Um deles trata da economia do desenvolvimento. O
autor, Paul Krugman, é um conhecido especialista no assunto. Ele destaca cinco pontos principais
diretamente relacionados com o ‘nosso tema.
Em primeiro lugar, o conhecimento acerca do desenvolvimento econômico é muito limitado.
Nos Estados Unidos, por exemplo, dois terços do crescimento da renda per capita continuam sem
explicação. Da mesma forma, observa Krugman, a história dos sucessos asiáticos percorreu
caminhos que com certeza não condizem com o que “a ortodoxia corrente diz ser a chave para o