Há, porém, alguns setores que foram de alguma forma esquecidos: o Congresso dos Estados
Unidos, por exemplo. Em novembro passado, vinte e cinco parlamentares enviaram uma carta ao
presidente Clinton declarando que as negociações sobre o AMI haviam “chegado até nós” –
presumivelmente através dos esforços de ativistas e de grupos de interesse pt\blico.82 Eles pediam
ao presidente que respondesse três perguntas muito simples.
Primeiro: “Dadas as recentes declarações do governo no sentido de que não pode negociar
complicados acordos multissetoriais e multilaterais sem o recurso do Fast Track, como se explica
que o AMI já esteja praticamente concluído”, com um texto “tão intricado quanto o do NAFTA ou do
GATT” e com medidas que “demandarão uma significativa limitação das leis e das políticas norte-
americanas no que concerne à regulamentação de investimentos municipais, estaduais e federais?”
Segundo: “Como se explica que esse acordo venha sendo negociado desde maio de 1995 sem
consulta nem supervisão do Congresso, sobretudo considerando que este detém a prerrogativa
constitucional exclusiva de legislar sobre o comércio internacional?”
Terceiro: “O AMI estabelece um conceito elástico de ingressos que permitirá a uma empresa
ou investidor estrangeiro acionar judicialmente o governo dos Estados Unidos por prejuízos no caso
de tomarmos medidas que restrinjam a ‘fruição’ de um investimento. É uma linguagem ampla e
vaga que vai muito além do conceito limitado de ingressos estabelecidos em nossa legislação
doméstica. Por que razão os Estados Unidos cederiam de bom grado sua imunidade soberana e se
exporiam à responsabilização por prejuízos sob uma linguagem vaga como a que se refere a
quaisquer medidas ‘com efeito equivalente’ a uma expropriação ‘indireta’?”
Na terceira pergunta, os signatários talvez tivessem em mente a ação movida pela Ethyl
Corporation – famosa produtora de gasolina com chumbo – contra o Canadá, exigindo 250 milhões
de dólares de indenização por perdas de “expropriação” e pelos prejuízos causados à “boa
reputação” da companhia pela legislação canadense que proibiu o MMT, um aditivo da gasolina. O
Canadá considera o MMT uma toxina perigosa e um risco significativo para a saúde, em
consonância com a Agência Norte-Americana de Proteção Ambiental, que restringiu pesadamente o
seu uso, e com o estado da Califórnia, que o proibiu por completo: A ação também exige
indenização pelos “efeitos desalentadores” da lei canadense, que levou a Nova Zelândia e outros
países a rever o uso do MMT, acusa a Ethy1. Ou quem sabe os signatários estivessem pensando na
ação movida contra o México pela Meta1clad, companhia norte-americana de gestão de resíduos
perigosos, exigindo 90 milhões de dólares de indenização por “expropriação”, porque o lugar onde
pretendia depositar seu lixo tóxico foi declarado parte de uma zona ecológica.^83
Essas ações estão se dando sob as regras do NAFTA, que permite que as companhias
processem governos, conferindo-lhes, na prática, direitos de Estados nacionais (e não de meros
indivíduos, como antes). Presumivelmente, a intenção é explorar e, se possível, expandir, os (vagos)
limites dessas regras. Em parte, elas são provavelmente apenas intimidação, um dispositivo típico e
por vezes eficaz à disposição de quem tem muito dinheiro para conseguir o que quer através de
ameaças legais por vezes absolutamente frívolas.^84
“Considerando a gravidade das implicações potenciais do AMI”, concluía a carta dos
congressistas ao presidente, “esperamos ansiosamente as suas respostas a essas perguntas”. Mais
tarde foi enviada uma resposta aos signatários, dizendo absolutamente nada. A mídia foi informada
de tudo, mas não sei de nenhuma cobertura jornalística.^85
mariadeathaydes
(mariadeathaydes)
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