especialmente o dos Estados Unidos, que empurram garganta abaixo dos povos do mundo tratados
comerciais e acordos de negócios que ajudam as grandes empresas e os ricos a dominarem as
economias das nações sem quaisquer obrigações para com as respectivas populações. Esse
processo nunca foi tão claro quanto na criação da Organização Mundial do Comércio (OMC) no
princípio dos anos 1990 e, mais recentemente, nas negociações secretas para a implantação do
Acordo Multilateral sobre o Investimento (AMI).
Na verdade, a incapacidade de propiciar uma discussão sincera e honesta sobre o
neoliberalismo é realmente uma das mais notáveis características da globalização. A crítica da
ordem neoliberal em Chomsky realmente supera os limites da análise corrente, apesar de sua força
empírica e por causa do seu compromisso com os valores democráticos. Nesse ponto, é bastante útil
a análise de Chomsky do sistema doutrinário das democracias capitalistas. A mídia empresarial, a
indústria das relações públicas, os ideólogos acadêmicos e a cultura intelectual em geral jogam o
papel decisivo de fomentar as “ilusões necessárias” para que essa situação intolerável pareça
racional, positiva e necessária, quando não necessariamente desejável. Como destaca Chomsky,
não se trata aqui de uma conspiração formal de interesses poderosos: não precisa ser. Por meio de
uma ampla gama de mecanismos institucionais, enviam-se sinais aos intelectuais, aos eruditos e
aos jornalistas, compelindo-os a ver o status quo como o melhor dos mundos possíveis e a não
contestar aqueles que dele se beneficiam. O trabalho de Chomsky é um apelo direto aos ativistas
democráticos pela reconstrução da nossa mídia, para que ela se abra a perspectivas e investigações
antineoliberais e antigrande empresa. É também um desafio a todos os intelectuais, pelo menos
àqueles que afirmam ter compromisso com a democracia, para que se olhem bem no espelho e se
perguntem em nome de quais interesses ou de quais valores fazem o seu trabalho.
A descrição chomskiana do controle neoliberal/empresarial da economia, da política, da
imprensa e da cultura é tão poderosa e avassaladora que pode provocar em alguns leitores um
sentimento de resignação. Nestes tempos de desmoralização política, alguns poderão ir além e
concluir que estamos enredados neste sistema retrógrado porque, infelizmente, a humanidade é
mesmo incapaz de construir uma ordem social mais humana, igualitária e democrática.
Na verdade, talvez a maior contribuição de Chomsky seja a sua insistência nas inclinações
democráticas fundamentais dos povos do mundo e no potencial revolucionário implícito em tais
impulsos. A melhor prova dessa possibilidade é o ponto a que chegam as forças empresariais para
barrar a existência de uma verdadeira democracia política. Os governantes do mundo sabem,
implicitamente, que o seu sistema foi estabelecido para atender às necessidades da minoria, não da
maioria, e por isso não podem jamais permitir que a maioria questione e modifique o poder das
grandes empresas. Mesmo nas democracias claudicantes de fato existentes, a comunidade
empresarial trabalha incessantemente para evitar que assuntos importantes como o AMI venham a
ser publicamente debatidos. E a comunidade de negócios gasta fortunas financiando um enorme
aparato de relações públicas para convencer os norte-americanos de que este é o melhor dos
mundos possíveis. Por essa lógica, a hora de se preocupar com a possibilidade de uma mudança
social para melhor será aquela em que a comunidade empresarial resolver abandonar as relações
públicas e a compra de cargos eletivos, permitir uma mídia representativa e instalar, de moto
próprio, uma democracia participativa genuinamente igualitária, por já não temer o poder da
maioria. Mas não há razão para pensar que isso acontecerá um dia.
mariadeathaydes
(mariadeathaydes)
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