A loucura da razão econônica- David Harvey

(mariadeathaydes) #1
A questão da tecnologia / 113

que é capital constante (isto é, capital que nao altera seu valor por meio do uso).
O trabalho vivo (e não o trabalho passado) é a única fonte de mais-valor. As má­
quinas apenas ajudam a elevar a produtividade da força de trabalho, de modo que
o valor total permanece o mesmo, enquanto o valor das mercadorias individuais
cai. O resultado é um paradoxo. Máquinas, quando combinadas com trabalho,
produzem uma quantidade maior de mais-valor para o capitalista, apesar de o valor
produzido permanecer constante. Boa parte dos capitalistas (alinhados ao senso
comum) acredita que as máquinas produzem valor e tende a agir com base nessa
crença. Marx considera isso uma visão fetichista. O fetichismo da tecnologia é
muito disseminado e isso tem consequências importantes. Ele leva, por exemplo,
à crença generalizada de que há uma solução tecnológica para qualquer problema
social ou econômico.
A presunção desse argumento é que há uma situação de concorrência bem con­
solidada e ferrenha. Mas e se não for o caso? Afinal, os capitalistas preferem condi­
ções de monopólio ou oligopólio, em vez daquilo que frequentemente denominam
concorrência “ruinosa”. O poder monopólico atenua a força motriz por trás do
dinamismo tecnológico. Mas ela é deslocada, não destruída. A forma social do
mais-valor relativo que deriva da redução no valor da força de trabalho via redução
no valor dos bens salariais permanece. Isso é feito às vezes por meios políticos.
Marx fornece um exemplo de como isso funciona. No século XIX, interesses
industriais ingleses viam que os índices salariais estavam vinculados ao preço do
pão. Eles fizeram campanha (em parceria com os trabalhadores) contra os interes­
ses agrícolas da aristocracia fundiária para abolir as tarifas sobre o trigo importado
e assim baixar o preço do pão. O objetivo dos industriais não era elevar o padrão
de vida dos trabalhadores (embora alegassem com frequência que o faziam para
obter o apoio dos trabalhadores), e sim reduzir os salários e aumentar o mais-valor
relativo (lucros monetários). Pregaram o evangelho do livre-comércio enquanto foi
vantajoso para eles2. A situação nos Estados Unidos hoje é semelhante. Se o valor
da força de trabalho for determinado, digamos, com base no preço dos tênis da
Nike e das camisetas da Gap, então será conveniente para o capital em geral adotar
o evangelho do livre-comércio para esses artigos. Os preços baixos do Walmart para
produtos importados propiciam a redução do valor da força de trabalho e a eleva­
ção da taxa de lucro dos capitalistas dos Estados Unidos. O problema é que os inte­
resses dos manufatureiros e da classe trabalhadora dos Estados Unidos que querem
fabricar camisetas e tênis saem prejudicados, em comparação com os outros setores
do capital que se deleitam com a mão de obra barata vestida, alimentada e entretida
por importados baratos.


2 Ibidem.

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