26 | Valor|Sexta-feira,21deagostode2020
S
empreameaçadas,as liberdadesci-
visseexpandiramnoBrasildaNova
República.Hoje,porém,esse avan-
ço está sendotestadoem diversas
frentes:adisseminaçãodenotíciasfalsasde-
vesercombatidapelalei?Aspessoaspodem
serobrigadasausarmáscarasoutomaruma
vacina?A democraciacomportamanifesta-
ções que defendemaderrubadado próprio
regimedemocrático?
“Depois de duasgrandesditaduras, opaís
ficouvacinadocontraregulaçõesda liberda-
de de expressão. Masas notíciasfraudulentas
eas campanhas de desinformação em massa
nos obrigam a repensar esse ponto”, afirma o
advogado Gustavo Binenbojm, professor da
FaculdadedeDireitodaUniversidadedoEsta-
do do Rio de Janeiro(Uerj),autor de “Liberda-
deIgual:OQueÉePorQueImporta”(História
Real,112 págs.,R$ 34,90). O livro tratadas
questões acimae outras,ligadas ao delicado
equilíbriodasliberdadesnasociedadecivil.
Binenbojmaplicaessasquestõesa episódios
brasileiros,muitosdos quaistiveramatuação
sua.Em2015,elerepresentouoSindicatoNacio-
naldosEditoresdeLivros(Snel)nocasoque,jul-
gadopelo SupremoTribunalFederal(STF),per-mitiua publicaçãode biografiassem autoriza-
ção prévia.Oadvogadodefineesse julgamento
como“raromomentode sentimentoconstitu-
cional”.OentãopresidentedoSnel,RobertoFei-
th, éumdos criadoresdo selo HistóriaReal. Em
junho,Binenbojmfoi tambémum dos signatá-
rios do parecerda Ordemdos Advogadosdo
Brasil(OAB)em que é refutadaa ideia de que as
Forças Armadasexercemum papelde “poder
moderador”noBrasil.Valor:Éinteressantelerumlivrosobreliber-
dadeenquantose estáconfinado...
GustavoBinenbojm:A pandemiaéumbelo
casodoproblemadaliberdade,porqueenvol-
ve responsabilidade. Pensamosque, confina-
dos em casa, condenadosao distanciamento
social, perdemos a liberdade. Mas o exercício
daliberdadeésemprepermeadodedilemase
escolhas trágicas, situações em que se ganha
de um lado e se perde do outro. Em situações
assim,háextensõesecontraçõesdoespaçoda
liberdadeindividualdiantedaliberdadecole-
tiva. Se olharmos a pandemia comoum exer-
cício de liberdade coletiva,aquestão não é
deixar de ser livres,mas descobrir formas no-
vas de exercer a liberdade.Naépocadaaids,temia-seque fosseacabar a liberdadesexual,
mas não:as pessoas passaramaterque exer-
cer essa liberdade com maisresponsabilida-
de. E isso nos torna maishumanos, ao levar
em consideração aliberdade do outro.Ser li-
vreéumexercíciocompartilhado.
Valor:O SupremoTribunalFederalganhou
relevâncianasúltimasdécadas.Muitospensam
quetemusurpadofunções doExecutivoedo Le-
gislativo. Atéondepodeir o STF?
Binenbojm:Um tribunalconstitucionalé
uma instância de poder do Estadosem repre-
sentaçãopopular.Os juízesnão são eleitos,
nemcontroláveis pelasociedade, comoos
membrosdo Legislativo edo Executivo. O
que podeo Supremo?Atuarem defesade va-
loresque a Constituiçãodefende,mas nunca
comoinstâncialegislativa, nemexecutiva. É
tentador,peranteum governodesastradoou
um parlamento omisso,dar um passoaléme
imporseus própriosvaloresà sociedade.Mas
o Supremodeveter autocontenção e cami-
nharde acordo com os valoresque a Consti-
tuiçãoestabelece.Eventualmente, se faltam
regulamentaçõesàConstituição,hámecanis-
mosdeprovocaçãodoLegislativoedoExecu-
tivo para que eles as supram.Às vezesé inevi-ENTREVISTA
Clamorautoritário, campanha dedesinformação e notícia falsa
fazemsociedaderepensaro que é serlivrepara seexpressar,
dizBinenbojm.Por DiegoViana, para o Valor,deSãoPaulo