Record - 20200906

(PepeLegal) #1
FC PORTO 23
6 de setembro de 2020

O presidente Carlos Correia

LUÍS VIEIRA / MOVEPHOTO

ç Cândido é o nome do pro-
prietário do restaurante, com a
mesma denominação, onde
Zaidu fazia as suas refeições. A
amizade entre ambos foi cres-
cendo e agora é tal que o jogador
trata Cândido por... tio. A ida do
‘sobrinho’ para o FC Porto en-
cheu-o de orgulho e, sem sur-
presa, a camisola do lateral, no
caso do Santa Clara, tem sem-
pre lugar de destaque no res-
taurante.
O ‘tio’ de Zaidu sabe que a ta-
refa do jogador não é fácil, mas
acredita que vai conseguir
mostrar, “um pouco como
aconteceu quando chegou aos
Açores”, a sua qualidade. Para
lá da perspetiva futebolística,
Cândido valoriza um “bom
moço” que o fez preocupar-se,
mas valeu-lhe também algu-
mas gargalhadas.

“De facto somos muito ami-
gos. A prova disso é que eu
sempre estive a par de tudo so-
bre a ida dele para o FC Porto e
basta dizer que ainda agora, nas
férias, foi aqui que ele quis vir.
Também passei das boas com
ele...”, atira, para de seguida
explicar: “Foi comigo que ele

viveu as três épocas que esteve
no Mirandela. Lembro-me que
quando chegou, com 19 anos,
pura e simplesmente não bebia
água. Não bebia. Levei-o ao
médico, porque estava a ficar
desidratado e quando saiu o re-
sultado das análises foi um cas-
tigo para o obrigar a beber água.
Para ele era sempre Fanta La-
ranja, sempre. Às vezes uma
Coca-Cola, mas Fanta Laranja é
que era. Água, nada. Tinha
mesmo de o obrigar a beber
água... e não era fácil! No início
ficava chateado e dizia ‘Tio,
água não. Eu gosto é de Fanta’.
Depois o tempo foi passando, lá
se habituou às rotinas de joga-
dor e passou a beber água.” *

EM DESTAQUE. Exibe orgulhoso a camisola de Zaidu no Santa Clara

Cândido, proprietário
do restaurante onde
Zaidu comia, é tratado
como ‘tio’ pelo jogador

Chorava ao telefone
nos primeiros
tempos nos Açores

Para lá da parte física, Cândido
também foi e continua a ser um
alicerce emocional de Zaidu. A
adaptação do jogador que saiu
do Campeonato de Portugal, em
Mirandela, para a 1.ª Liga, nos
Açores, não foi fácil. “Ligava-me
todos os dias no início... ‘Tio Cân-
dido, isto aqui é muito difícil. Eu
vou embora, vou ter com o Rui
Borges a Viseu, que ele quer que
eu vá para lá...’ E eu lá lhe dizia:
‘Não vais nada rapaz, senão nun-
ca mais ganhas estatuto e isso aí
é que to vai dar.’ Ele chorava de
um lado, eu do outro... Depois eu
não ficava bem, ligava-lhe de
novo... Ainda ‘passei as passas
do Algarve’ com ele. Ainda me
fez chorar algumas vezes”, re-
cordou. Ciente de que “no FC
Porto também não vai ser fácil
para ele”, Cândido está seguro
de que terá arcaboiço suficiente
para singrar, ou não seria agora
jogador dos campeões nacio-
nais. “É uma joia de um moço.
Um poço de força e tem uma
vontade que nunca acaba. E
deve ter sido isso que o Sérgio
Conceição viu nele, mas não vai
ter tarefa fácil”, concluiu.

PECULIARIDADES DO JOVEM

LUÍS VIEIRA / MOVEPHOTO

LUÍS VIEIRA/MOVEPHOTO

“ESTAVA A FICAR DESIDRATADO
MAS MESMO QUANDO SAÍRAM
AS ANÁLISES FOI UM CASTIGO
PARA ELE BEBER”, CONTA

ERA SEMPRE FANTA


E ÁGUA... NUNCA


çSaindo de trás do balcão do
seu estabelecimento e sempre
com o dedo indicador em riste,
Cândido fez questão de dizer
que “a mesa dele foi sempre a
mesma”, uma onde, além da
bebida, também havia uma re-
feição preferida. “O que ele
mais gosta é de escalopes com
batatas fritas. Carnes brancas e
um arroz branco também está
bom. No Ramadão era mais
complicado e ele levava o que

tinha a fazer muito a sério. Só
comia depois do pôr do sol, en-
tão tínhamos de lhe preparar
comida para levar para o quar-
to, para comer às 6h da manhã.
Álcool... nada. De resto, quan-
do queria rezar ajoelhava-se aí
na porta, virado para o sol e be-
bia chá”, conta Cândido, sobre
um jovem “muito reservado,
mas também sempre bem-dis-
posto”. Um ‘sobrinho’ que a
vida lhe ofereceu. *

Comer às 6h da manhã


çA ligação de Zaidu a Trás-os-
-Montes e especificamente a Mi-
randela vai, acreditam os inter-
venientes que falaram à nossa
reportagem, para lá do normal.
Ainda assim, algo natural para
quem sente o ‘Reino Maravilho-
so’ celebrado por Miguel Torga
desde sempre como a sua casa.
Lino garante que Zaidu está lon-
ge de ser o primeiro estrangeiro a
deixar-se encantar pelas pessoas
e pela terra, embora o nigeriano


tenha um afeto especial tal que,
por exemplo, na hora de passar
as suas férias antes do arranque
desta época, foi em Mirandela
que esteve duas semanas. “Não
há segredo. Eu acho que os trans-
montanos em geral, os de Cha-
ves, os de Bragança, de onde seja,
sabem receber. A gastronomia é
ótima... Esta cidade é engraçada,
calma, pacata. Damos valor a
quem merece e isso, isso não tem
preço”, rematou. *

Férias no ‘Reino Maravilhoso’


havia potencial. Muito forte fisi-
camente, muito rápido, muito
forte no jogo aéreo. Vimos logo
que estávamos na presença de
alguém que mais tarde poderia
vir a dar frutos. Foi-lhe dada a
oportunidade de jogar, que é o
que um miúdo no primeiro ano
de sénior precisa. Mas notou-se
que ele tinha mais qualquer coi-
sa”, confidenciou. *


PAULO SILVA REIS

Carlos Correia valoriza de sobre-
maneira as capacidades futebo-
lísticas e humanas de Zaidu, tan-
to que “a sua progressão” nos úl-
timos anos “não surpreende,
pois tem muita qualidade”. E há
também um aspeto particular,
relacionado com a religião do la-
teral, que desde sempre seduziu
o agora presidente do Mirande-
la. “Olhem que até mesmo na al-
tura do Ramadão, em que a ali-
mentação deles nem sempre é
feita da melhor forma, o Zaidu
foi muitas vezes considerado o
melhor jogador”, recordou.

Atleta de topo
mesmo no Ramadão

O empréstimo de Zaidu ao Mi-
randela por parte do Gil Vicente
tinha como principal objetivo
oferecer rodagem ao canhoto.
Agora, percebe-se, foi muito
mais do que isso. “O Miguel Pi-
menta, do Gil Vicente, ligou-me e
falou-me de um miúdo nigeria-
no, com muito potencial para la-
teral-esquerdo e se estaríamos
interessados nele, pois tinha
tido uma lesão num joelho e ha-
via interesse em que ele rodasse.
Na altura falou-se com o Cor-
reia, atual presidente, e foi assim
que acabou por vir”, lembrou.

A ideia até era
só dar rodagem
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