a irmã do pai casou-se com o irmão da mãe) Em toda parte onde
o casamento entre primos cruzados não existe, há inúmeros casos em
que, entretanto, os filhos do irmão da mãe e os da irmã do pai são
classificados em uma categoria comum, distinguindo-se dos filhos do ir-
mão do pai e dos da irmã da mãe, chamados irmãos e irmãs Há os
casos, ainda mais freqüentes, em que tennos especiais, ou uma denomi-
nação comum, isolam o irmão da mãe, de um lado, e de outro lado
a irmã do pai, dos tios e tias paralelos geralmente eqUiparados ao pai
e à mãe Há casos simétricos - mas não sempre - em que os sobrinhos
e sobrinhas, descendentes de um irmão ou de uma irmã do mesmo sexo
daquele que fala, são chamados filhos e filhas, ou simplesmente distin-
tos dos sobrinhos e sobrinhas nascidos de um parente do sexo oposto,
enquanto estes são designados por termos diferentes Há os privilégios
matrimoniais do tio materno sobre a filha da irmã, e mais raramente do
filho do irmão sobre a irmã do pai. Finalmente, mesmo na ausência de
toda preferência e privilégio matrimoniais, e às vezes, quando uns e
outros são expressamente excluídos, há uma escala inteira de relações
de caráter espeCial entre primos cruzados, entre tias e tios e sobrinhos
e sobrinhas cruzados, quer estas relações se caracterizem pelo respeito
e pela familiaridade, quer pela autoridade ou Iicenciosidade
Sem dúvida, cada um desses traços pode possuir sua própria his-
tória, e esta pode ser diferente para cada um dos grupos onde o traço
apareceu Mas vê-se, ao mesmo tempo, que cada traço não constitui uma
entidade independente e isolável de todas as outras Cada qual aparece,
ao contrário, como uma variação sobre um tema fundamental, como uma
modalidade especial que se desenha sobre um pano de fundo comum, e
é unicamente aquilo que há de individual em cada qual que pode ser
explicado por causas particulares ao grupo ou à área cultural considera-
das Qual é portanto esta base comum? Só é possível encontrá-Ia na
estrutura global do parentesco, mais ou menos completamente refletida em
cada sistema, mas da qual, porém, todos os sistemas que apresentam
um qualquer dos traços enumerados no parágrafo precedente participam,
embora em graus diferentes_ Como no mundo há muito menos sistemas
dos quais todos estes traços estejam rigorosamente ausentes do que sis-
temas que possuem ao menos um deles, e freqüentemente vários, e co-
mo, por outro lado, os sistemas que correspondem a este critério es-
palham-se em toda a superfície da terra, não há região do mundo que
esteja absolutamente desprovida deles, e assim pode considerar-se que
esta estrutura global, sem possuir a mesma universalidade que a proi-
bição do incesto, constitui, entre as regras do parentesco, aquela que,
logo após a proibição do incesto, mais de perto se· aproxima da uni-
versalidade.
A idéia de que o parentesco deve ser interpretado como um fenô-
meno de estrutura e não como resultado de simples justaposição de
termos ou de costumes não é aliás nova. Foi afirmada por Goldenweiser,
quando observou que devia necessariamente haver uma via de abordagem
dos estudos do sistema de parentesco que eliminasse sua impOSSível com-
plicação aparente, tendo esboçado a análise estrutural de um exemplo
definido.' Leslie Spier mostrou não somente que devia ser esse o ponto
- A. A. Goldenweiser. Remarks in the Social OrganLzation af the Crow. American
Anthropologist. voI. 15, 1913.
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