Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1

A regra do casamento admitindo que um homem C espose uma mu-
lher D, vê-se que Ego pode casar-se com a filha do irmão da mãe, que
se encontra sempre na classe imediatamente seguinte à sua, mas não
com a filha da Irmã do pai, que se encontra sempre na classe imedia-
tamente anterior Esta estrutura característica inverte-se quando se passa
da irmã ao irmão, de tal modo que Ego não pode casar-se com sua
prima cruzada patrilateral, mas o irmão da prima cruzada patrilateral
(que também é Bl pode casar-se com a irmã de Ego (que é C1. Com
efeito, a irmã de Ego é a prima cruzada matrilateral de seu primo pa-
trilatera!. Em um sistema deste tipo, as relações matrimoniais apresen-
tam-se, portanto, sempre como uma cadeia teoricamente indefinida: meu
primo cruzado patrilateral esposa minha irmã, eu esposo minha prima
cruzada matrilateral. o irmão desta casa-se com sua prima cruzada ma-
trilateral, e assim por diante
Na verdade, bastam quatro famílias para
fechar o ciclo, porque há quatro classes, ou um múltiplo qualquer de
quatro (Figura 281.


o = ~
;..-t.,
b B •

A-I,
.-L-,
c C

, I
B= ~ C - d
...-L-, .--L,
= d O = a

Figura 28

Vê-se, por conseguinte, que um sistema de troca generalizada com
quatro classes constitui o modelo teórico do casamento preferencial com
a filha do irmão da mãe_ Exprime, da maneira mais simples, a lei da
dicotomia dos primos cruzados." Atingimos, assim, a fórmula teórica do
casamento Murngin, e ao mesmo tempo encontramos um termo, que falta
na série clássica, o qual é possível ser inserido entre o sistema das I,".
metades e o sistema das oito subsecções, no lugar falsamente ocupado
pelo sistema de quatro secções do tipo Kariera, para explicar a pas- I
sagem da proibição dos primos paralelOS à prOibição de todos os primos ',I
de primeiro grau. Este termo intermédio é o sistema de quatro secções,


  1. Na hipótese da existência anterior de uma divisão em metades patrilineares.
    claro está. Do contrário, bastam três classes. [O simbolismo adotado nas figs. 26,
    27 e 28 conduziu J. P. B. de Josselin de Jong a me atribuir a idéia - que, com
    razão, considera estranha - segundo a qual o sistema murngin derivaria de quatro
    classes, com designação do filho para a classe da mulher· do irmão da mãe (Lévl-
    Strauss. Theory of Kinship etc. M.ededelingen van het Rijksmuseum voor Volkenkunde,
    Ih 10. Leiden 1952, p. 37 e 39-40). Na realidade, não suponho nada disso, porque:
    I" não se trata ainda aqui do sistema murng!n, mas de um modelo hipotético da
    troca generalizada; 2" foi somente por convenção, e para Simplificar a leitura, que
    estabeleci - conforme acha-se explicado na p. 207 - a regra segundo a qual as
    crianças pertencem à classe consecutiva à da mãe. Por conseguinte, a figura 30 não
    representa um estado do sistema (como parece crer Josselin de Jong) , mas uma regra
    de conversão de um estado em outro; é um simples procedimento operatória e não
    a imagem de uma sociedade. JosseI1n de Jong, é verdade, contesta esta liberdade
    que tomei de escolher uma regra de conversão em virtude unicamente de sua sim·
    plicidade, porque se oporia à noção - a que aliás recorro - de descendência uni·
    linear (o. c., p. 40). Mas, conforme indiquei várias vezes, e como meu eminente
    critico reconhece, defini a descendência unilinear de maneira puramente formal, a
    saber, qualquer que seja o elemento da condição pessoal considerado, a descendência
    unilinear, relativamente a este elemento, implica somente uma relação invariante quanto
    ao mesmo elemento da condição dos dois pais, ou de um deles].


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