Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1

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peitar que lhe era fácil verificá-los empiricamente por meio de genealo-
gias se é posslvel dizer "laterais", isto é, destacando um certo número
de exemplos de redes concretas de aliança entre "local groups". No pre·
fácio da segunda edição de A Black Civilizalion, Lloyd Wamer censura-
me - manifestamente sem me ter lido, de tal maneira a fórmula de-
senvolvida que utiliza passa ao lado dos problemas sobre os quais tinha
centralizado minha discussão - por não ter fundado a análise sobre
o estudo das genealogias. Poderia responder: Estou de acordo, mas de
quem é a culpa? Porque é evidente que seu admirável livro consiste
principalmente em modelos abstratos da realidade empirica, mas que os
dados concretos, genealógicos e demográficos, dele estão inteiramente au-
sentes, e deploravelmente nos fazem falta. Não duvido que Wamer os
tenha utilizado para elaborar seus modelos, mas, uma vez que não nos
deixa em condições de tirar dai outras deduções senão as suas, não
tem fundamento em nos censurar por não havê-los utllizado_
Nossa interpretação é diretamente confirmada pelas observações da
srta. McConnel entre as tribos da peninsula do Cabo York, que prati-
cam o casamento matrllateral com os Mumgin, mas não reconhecem,
segundo os grupos, senão cinco ou seis linhagens. Entretanto a nomen-
clatura do sistema estende-se a sete linhagens, como no sistema Murngin.
A autora Indica de maneira formal que a sétima linhagem à esquerda é
apenas o reflexo da primeira à direita." Assim, o ciclo real é mais curto
do que aparece a um exame superficial da terminologia. De fato, no
quadro do sistema Wikmunkan a terceira linhagem à direita da do Ego,
e a terceira à esquerda, repetem a linhagem do Ego, excetuadas certas
diferenças terminOlógicas na geração do Ego e nas duas gerações ime-
diatamente consecutivas, em ordem ascendente e descendente. Estas di-
ferenças podem explicar-se pelo fato de, como se verá no capitulo se-
guinte, cada linhagem subdividir-se em dois ramos respectivamente mais
velho e mais moço, e porque a terceira linhagem à esquerda é represen-
tada por um ramo mais velho, enquanto a terceira à direita é repre-
sentada por um ramo mais moço. Poderia, portanto, acontecer que o
sistema Wikmunkan fosse na verdade um sistema com três linhagens,
asslm como o sistema Mumgin é um sistema com quatro linhagens.
Vê-se, assim, a razão da extensão anormal do sistema e do elevado
número dos termos de parentesco. O alongamento - em si mesmo in-
compreenslvel - do sistema, que o faz englobar sete linhagens, expli-
ca-se quando o concebemos como um sistema com quatro linhagens,
prolongadO por sua própria imagem. Se considerarmos os termos do pa-
rentesco, compreenderemos que cada linhagem, estendendo-se por cinco
gerações e devendo, em cada geração, dispor de um termo para o grupo
masculino e de um termo para o grupo feminino, tenha necessidade de
dez termos. Acrescentemos um termo suplementar na linhagem do Ego,
tomado necessário pelo fato do Ego poder ser homem ou mulher, e te-
remos, para as quatro linhagens fundamentais, quarenta e um termos
de parentesco, isto é, o mesmo número que em um sistema de tipo
Aranda. Mas, como cada linhagem é reproduzida em dois exemplares,
exceto a linhagem do Ego com onze termos, encontramos facilmente o
número setenta e um, que não contém mais nenhum mistério.


  1. U. McConnel, Social Organization Df the Tribes of Cape York península, North
    Queensland. Oceanta. vol. 10, 1939-1940, p. 445.


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