Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1

feito, por Benedict, dos termos: spun, primo; -phu, irmão mais velho;
tshan, primo; tsha, sobrinho ou sobrinha, especialmente filho da irmã
(sendo o homem que fala), e neto. Benedict estabelece, de maneira muito
convincente, a equivalência da distinção tibetana entre phu-spun e tsha-
tshan e da oposição, que já conhecemos, entre os termos Kukis pu, I
e tu, 2 (Figura 69), Isto é, o par de oposições, típico dos sistemas de
troca generalizada e que acompanhamos dos Katchin aos Gilyak (dama
e mayu; imgi e axmalk), passando pelo houen e o yin chineses
Poderemos, em seguida. fazer as indispensáveis restrições sobre o
modo como Benedict trata os sistemas Tibetano e Kuri igualando-os aos
sistemas do tipo Omaha
O tipo Omaha levanta outros problemas, con-
forme mostraremos em outro trabalho. Lembraremos também que Os
esforços para procurar "a explicação última das terminologias Tibetana e
Kuki na prática da tecnonimia"" são vãos e supérfluos, segundo estabe-
lecemos nos capítulos precedentes. Os fatos essenciais que subsistem são
os seguintes: o casamento com a prima cruzada matrilateral, a linhagem
patrilinear exogãmica (rus-pa) como unidade social fundamental e o ca-
ráter respeitoso da relação avuncular, expresso pelo emprego honorífico
(tal como entre os Lakher e os Lushai) do termo que serve para designar
o tio materno.
A prova dessas inferências é encontrada por Benedict nO texto de
um viajante italiano do século XVIII, Desideri, que estabeleceu a dis-
tinção fundamental entre os "Rupa-cik" (rus-pa cig, lit. "um osso") e os
"Scia-cik" (ça-cig, lit. "uma' carne"). "Os tibetanos reconhecem dois tipos
de parentesco. Os primeiros são chamados Rupa-cik, do mesmo osso, os
segundos, :Scia-cik, do mesmo sangue. Como parentes do Rupa-cik ou
do mesmo· ÓSSO, reconhecem todos aqueles que descendem de um ante-
passado comum, seja qual for o afastamento, e mesmo se são subdividi-
dos em vários ramOs ao longo das gerações. O parentesco de Scia-cik,
ou de mesmo sangue, é o que resulta do casamento legítimo. O primeiro
cria um impedimento absoluto e inviolável ao casamento, qualquer que
seja o afastamento de grau.. O segundo cria também um impedimento
ao casamento, somente para o primeiro grau, sendo o casamento com
uma prima do lado da mãe autorizado e freqüente_ '" Esta regra é con-
firmada, para os Bhotia, pelo "Census of India, 1911". Não se admite
que um homem espose a filha da irmã de seu pai, mas pode esposar uma
prima materna, filha do irmão da mãe, ou filha da irmã da mãe. "A
razão alegada é que os ossos vêm do lado do pai e a carne do lado da
mãe. Se primos patrilineares se casam, diz-se que os ossos serão furados,
de onde, no futuro, múltiplas doenças em perspectiva"." Benedict acres-
centa a estes testemunhos o de Gorer para os Lepcha, que acreditam que
o líquido seminal do pai produz os ossos e o cérebro, e as secreções
vaginais da mãe o sangue e a carne. Cita o birmanês a-rui, "osso, linha-
gem", e o Nyi LaIa hnga-pu, "osso", ve t'i hnga, "uma família", literal-
mente "família um osso", com a correspondente divisão dos LaIa da
China Ocidental em "Ossos negros" e "Ossos brancos". Se considerarmos
que a "teoria dos ossos e da carne" encontra-se da índia à Sibéria" e



  1. Benedict, p. 326.

  2. Citado por Benedict, p. 328.

  3. Citado por Benedict, p. 328.

  4. S. M. Shirokogoroff, The Psychomenlal Complex 01 the Tungus, p. 65.


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