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tado ora como o irmão, ora como o primo paralelo de sua mãe. Karan-
dikar considera, entretanto, que estamos em presença de uma interpre-
tação tardia, que procura fazer coincidir os textos sagrados com as proi-
bições da época.' I Outros casamentos entre primos cruzados são men-
cionados no H arivamsa PUTana.
Karandikar e Hocart tentaram tirar um argumento suplementar da
genealogia dos Sakya,.u tal como a encontramos na Mahãvamsa. Gautama
seria descendente de duas gerações sucessivas de casamentos entre primos
cruzados e ele próprio esposaria Devadatta, sua prima cruzada. Mas trata-
se aí de uma interpretação meridional tardia, negada pelas tradições do
norte, que fazem de Gautama e Devadatta primos paralelos ... , O texto da
Mahávamsa estabelece a existência do casamento de primos cruzados em
Ceilão, pouco depois da era cristã."
Seja como for, o Satapatha Brahmana menciona, ainda com benevolên-
cia, o casamento na terceira geração" e a proibição deste tipo de casamento
aparece, em Manu, como inovação. Para aproximar estas três filhas se-
melhantes à irmã, a filha da irmã do pai, a filha da irmã da mãe e a
filha do irmão da mãe, é preciso fazer a penitência lunar .. ". É, pois, a
prova de que estes casamentos eram ainda praticados. E continuam sendo,
provavelmente, numa época muito mais tardia. Um autor do século VI
de, Narada, proíbe o casamento com dezessete pessoas, entre as quais os
primos cruzados não estão incluídos. Notamos a mesma omissão nos
Smiriti e, no século XIII, o redator da Smiriti·chandrika, Devana, consagra
ainda um capítulo especial à questão, intitulado: "A defesa em favor do
casamento com a filha do irmão da mãe". Apóia·se no fato de que, no
casamento Brahma, a mulher adquire o gotTa do pai; em conseqüência,
a irmã do pài e a mãe não fazem parte do gotTa de seus irmãos e não
são seus sapinda. O casamento dos primos cruzados não é, pois, um
casamento sapinda e sua proibição repousa apenas no costume. Narada
é, sem dúvida, um. autor do Deccan, como Madhava, que defende a
mesma tese no século XIV. Mas se este último funda a legitimidade do
casamento dos primos cruzados, para o sul, sobre o costume local, invoca
também os caracteres específicos do casamento Brahma, a fim de esten·
der sua tese às regiões do norte. Madhava, assim como Devana, proíbem
formalmente o casamento entre primos paralelos. oi"
Quando consideramos estes fatos e as múltiplas analogias que temos
acentuado entre a estrutura familiar e a organização do luto, na China
e na índia arcaica; não podemos nos admirar de ver Held, seguindo o
caminho de Hodson e precedendo a Granet de alguns anos somente, for·
mular, para a índia antiga, uma hipótese que coincide nos menores
detalhes com a do autor das Catégories Matrimoniales. É difícil acreditar
que Granet tivesse tido conhecimento do livro de Held sem o citá-lo. O pa-
- Karandikar, p. 14-15, 21. E. Benveniste assinala-nos um texto da Mimamsa
(Renou, Anthologie sa!;skrite, p. 213-214) que fornece um bom exemplo deste tipo
de interpretação. - Karandikar, loco cito A. M. Hocart, Buddha and Devadatta. Indian Antiquary.
voI. 52, 1923. - M. B. Emeneau, Was there Cross Cousins Marriage among the Sakyas? Journal
of the' American Oriental SOciety, vaI. 59, 1939. - Held. p. 78-79.
- Karandikar, p. 180-182.
- Manu, XI, 171. Karandikar, ibid.
- Karandikar, p. 195-203. Hutton, op. cit., p. 54-55.
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