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Quase fiz psiquiatria. Cheguei a cursar um ano antes de decidir mudar minha
especialidade e seguir os estudos de ortopedia. O luto é um assunto que a
gente estuda, e vi semelhanças entre as fases desse sentimento com as reações
de Bolsonaro. Suas primeiras atitudes, como a de declarar que a pandemia
nada mais era que uma gripezinha, podiam ser vistas dessa forma, como um
modo de lidar com a perda ou com algum acontecimento de grande impacto.
Quando uma pessoa recebe uma notícia ruim, como ouvir do médico que
está com um câncer, um diagnóstico de leucemia ou outra doença com índice
de mortalidade muito elevado, entra em choque. O médico diz que é preciso
fazer um tratamento, traçar uma conduta. Mas a pessoa, ainda sob o impacto
da notícia, não consegue assimilar completamente as informações. Então sai
do consultório e, normalmente, quando chega em casa, divide a notícia com
alguém do seu círculo mais íntimo. Relata o que ouviu para o pai, para a mãe,
a mulher ou seus filhos. Precisa confidenciar. Ninguém consegue receber
uma notícia tão dura sem externá-la para alguém de confiança.
Quem escuta, até numa tentativa de ajudar, geralmente aconselha a pessoa
a procurar uma segunda opinião. É da natureza humana fazer isso. E quem
está abalado se convence de que receberá outro veredito. É a fase da negação
da notícia. Alguém indica outro especialista que já tratou alguém conhecido,