Clipping Banco Central (2020-10-16)

(Antfer) #1

Fernando Gabeira - O Brasil não é uma ilha


Banco Central do Brasil

O Estado de S. Paulo/Nacional - Espaço Aberto
sexta-feira, 16 de outubro de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas

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Autor: Fernando Gabeira


Política externa não é um tema popular. Mas nas
circunstâncias do mundo de hoje erros ou acertos nesse
campo vão repercutir no cotidiano das pessoas comuns.
É preciso acionar os sinais de alerta para uma
configuração negativa no horizonte. Nela nos
poderemos isolar, simultaneamente, da Europa e dos
Estados Unidos.


No front europeu, são inúmeras as advertências de que
o acordo comercial com o Mercosul subiu no telhado por
causa da política ambiental do governo Bolsonaro. A
recusa começa por Parlamentos nacionais, estende-se
ao Parlamento Europeu e já aparece no discurso oficial
da França. Angela Merkel tem sofrido forte pressão,
embora reconheça, como estadista, a importância do
acordo e a necessidade de salvá-lo dos desatinos
bolsonaristas.


Nos EUA, além da China, o Brasil foi o único país a
ocupar a agenda do debate na campanha presidencial:
Joe Biden anunciou a possibilidade de reunir
investimentos de US$ 20 bilhões para preservar a


Amazônia e ameaçou com sérias consequências
econômicas caso não se altere a política do governo
brasileiro na região Além das divergências no campo
ambiental, Biden discorda claramente da visão de
Bolsonaro sobre a tortura no regime militar. Ele veio
pessoalmente entregar a Dilma Rousseff documentos
do governo americano que confirmam e até mesmo
ampliam o conhecimento sobre a repressão no período.
São textos de diplomatas americanos, baseados
também na ampla equipe de informantes nacionais,
militares incluídos.

Sou adversário da política destrutiva de Bolsonaro e
lamento a visão das Forças Armadas sobre a Amazônia,
que me parece uma estratégia de defesa ultrapassada e
míope. No entanto, duvido que restrições econômicas
sejam a melhor fórmula para resolver esse problema
crucial para a humanidade. Baseio-me nas experiências
históricas de bloqueio, que de modo geral fortaleceram
governos despóticos e penalizaram seus povos. Barack
Obama compreendeu isso ao inaugurar uma nova
política sobre Cuba. Antes de o próprio Obama buscar
acordo com o Irã, a habilidade do diplomata brasileiro
Celso Amorim conseguiu desatar o nó, pela ONU, que
estrangulava o povo iraniano e, em contrapartida, pouco
incomodava os aiatolás.

Por isso acho que um amplo e cuidadoso diálogo com o
Brasil seria muito mais adequado para tratar desse
problema, que preocupa o mundo. Bolsonaro é
irredutível e dificilmente deixará entrar um raio de luz
nas trevas que o dominam.

O mesmo não se pode afirmar de dois outros atores
decisivos: o agrobusiness e as Forças Armadas. Os
produtores brasileiros até que compreendem as
restrições no mercado externo. Mas é preciso
convencê-los também de suas perdas com o
aquecimento global e a destruição da Amazônia.

Pesquisas recentes já quantificam os prejuízos que as
plantações brasileiras tiveram com a onda de calor: R$
20 bilhões. A tendência é aumentar e não atingir apenas
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