NOV EMBRO 2020 Le Monde Diplomatique Brasil 3
EDITORIAL
Para você que vai votar!
POR SILVIO CACCIA BAVA
E
stamos às vésperas de escolher
5.570 prefeitos(as) e 56.600 ve-
readores(as). Na cidade de São
Paulo são 14 candidatos(as) à
prefeitura e 1.997 candidatos(as) à ve-
reança, segundo o TSE. Disputam 55
vagas. Nas capitais são 24.133 candi-
daturas. Ao todo, são 545.036 pessoas
inscritas até 28 de outubro de 2020
para disputar o pleito. É muita gente!
Como você vai escolher seu can-
didato ou candidata em meio a tanta
gente? Pouco se conhece da posição
dos partidos políticos nestas eleições
e dos programas dos(as) candida-
tos(as) que agora estão defendendo
educação, saúde, melhoria na mobili-
dade, e tudo o mais de que o povo
precisa ou quer. Confunde, pois esse
discurso aparece com a eleição e so-
me depois dela. A questão não é fácil
e merece uma ref lexão.
Historicamente, as prefeituras e
câmaras municipais têm sido contro-
ladas pelos interesses de grupos em-
presariais que não estão preocupa-
dos com a qualidade de vida da
população. Encaram a cidade como
uma oportunidade de negócios e
atuam na prestação de serviços às
prefeituras e/ou exploram o mercado
imobiliário e de obras públicas.
Eles ajudam financiando as cam-
panhas eleitorais e depois cobram
dos eleitos que defendam seus inte-
resses. São grupos econômicos fortes
na área dos transportes coletivos, da
coleta e destinação do lixo, do asfal-
tamento de ruas; são incorporadoras
que querem mudar o zoneamento da
cidade para facilitar seus empreendi-
mentos imobiliários; são prestadores
de serviços de manutenção da cidade
etc. Controle de qualidade dos servi-
ços, nem falar! A lógica é: se eu ajudo
você a se eleger, você me ajuda a ga-
nhar o dinheiro público. Esse “me
ajuda” não tem nada de democrático
ou republicano. É falcatrua. É crime.
Em alguns casos, como a aprovação
de leis, é legal, mas atende ao interes-
se privado, não ao interesse público.
Tudo isso só aumenta a desigualdade
entre os territórios e moradores e mo-
radoras da cidade.
Para enfrentar a pandemia, a re-
cessão, o desemprego e toda a crise
social que se aprofunda, um governo
precisa atender ao interesse público,
formular novas políticas públicas e se
preocupar em resolver os problemas
das maiorias empobrecidas. Então
não dá para colocar o lobo tomando
conta das galinhas. Não pode ser
mais do mesmo. É preciso mudar o
que está aí e colocar gente nova no
governo da cidade.
Mas então quais são os critérios
para escolher seu candidato ou
candidata?
Há novidades na conjuntura. Fo-
ram se constituindo ao longo dos anos
atores coletivos que lutam contra as
desigualdades sociais e discrimina-
ções impostas por esta sociedade do-
minantemente patriarcal, branca,
machista, racista, homofóbica, funda-
mentalista, conservadora, destruido-
ra do meio ambiente. É preciso reco-
nhecer a importância desses atores
que impulsionam as mudanças. É
preciso delinear novas possibilidades
de futuro, expressas nas candidaturas
de jovens, mulheres, negros, sobretu-
do das mulheres negras, para que par-
ticipem das decisões públicas.
Por esse raciocínio, cabe fazer al-
gumas perguntas que talvez ajudem
você a identificar o melhor candidato
ou a melhor candidata.
Quais candidatos ou candidatas
se propõem a enfrentar a desigual-
dade social, a orientar as políticas
públicas para beneficiar os mais po-
bres, a aumentar os tributos dos
mais ricos? A defender os direitos
das mulheres? A lutar contra o racis-
mo e o genocídio dos jovens negros
e pobres? A defender a diversidade
sexual e a liberdade de ser o que se
quiser? A defender o meio ambiente,
o verde, o manejo dos resíduos sóli-
dos e ser contra a poluição nas cida-
des? A enfrentar a violência e a se-
gregação nas cidades? A valorizar as
múltiplas e diversas expressões da
cultura em nosso meio? A respeitar
e valorizar todos os tipos de
religião?
Há poucos dias assistimos à vitó-
ria eleitoral do MAS, na Bolívia.
Uma vitória dos interesses das
maiorias – no caso, dos povos origi-
nários, como eles se definem. Mas
essa vitória eleitoral só foi respeita-
da pelos que deram antes o golpe no
governo de Evo Morales porque a or-
ganização e a mobilização popular
garantiram isso. Antes mesmo das
eleições havia mais de 150 bloqueios
de estradas pressionando por elei-
ções limpas.
O mesmo está acontecendo no
Chile. Dezenas de milhares de chile-
nos e chilenas se mantiveram mobi-
lizados e se concentram há um ano
em praças públicas. Pressionaram
durante todo ano – e também agora
na reta final – para que fosse respei-
tada a consulta popular que, afinal,
decidiu que haverá uma Constituin-
te independente, especialmente
eleita para fazer a nova Constituição
democrática.
Esses acontecimentos, pouco
divulgados por aqui, dizem alguma
coisa. Que a cidadania, quando
mobilizada, garante a democracia e
faz prevalecer os interesses das
maiorias.
© Claudius
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