Banco Central do Brasil
Revista Época Negócios/Nacional - Artigo
quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021
Cenário Político-Econômico - Colunistas
por rompante, mas de modo planejado, por missão,
crença e responsabilidade social. Se quisermos a
expansão da filantropia corporativa como um movimento
duradouro, não uma série de episódios de boa vontade,
será necessário apostar menos no apelo aos “estímulos
pontuais” e mais na promoção de um “ambiente de
estímulos”. Esse ambiente tem de se orientar por um
pensamento mais sistêmico de give back, um novo
parâmetro de compromisso com comunidades e uma
valorização do humano na gestão dos negócio.
Não me refiro a incentivo “externo”, do tipo fiscal. Mas a
estímulos inerentes ao próprio sistema capitalista. Não o
de acionistas, mas o de stakeholders. A ascensão do
ESG pode ser um elemento indutor. Não só porque,
graças a um novo raciocínio de retorno sobre o capital,
os investidores se mostram agora mais dispostos a
premiar empresas com menor risco social. Mas porque,
em sua essência, propõe uma renovada noção de
sucesso empresarial, segundo a qual empresa próspera
é a que obtém lucro melhorando a vida das pessoas e o
meio ambiente.
Apenas praticar doações, ainda que de forma
estruturada, não torna automaticamente uma empresa
mais sustentável. Antes, ela deve eliminar as
externalidades negativas ligadas ao negócio. Atento às
novas regras do jogo, o capital já deu mostras de que,
de agora em diante, vai preferir corporações que zelam
pelo bem-estar dos colaboradores, promovem a
diversidade e a inclusão, respeitam os direitos humanos
e desenvolvem as comunidades onde atuam.
O investimento social privado se encaixa bem nesse
último item. Só que não mais baseado na ideia de
redução de danos, mas na de geração de impactos
positivos. Que não reste nenhuma dúvida: como
contribuição voluntária adicional, acrescenta valor à
estratégia de ESG de qualquer empresa, mas apenas
quando associado a um propósito mais amplo, com
compromisso de longo prazo, conexão com políticas
públicas, métricas de avaliação e a intenção de
compartilhar valor.
A valorização do ESG coincide, não por acaso, com
uma tendência global de aumento do ativismo
corporativo, um interesse maior por parte das empresas
de participar da solução de problemas da sociedade. E
mais um componente relevante a contar pontos no
“ambiente de estímulos”. Indivíduos estão cada vez
mais interessados em estabelecer relações com
empresas “de caráter”, que pensam e agem como um
ser humano decente.
Selecionar uma causa, no entanto, não é exatamente
um processo trivial. O seu maior ou menor sucesso
pressupõe considerar três aspectos: vocação,
afinidades e resultados. Vocação significa identificar os
temas socioambientais relacionados com o negócio,
que, de algum modo, ajustem-se à “história” da empresa
ou fortaleçam a sua “humanidade” na percepção das
partes interessadas — o que só pode ser realizado
mediante diálogo aberto e análise rigorosa de sua
trajetória, valores, visão de futuro e propósito.
Afinidade quer dizer que uma causa precisa fazer
sentido profundo não apenas para a alta liderança, mas
para todos os seus públicos e o conjunto da sociedade.
Deve ser vista como um gesto autêntico, íntegro e
coerente. Assim, vai enaltecer a empresa. Do contrário,
resultará em descrédito.
A busca de resultados significa que a causa deve gerar
transformação social efetiva. Melhor ainda se conseguir
engajar tanto os colaboradores quanto clientes e
comunidades — despertando nos primeiros o orgulho
de pertencer; e no segundo grupo, o interesse de
participação. Causas ou ações de investimento social
privado fortalecem a estratégia de ESG. Mas só quando
desenvolvidas por convicção, e não por conveniência.
Assuntos e Palavras-Chave: Cenário Político-
Econômico - Colunistas