82
Q
uando em 2019 prevíamos que 2020 podia ser
o ano do ‘não retorno’ da expansão da mobi-
lidade elétrica, estávamos longe de calcular
o que nos esperava: a crise pandémica pro-
vocada pela Covid-19. Esta crise mundial de
saúde pública serviu como despertador para um problema
ainda maior e mais ameaçador para toda a Humanidade,
ao qual não temos dado a devida atenção: as alterações
climáticas, a poluição atmosférica, a poluição sonora,
os desastres ambientais (incêndios gigantescos, secas
ameaçadoras, acidentes com petroleiros, agravamento da
fome em certas regiões do globo, migrações, refugiados,
o plástico nos oceanos, etc.).
A resposta da generalidade dos países para conter a
pandemia foi a paragem abrupta de muitas atividades eco-
nómicas, milhares de aviões no chão, navios atracados nos
portos ou imobilizados em alto mar (por falta de procura, o
preço do petróleo chegou a níveis negativos), restauração
e hotelaria agonizantes, cidades e regiões inteiras com o
confinamento obrigatório dos seus habitantes. Milhares
de milhões de seres humanos impedidos de se deslocar,
quer fosse para as suas atividades profissionais, quer fosse
por razões familiares ou de lazer.
Cidades fechadas, empresas paradas, transportes púbicos
reduzidos à mínima expressão, aumento do teletrabalho,
tele-ensino, videoconferências... Tudo isto, em simultâneo,
transformou as nossas cidades em lugares mais silenciosos,
menos poluídos e sem congestionamentos de tráfego. As
cores durante o dia tornaram-se mais vivas, ouvíamos o
chilrear dos pássaros, várias espécies de animais, mais ou
menos selvagens, aventuraram-se em ambientes urbanos
e ocuparam espaços antes ocupados pelos humanos e as
suas atividades. O caso dos golfinhos no rio Tejo é o mais
emblemático para os portugueses.
Todas estas alterações provocaram uma queda acentua-
da dos níveis de poluição atmosférica e sonora nas grandes
metrópoles, permitindo a todos nós termos a perceção real
de como serão as grandes cidades sem veículos movidos
com motores a gasolina ou gasóleo. Uma constatação
que valeu por todas as conferências, debates e estudos
teóricos sobre o tema. Mas mostrou-nos mais. Como a
organização social e económica poderia ser, eu diria tem
que ser, modificada, com a implementação do teletraba-
lho e do tele-ensino onde e quando for exequível. Com
a substituição das reuniões, conferências, seminários,
congressos, de entidades e organismos internacionais por
videoconferências, serão poupadas toneladas de CO2 em
viagens de avião não essenciais e milhares de horas em
transferes, aeroportos, táxis, etc.
Em simultâneo a este cenários tivemos: a entrada em
vigor da diretiva europeia sobre as emissões, que aplicará
pesadas multas aos fabricantes que produzam automóveis
com emissões médias de CO2 superiores aos 95 g/km, o
incremento dos incentivos à aquisição de veículos elétricos
em vários países europeus, ajudas económicas da União
Europeia muito dirigidas aos fabricantes que acelerem os
seus planos de eletrificação das suas gamas, e a entrada
em vigor do European Green Deal, dirigido ao combate
às alterações climáticas. Perante o descalabro das vendas
dos automóveis com motores poluentes, que chegaram
a cair mais de 90%, a resiliência das vendas dos veículos
elétricos (os 100% elétricos e os híbridos plug-in), que
em Portugal ultrapassaram, pela primeira vez, os dois
dígitos com uma quota dos 11%, mas que atingiram os
15% na Finlândia, os 25% na Suécia e os 69% na Noruega.
Assistimos, ainda, ao expandir da Rede Pública de
Carregamento – carregamento rápido e carregamento
normal –, muito pela ação dos operadores privados que
avançam para o terreno com centenas de Postos de Car-
regamento Rápido (PCR) e de Postos de Carregamento
Normal (PCN), quer sejam na via pública, quer sejam
em espaços privados de acesso público como sejam as
grandes superfícies comerciais. Este aumento da oferta
dos carregadores públicos, com maior capilaridade, está
a ser complementado com Redes Privadas, algumas já
instaladas (a Tesla acabou de inaugurar em Loulé mais
uma Estação de Supercarregadores – SuC – com a potência
de 250 kW, cinco vezes mais potente que a atual oferta da
rede pública de carregamento). Entretanto outras redes
encontram-se em fase de instalação (Porsche e outras
entidades privadas).
O aumento da Rede Pública de Carregamento Rápi-
do é muito significativo: atualmente existem 342 PCR
aprovados para instalação dos quais 301 pertencem à
Rede Pública, e destes 222 já estão ligados e a funcionar.
O ano de 2020 fruto de uma conjugação de fatores
ficará marcado como o ano do grande arranque da mo-
bilidade elétrica e da sua cada vez maior penetração e
generalização.
Um último dado curioso: a Europa ultrapassou a China
na venda de veículos elétricos.
Não sejas fóssil, conduz elétrico!
MOBILIDADE ELÉTRICA,
O ANO DA GRANDE EXPANSÃO
HENRIQUE SÁNCHEZ
PRESIDENTE DA UVE