ECONOMIA - Esquizofrenia estatal
Banco Central do Brasil
Revista Exame/Nacional - Economia
quinta-feira, 11 de março de 2021
Banco Central - Perfil 1 - Paulo Guedes
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Autor: Carla Aranha, Fabiane Stefano
Enquanto os gastos com o funcionalismo só aumentam,
o cidadão brasileiro está cada vez mais adaptado ao
serviço público digital. A reforma administrativa, que
resolveria boa parte do problema, é bombardeada até
dentro do governo
A pandemia escancarou desigualdades em diferentes
segmentos da sociedade brasileira. Uma delas é
justamente a diferença do funcionalismo público em
relação aos empregados do setor privado. Enquanto a
crise econômica causada pela covid-19 engrossou a fila
do desemprego, os quase 12 milhões de servidores em
todas as esferas do setor público se mantiveram
protegidos. Ao mesmo tempo que o governo federal
tenta aprovar medidas emergenciais para conter gastos
com pessoal, alguns estados e municípios promovem
aumentos salariais e gratificações. O próprio presidente
Jair Bolsonaro e aliados do Centrão mandam
mensagens contraditórias, ora de apoio a uma gestão
pública mais enxuta, ora de manutenção de privilégios.
Para quem olha de fora, é a esquizofrenia do Estado em
ação.
O debate que trata do impacto do funcionalismo na
organização do Estado brasileiro não vem de hoje. Nos
últimos 20 anos, o contingente de funcionários públicos
no país dobrou — boa parte desse crescimento se
concentrou no nível municipal. Logo, custear essa
estrutura inchada não é barato. O país gasta cerca de
13,6% do PIB com pessoal — ficando atrás apenas da
África do Sul, de acordo com dados da OCDE, o clube
dos países ricos.
Mantidas as regras atuais do serviço público, a conta
pode chegar ao equivalente a 14,9% do PIB em 2030,
pelos cálculos da consultoria Oliver Wyman. Hoje, a
despesa total com a folha de pagamentos dos
servidores federais, estaduais e municipais chega a 930
bilhões por ano, o dobro do que é investido em
educação. “O Estado brasileiro vive para pagar a folha
salarial e sobram poucos recursos para investir na
expansão ou na melhoria de qualquer política pública”,
diz a economista Ana Carla Abrão, sócia da Oliver
Wyman e ex-secretária de Fazenda de Goiás.
Diante de gastos crescentes de um lado e de risco de
explosão fiscal de outro, o governo conseguiu fazer
avançar o assunto no Congresso. No início de março, o
Senado aprovou a PEC Emergencial, a proposta de
emenda constitucional que prevê a volta do auxílio
emergencial e limites para o gasto público. No
fechamento desta edição, em 8 de março, a PEC
Emergencial aguardava ser referendada pela Câmara e
receber sanção presidencial. O texto aprovado no
Senado — uma versão desidratada do projeto do
ministro da Economia, Paulo Guedes — propõe o teto
de 44 bilhões de reais para as despesas do governo e
gatilhos que poderão ser acionados se as despesas
obrigatórias passarem de 95% dos gastos primários do
governo.
Em um momento em que o país enfrenta um colapso na
saúde em razão do agravamento da pandemia, a PEC
também estabelece que, caso o governo passe do sinal
amarelo em relação aos gastos, reajustes salariais dos
servidores poderão ser proibidos. Além disso, a criação
ou o aumento de auxílios, bônus ou outros benefícios no
serviço público ficam suspensos. Na prática, a nova
legislação acaba sendo uma extensão da lei aprovada
em maio de 2020, que, em troca de socorro financeiro