Também para elas precisamos de ter
oferta pública. Para esse fim, foi criado
o Fundo Nacional de Reabilitação do
Edificado, cujo primeiro objetivo é
a mobilização de todo o parque de-
voluto ou disponível do Estado para
a realização de obras de reabilitação
e a sua disponibilização no mercado
de arrendamento a custos acessíveis.
Quantos imóveis fazem parte
atualmente desse fundo?
São quase 300 imóveis que estão
sinalizados. Neste momento, estão a
começar as avaliações, a desenvolver-
-se estudos, alguns projetas já estão
em curso com o objetivo de mobilizar
tudo o que é recurso público cons-
truído, não só do Estado central mas
dos municípios e das instituições do
terceiro setor, para a sua reabilitação
e disponibilização. Considerou-se ser
essencial promover não só programas
municipais específicos mas também
a própria oferta privada. E aí foi feito
o Programa de Arrendamento Aces-
sível, que não tabela os preços por
tipologias como tem sido feito, tem
antes uma fórmula própria de aferição
do valor de referência do arrenda-
mento para cada zona em particular
e os proprietários ficam isentos de
tributação em IRS e IRC se disponi-
bilizarem com preços, pelo menos,
20 % abaixo do que a fórmula de valor
de referência lhes indica para a sua
casa especificamente. Ou seja, o valor
de renda máximo é aferido habitação
a habitação, tendo em conta as suas
características específicas: o estado de
conservação, a área, se está equipado,
mobilado, se tem estacionamento e
por aí fora..
O Programa do Arrendamento
Acessível entra em vigor na
próxima semana, a 1 de julho.
Quais são as suas expectativas?
Este programa traz duas vantagens
grandes: uma é a isenção de tributa-
ção e, por outro lado, dá também uma
maior segurança porque acoplado
vem algo que o setor sempre pediu,
que é o acelerar da criação de seguros
de arrendamento também a preços
acessíveis e em condições atrativas
tanto para proprietários como para
arrendatários.
Segundo a nova lei, "a renda deve
ser, pelo menos, 20 % inferior ao
Valor de Referência", na zona em
que se insere. Mas os preços das
rendas no centro de Lisboa estão
proibitivas ...
Claro que nas zonas onde o mercado
esteja mais quente, descer 20 % não é
suficiente para dar resposta a todas as
famílias em dificuldades - irá ajudar
muito uma parte das famílias, mas
para as outras precisamos sempre
de oferta pública e de outra coisa: os
programas municipais que podem
juntar a esta isenção de tributação de
impostos a própria cedência de terre-
nos em direito de superfície, as isen-
ções de IMI e afins. Adicionalmente,
também foi feita a revisão, este ano,
da Portaria 65/2019, que era de 1997 ,
e que agora, com critérios atualizados,
permite aceder ao Regime de Habi-
tação a Custos Controlados, o que
nos dá 6% de IV A. Ou seja, juntando
estas duas situações, temos um en-
quadramento no qual o município ou
o promotor público ou privado pode
aceder a um regime que promove a
construção ou a reabilitação, pois fica
coberto por uma taxa reduzida de IVA
de 6 %, com isenção de IRS e de IRC.
Por fim, apostámos numa terceira me-
dida. Onde podemos ir ainda buscar
mais oferta? Aos devolutos. Acha-
mos que é contra o interesse público
existirem imóveis devolutos. Por essa
razão, deu-se aos municípios a pos-
sibilidade de delimitarem as zonas de
pressão urbanística no seu território
e de aplicarem um agravamento de
IMI significativo, garantindo que os
imóveis são, de facto, colocados no
mercado.
Quando se verá o impacto desta
medida de agravamento do IMI?
A possibilidade de agravamento do
IMI foi aprovada este ano. O que
quer dizer que os municípios têm
até outubro para levar às respetivas
assembleias municipais esta proposta.
Medidas como a que entrou
recentemente em vigor em
Berlim, onde ficou estipulada
uma renda máxima para.
controlar os preços no centro
da cidade, não poderiam fazer
sentido em Portugal?
Penso que o efeito seria extremamente
perverso. Por duas razões: nós temos
2% de parque habitacional público;
a Alemanha tem acima de 20 por cen-
to. A segunda razão é que o número
de habitações em arrendamento tem
caído, com a concorrência de outras
formas de exploração, ou seja, muitos
proprietários optaram pelo Aloja-
mento Local ou até por vender para
capitalizar as receitas ou aprovéitar o
momento favorável do mercado. Se
fizéssemos uma medida desse tipo
que fosse muito limitadora, acredi-
tamos que parte significativa do que
está no parque de arrendamento seria
desviada para outros fins.
Estamos perto da votação final da
nova Lei de Bases da Habitação.
Que impacto terá no setor?
Quando for aprovada, será histórico
para o País. Nós temos em Portugal
o direito à habitação constitucional-
mente consagrado, mas na prática as
respostas têm sido muito assimétricas
ao longo do tempo. Quando este Go-
verno entrou em funções, não havia
instrumentos de apoio a soluções de
habitação há cerca de dez anos! Ou seja,
a política de habitação, em particular
por causa da questão das barracas, na
década de 90 , teve um impulso in-
teressante. Também foram surgindo
apoios ao arrendamento, depois o
apoio à compra de casa, mas a seguir
houve um esvaziamento e quase um
secundarizar das necessidades habi-
tacionais, partindo-se do princípio
de que o mercado estaria já a resolver
os problemas. Deixaram de se ter em
conta graves situações de carências
habitacionais. Dou um exemplo: tra-
balhei em aldeias do Interior do País,
com casas lindas, que nos levam, a nós,
que viemos da cidade, a exclamar "que
lindo, que ar bucólico!", mas entramos
e não têm uma casa de banho ou têm
fumeiros que provocam prob_lemas
respiratórios terríveis ... Isto para dizer
que a erradicação de parte do problema
das barracas não foi, de todo, o elimi-
nar das graves carências habitacionais
do nosso país. III [email protected]
27 JUNHO 2019 VISÃO 85