Eu vou até o balcão de frios onde eu pego uma senha e
espero atrás de uma senhora comprando dois quilos de queijo
prato. Ela vai ter uma bela noite.
Enquanto espero, eu tomo um Tylenol para evitar o retorno da
dor de cabeça insistente que tive o dia todo. Eu estou
descobrindo como gerenciar a dor, mas em alguns dias eu não
consigo me entender com ela.
— Senhor?
Eu ergo os olhos e noto que o atendente está falando comigo.
Ele limpa as mãos em um pano e repete a pergunta.
— O que o senhor deseja?
— Desculpa — eu digo me aproximando da vitrine. —
Duzentos e cinquenta gramas de peru, por favor, cortado fino.
— É pra já — ele diz, vestindo luvas novas. Eu o vejo pegar a
peça de peru e colocá-la no fatiador numa batida seca.
— Kyle? — Uma voz diz atrás de mim.
Eu me viro, mas só vejo um corredor vazio de supermercado.
A luz se reflete em garrafas de refrigerante e latas de alumínio.
Ah, não. Não agora. Eu desejo que o Tylenol faça efeito logo
enquanto volto a olhar para o atendente. Ele ergue os braços
para operar a máquina, sua sombra se move na parede atrás
dele.
Mas...
Eles não estão sincronizados. Meus olhos alternam entre o
homem e a sombra e os movimentos da silhueta estão um
segundo mais rápidos.
Ele se inclina por cima da máquina logo depois de sua
sombra, mas agora há um cabelo comprido pairando por cima do
ombro da silhueta.
Eu dou um passo à frente, confuso. A altura e o formato da
sombra se tornam, de repente, impressionantemente familiares
para mim. Familiares até demais.
Kimberly.
Eu vejo a lâmina girar, mas o som não está certo. Em vez do
metal zunindo, eu ouço um som mole e estranho.
Relaxe. Isso não é real. Isso NÃO É real.
car0l
(CAR0L)
#1