Eu viro a cabeça, em busca de qualquer coisa que eles
possam ter deixado passar. Mas até o carregador cor-de-rosa
que ela deixava aqui se foi. Arrancado da parede como a tomada
de um respirador.
A raiva cresce dentro de mim, inflando cada vez mais até
murchar de repente. Não foram eles que levaram tudo.
Fui eu. Da Kim.
Fui eu quem nos levou de carro até lá. Fui eu quem a fez
sentir que precisava esconder o que realmente queria e agora
nunca vai ter.
— Sinto muito, querido — minha mãe diz, tentando me tocar.
— Eu posso ficar sozinho, mãe? — Eu consigo dizer, rouco,
enquanto me afasto dela.
Ela abre a boca para dizer alguma coisa, mas então hesita e
finalmente sai. Seus passos somem conforme ela sobe as
escadas e a porta lá em cima faz um clique.
Eu me esforço para atravessar o quarto e chegar numa
prateleira no canto onde estão troféus dourados e medalhas
reluzentes ao lado de uma foto emoldurada, uma das únicas que
eles não levaram embora. Nós dois no jogo do meio da
temporada, os braços dela elevando os pompons no ar, meu
número pintado em sua bochecha, meus braços em volta da sua
cintura.
Vinte minutos depois minha carreira no futebol terminaria.
Duas semanas depois eu seria oficialmente só Kyle Lafferty, o
cara escrevendo para o jornal da escola sobre o jogador que o
estava substituindo.
Por meses, tudo que eu quis foi voltar para esse momento.
Para o antes. Agora, porém, eu passaria pela lesão mais cem
vezes se eu só pudesse ter a Kim de volta.
BIP, BIP, BIP.
Eu dou um salto, e uma das minhas muletas cai no chão.
Franzindo a testa, eu me viro na direção do barulho e vejo que
meu despertador está tocando alto na mesinha de cabeceira.
Mancando pelo quarto, vejo os números vermelhos piscando
sem parar, raivosos e no ritmo do barulho.
car0l
(CAR0L)
#1