— Eu nem sei por onde começar — digo com sinceridade.
Talvez se ela só me disser o que quer já seja o suficiente.
— O Sam quer te ver — ela diz, erguendo meu celular. Eu
nem tenho ideia de como ela o pegou. — Faz meses que você
não fala com ele e eu sei que ele também está sofrendo. Pode
começar com isso.
Ela joga o celular na minha direção e ele me acerta bem no
peito, minhas mãos desencontrando quando tentam pegá-lo.
Meus reflexos estão enferrujados. A tela se acende e revela
dezenas de ligações perdidas e mensagens, a maior parte de
Sam, algumas dos caras com quem eu joguei futebol ao longo
dos anos, embora essas sejam bem mais antigas.
Sam é o único que ainda está tentando.
Eu navego lentamente pelas mensagens dele, vendo-as ir de
“Ei cara, como você está?” para “Cara, já faz quase dois meses
que eu não recebo notícias. Me liga. Estou preocupado”.
Eu não sei como olhar na cara dele depois de tudo o que
aconteceu. Como ele pode querer me ver? Passar tempo com
ele seria só mais um doloroso lembrete de que nosso trio não é
mais um trio.
— Você não pode ignorá-lo pra sempre — minha mãe diz,
lendo meus pensamentos.
Ela dá dois tapinhas na minha perna e se levanta.
— Agora, liga pra ele e sai dessa cama. E vá ao mercado. Eu
não vou mais fazer compras ou cozinhar pra você — ela diz, indo
na direção da porta. — Talvez, se você ficar realmente com fome
você saia daí e se junte aos vivos — ela acrescenta.
Em resposta, minha barriga ronca alto.
Traidora.
Estou pingando de suor. Meus jeans grudam nas minhas pernas,
minha pele já estava acostumada ao conforto do moletom. Eu
levei quase uma hora para chegar aqui, mancando pelo caminho
sinuoso que passa pela minha escola e pela biblioteca, minha
perna sofrendo a falta das sessões de fisioterapia que eu tenho
evitado.