Banco Central do Brasil
Revista Carta Capital/Nacional - Economia
sexta-feira, 12 de novembro de 2021
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“O pecado original do endividamento externo continua e
agora é privado, isto é, o passivo externo do governo foi
substituído pelo passivo externo das empresas e a
participação crescente de não residentes aumenta a
vulnerabilidade”, chamou atenção o economista Luiz
Fernando de Paula, professor da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, em debate sobre o tema organizado
pela Unicamp.
Segundo a economista Daniela Magalhães Prates,
diretora de Assuntos Econômicos da Divisão de
Financiamento de Dívida e Desenvolvimento da Unctad,
da ONU, desde o início da pandemia, o que predomina
são os títulos emitidos no mercado externo. Poucos
países tiveram ingresso de bonds para os mercados
domésticos. Em outubro, a emissão doméstica de bônus
despencou. O investimento direto estrangeiro diminuiu
no total, mas continuou indo para a China e a Índia,
principalmente, menos para projetos greenfield, isto é,
para fábricas e outros empreendimentos novos. “Haverá
uma nova fase de reversão, só não se sabe se será
permanente ou se haverá ondas de alta e de baixa nos
fluxos”, diz Prates.
Um dos fatores que afetam o ingresso de recursos,
acrescenta a economista, é a preferência crescente dos
investidores globais pelos fundos de índices, a exemplo
do JP Morgan EMBI, para investir em economias
emergentes. Esses fundos reagem com maior
intensidade e rapidez a mudanças nas condições
monetárias e financeiras globais, o que reforça o
comportamento de manada dos investidores de
portfólio.
“Criamos uma dependência maior em relação à
economia externa e isso tira autonomia da política”,
sublinha o economista Ricardo Carneiro, professor da
Unicamp. O investimento direto externo atual, diz, é
diferente daquele de anos atrás, voltado para o
investimento produtivo e tecnológico, e houve um
aumento significativo de fusões e aquisições. O anúncio
de que os Estados Unidos vão reverter sua política, no
sentido de atribuir um peso maior do mercado na
determinação da taxa de juros, complica a situação para
países como o Brasil, que já se encontra pressionado
pelo ciclo de elevação da taxa de juros do Banco
Central, ressalta Carneiro.
A simples observação dos fluxos financeiros não é
suficiente para constatar a persistência da
vulnerabilidade externa sob novo formato. A saída de
capital na pandemia foi três vezes maior do que em
2018, mas os fluxos para economias emergentes são
altamente positivos e mais voláteis e a América Latina
absorve, em termos relativos, mais capital do que a
Ásia, destaca Fernando de Paula. Para piorar a situação
de países como o Brasil, os preços internacionais de
commodities e a entrada de capitais nos países em
desenvolvimento estão cada vez mais sincronizados, o
que aponta para ciclos concomitantes de expansão e de
queda, como mostra o economista Yilmaz Akyüz,
professor da Universidade da Turquia e ex-diretor da
Unctad/ONU, no artigo intitulado “The commodity-
finance nexus: twin boom and double whammy”.
Uma visão retrospectiva mostra que, depois da alta dos
juros de 1979 nos Estados Unidos, que deflagrou a crise
da dívida nos países emergentes, houve maciça saída
de capitais dos EUA para a China e o Leste Asiático,
ressalta o economista Luiz Gonzaga Belluzzo. Nesse
movimento, o Brasil permaneceu ao largo dos fluxos de
capital, que foram ficando cada vez mais financeiros e
menos produtivos para os países emergentes. Os
empréstimos entre matriz e filiais de uma mesma
empresa, crescentes em multinacionais que atuam no
País, são apenas arbitragens de capital de portfólio, não
se materializam em investimento direto em novas
atividades produtivas, só em aquisições de empresas já
existentes. No País há reservas e, ao mesmo tempo, o
câmbio sofre uma desvalorização quase contínua.
“Estamos assistindo à dominância da financeirização
sobre as economias e a abertura financeira é a nossa
principal vulnerabilidade. Keynes, em Bretton Woods,
dizia que era preciso controlar o fluxo de capitais”,
sublinha Belluzzo. A China, na direção oposta à de