Poesia por Marta Cortezão
que viveu e que vai em aumento,
porque já é “Tarde demais!”, não há
comorecuperarotempoperdidoeo
corpojánãorespondecomaenergia
que ficou para trás, na juventude
também perdida... Seu estado de
inércia,beirandoletargia,dianteesta
constataçãopreparaoalumbramento
de epifania do poema: “Acordou no
finalzinho/ para descobrir que
morrerá/semtervivido.”.Aiminente
morte revela o pior: a dor da
impossibilidade,afinitude.Abanale
misteriosa morte aniquilando os
possíveis sonhos, suprimindo do
corpo a pouca vida que ainda lhe
resta. É a partir desta visão
transformadoraquearealidadedoeu
poemático se vê tomada pela dor
irremediável e pela iminente
desgraçaqueadevoraemcarneviva,
mortificandofrágilcorpoemalfadado
espírito. Contudo, há uma certa
heroicidade paradoxal nesta vida
retorcidaelatentedeperplexidades,
porqueháumacompreensãodaquilo
quesevê,aomesmotempoqueuma
incompreensão dos motivos que a
levaramauma vidanão vivida,pois,
parodiando Clarice, é morrendo que
se sabe morrer e – milagre – se
morre:
Mas se eu esperar compreender
paraaceitar as coisasnuncao ato
deentregasefará.Tenhoquedaro
mergulho que abrange a
compreensão e sobretudo a
incompreensão.Equemsoueupara
ousar pensar?Devo é entregar-me.
Como se faz? Sei, porém, que só
andando que se sabe andar e –
milagre– seanda.(LISPECTOR, p.
31 )
Nestes dois eventos epifânicos
desprendidosda leitura dos poemas
Mosaico e Soporífera, há breves
momentos de clarividência, de
naturezainefável,queprescindemda
ideiadetempoeespaço.Atravésdos
dois eus poemáticos, foi possível
observar transformações causadas
pelosparadoxaischoquesdeperple-