Micro
- EXAME. DEZEMBRO 2021
O
Opavimento do Lincoln Road Mall está re-
vestido por barras paralelas de calçada de
pedra branca e preta, rasgadas aqui e ali
por canteiros com árvores. Visto de cima,
é como se um pedaço de Portugal tivesse
aterrado numa das zonas mais exclusivas
de Miami. E não é preciso andar muito para
encontrar outros sinais do País. Por coin-
cidência, na suíte 500 do edifício ao lado,
com o número 1111, funciona a sede da Pasi-
thea Therapeutics, uma biotecnológica com
pouco mais de um ano e meio que quer en-
contrar novas soluções farmacológicas para
tratar doenças psiquiátricas e neurológicas.
Sentado no lugar de CEO está Tiago Reis
Marques, 44 anos, formado em Medicina
em Coimbra e com um doutoramento na
aplicação de neuroimagens no estudo de
doenças mentais. Desde setembro, aquan-
do do IPO da Pasithea, é o único português
à frente de uma biotecnológica cotada no
índice Nasdaq, depois de um percurso for-
temente ligado à psicofarmacologia e à in-
vestigação em instituições como o King’s
College ou o Imperial College, onde dá au-
las. “Cada um tem o seu propósito. O meu,
enquanto médico, é ajudar os doentes. E
posso fazê-lo em várias dimensões”, diz à
EXAME em entrevista a partir dos escritó-
rios na Flórida.
Foi o contacto com o neurologista
Lawrence Steinman (hoje chairman exe-
cutivo da companhia) que ajudou a abrir o
caminho para as dimensões em que ele e a
empresa hoje se movem – “a farmacêutica, a
terapêutica e a empresarial, de criar valor”,
explica Reis Marques. Com o professor em
Stanford, Tiago explora a potencialidade de
novos alvos terapêuticos (recetores no cére-
bro ainda não explorados) para tratamen-
to das doenças psiquiátricas, bem como a
do repurpose – a utilização de fármacos já
existentes em novas soluções terapêuticas.
“A psiquiatria, dada a complexidade
do cérebro, acaba por ser o último bastião
do desenvolvimento farmacológico. Se fo-
ram precisos 20 anos para compreender a
biologia de um vírus como o HIV, imagine
perceber a complexidade do cérebro – 100
biliões de neurónios, 100 triliões de sinap-
ses – e arranjar fármacos para isso. É muito
mais complicado do que noutras especiali-
dades”, constata.
RISCO TÃO ALTO QUANTO O RETORNO
É a Pasithea, a deusa da mitologia grega
que personificava estados mentais altera-
dos como delírios ou alucinações, que a em-
presa vai buscar o nome, com o objetivo de
identificar alvos cerebrais de interesse, as
formas de os atingir com novos fármacos
e a resposta terapêutica que podem gerar.
Depois de ter levantado 24 milhões de dóla-
res na entrada em bolsa, em setembro pas-
sado, a prioridade imediata é desenvolver
a primeira molécula própria, destinada a
combater a inflamação do cérebro e os seus
efeitos na depressão e na esquizofrenia.
O processo está a ser desenvolvido em
Colocar um gestor
nesta fase
do campeonato
à frente de uma
empresa não tem
muita lógica, porque
as decisões que
têm de ser tomadas
são, acima de tudo,
científicas”
Tiago Reis Marques
CEO da Pasithea Therapeutics