um pouco como deixar um recém-nascido com uma babá pela primeira vez. Os pais
entregam instruções minuciosas para explicar os horários das refeições do bebê, a
frequência dos choros e as formas de acalmá-lo. Do mesmo modo, para garantir que
um estudo em seres humanos não seja interrompido ao primeiro sinal de efeito
colateral, é preciso informar às agências reguladoras e à equipe do estudo exatamente
quais sintomas estão dentro do esperado e como medir o risco que representam para os
pacientes. Por isso, a empresa precisava elaborar depressa um “Folheto para
Pesquisadores” – trata-se, essencialmente, de um manual do usuário explicando em
linhas gerais a tecnologia que compõe as vacinas. O objetivo desse documento é
eliminar as surpresas.
Eram meados de março e, até então, a inovação científica por trás do Projeto
Lightspeed tinha sido comunicada apenas para especialistas na área, incluindo o
bioquímico Klaus Cichutek, presidente do PEI, e os demais integrantes do painel da
agência reguladora alemã, fabricantes terceirizados e funcionários da BioNTech, da
Fosun e da Pfizer. Esse folheto seria a primeira tentativa de uma explicação abrangente
do funcionamento das vacinas candidatas para pessoas de fora. Teria de ser um curso
intensivo, com uma linguagem que mesmo um médico que nunca viu uma fita de
mRNA compreendesse.
Ninguém na BioNTech tinha o conhecimento e a experiência necessários para dar conta
dessa tarefa. Ninguém a não ser Özlem. As habilidades singulares dela já eram um
componente crucial da parceria pessoal e profissional do casal. Se dependesse de Uğur
- e da sua memória visual –, ele cobriria as paredes do escritório com quadros brancos
e anotações. Todos esses mapas mentais faziam sentido para ele, é claro, e talvez
também para especialistas de áreas específicas. Mas era preciso que alguém traçasse
uma conexão coerente entre esses mapas, ligasse os pontos. “Tínhamos que explicar as
coisas para não especialistas”, diz Özlem.
Isso também ocorria com os cerca de 120 projetos de pesquisa da BioNTech. Tanto
Uğur quanto Özlem entendiam a soma das partes, a visão global, mas somente ela
tinha a capacidade de comunicar isso aos outros. “Eu começo com as partes, e ela, com
a visão integrada”, contou Uğur, com admiração. Portanto, foi Özlem quem construiu a
narrativa das vacinas e das terapias de mRNA da BioNTech. Era ela quem apresentava
os avanços da empresa em conferências e faculdades e para os mercados de capitais. É
Özlem, nas palavras de Uğur, “a pessoa que integra, traduz e resolve”.
Quando a BioNTech – e a humanidade – mais precisou, esses talentos vieram mesmo a
calhar. Como diretora médica da empresa, Özlem trabalhou para que os pesquisadores
do estudo de fase 1 proposto compreendessem que febre e sintomas semelhantes aos
da gripe eram ocorrências possíveis e que não tinha problema nenhum usar anti-