uma assinatura. Não de Sofia. Ou seja, dela eu me lembro muito, talvez
demais: pálpebras, tornozelos, uma cintura, um perfume, muitas preferências e
obsessões, as canções que sabia, uma confissão obscura, alguns sonhos; coisas
que minha memória ainda guarda relacionando-as a ela, mas que estão
destinadas a se dispersar, pois não encontro o fio que as ligue e não sei qual delas
contém a verdadeira Sofia. Entre um detalhe e outro há um vazio; e, tomados
um a um, poderiam ser atribuídos tanto a ela como a qualquer outra. Quanto à
intimidade entre nós (nos encontramos às escondidas por muitos meses),
lembro-me de que cada vez era diferente, e isso, que deveria ser uma qualidade
para quem, como eu, teme o desgaste da rotina, agora resulta ser um defeito,
tanto assim que não lembro o que me impelia a, cada vez, buscá-la, justamente
a ela. Em suma, não me lembro de rigorosamente nada.
Talvez o que eu quisesse saber dela no início fosse apenas se me agradava ou
não: por isso, na primeira vez em que a vi assediei-a com uma série de
perguntas, até mesmo indiscretas. Ela, que no entanto poderia ter se recusado,
para cada resposta me submergiu com uma quantidade de esclarecimentos e
revelações e alusões esparsas e vagas, ao que eu, esforçando-me em segui-la e
reter o que ela pouco a pouco ia me dizendo, perdia-me cada vez mais.
Resultado: era como se não tivesse me respondido coisíssima nenhuma.
Para estabelecer uma comunicação em linguagem diferente, arrisquei uma
carícia. Os movimentos de Sofia, todos procurando conter e adiar o meu
ataque, se não até rechaçá-lo, faziam com que minha mão, na hora em que
uma zona de seu corpo escapava, acariciasse outras, de modo que o combate
me levava a fazer um reconhecimento de sua pele, fragmentário mas extenso.
Em suma, as informações colhidas pelo tato não eram menos abundantes,
mesmo se eram igualmente incoerentes, do que as registradas pela audição.
Só nos restava completar o quanto antes nosso conhecimento em todos os
planos. Mas era uma mulher única, aquela que diante de mim se despojava das
roupas visíveis e das invisíveis, impostas ao comportamento pelos hábitos do
mundo, ou eram muitas mulheres juntas? E, dessas, qual mulher estava me
atraindo e qual estava me repelindo? Não havia uma vez em que eu não
descobrisse em Sofia algo inesperado, e cada vez menos eu saberia responder à
questão primordial: ela me agradava ou não?
Hoje, remexendo na memória, tenho outra dúvida: ou sou eu que não sou
capaz de entender uma mulher, se ela não esconde nada de si; ou era Sofia que
aplicava uma tática muito refinada para não se deixar capturar por mim,
manifestando-se com tanta prolixidade. E digo para mim mesmo: entre todas,
justamente ela conseguiu escapar de mim, como se nunca eu a tivesse tido. Mas
realmente a tive? E depois me pergunto: e quem eu tive de verdade? E depois,
ainda: ter quem? que coisa? o que isso quer dizer?
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1